77 MILHÕES - ORÇAMENTO SESIMBRA 2023

E eis que os documentos previsionais relativos ao orçamento camarário para 2023, foram ontem, dia 9 de Janeiro de 2023, tornados públicos, depois de terem sido aprovados por unanimidade em reunião de Câmara e, depois de terem sido aprovados por maioria na Assembleia Municipal, apenas com os votos favoráveis da CDU e do MSU.

Nem sei que diga. Especialmente depois de, e surpreendentemente, a CDU de Sesimbra não ter reclamado como seu, o orçamento municipal. Quem reclamou para si o orçamento municipal foi o PS, com a publicação de um conjunto de slides ostentando o emblema partidário! O orçamento ao invés de ser da entidade pública Câmara Municipal é afinal, do partido! Fantástico. (Seria o mesmo que o Primeiro-Ministro, depois da Assembleia da República aprovar o orçamento, apresentar uma série de slides do orçamento de estado com o logotipo do PS.) Adiante.

Confesso que de todos os documentos públicos que constituem o orçamento para 2023, o que mais me surpreendeu foram as declarações de voto dos vereadores que compõem o executivo municipal. Como o orçamento, para o executivo municipal, é perfeito, a CDU votou favoravelmente porque se “revê integralmente nos documentos previsionais de 2023; pelas grandes ações e investimentos de concretiza e planeia, pela constante melhoria das condições do concelho e dos seus habitantes”.

Já o PS votou favoravelmente porque, entre outras teve “uma participação activa na elaboração deste orçamento”; esteve “presente nas tomadas de decisão/responsabilização nas grandes obras e investimentos”; conseguiu “ver incluídas logo em 2022, bem como no Orçamento de 2023, obras e projectos que estavam presentes no programa eleitoral”; conseguiu “trazer para o Município uma visão mais moderna”; assumiu “tempos e pelouros” responsabilizando-se “por uma postura de grande envolvência na governação, com uma posição constante, sem demagogias ou falsos populismos”. E por tudo isto (e mais algumas coisas) “seria completamente incoerente o PS não viabilizar o presente orçamento”. (Confesso que estou curiosa para ler a justificação de voto dos deputados eleitos pelo PS na Assembleia Municipal).  

Vamos ao que importa: o orçamento para 2023 é o maior de sempre: são quase 77 milhões de euros (76.911.633€) para gastar num único ano. E tirando aquelas que são verbas resultantes da transferência de competências para as Autarquias, as verbas das obras que estão em curso, as verbas financiadas pelo PRR e as candidaturas a financiamentos já aprovados, o orçamento camarário para 2023 é um documento vazio. 

O executivo apresenta um orçamento que reflecte apenas promessas eleitorais (do PS e da CDU) suportadas directamente pelos cofres camarários e, um conjunto de obras que surgem como prioritárias apenas pelo facto de existirem financiamentos (no caso do PRR, a 100%) para a execução das mesmas. 

Quer isto dizer que o orçamento para 2023, não é um documento elaborado com base numa estratégia de desenvolvimento concelhio. Aliás, a estratégia, se é que existe, está completamente esquecida neste orçamento para 2023.

Importa desde já reter alguns valores deste orçamento para 2023: 

  • 33 milhões e 400 mil euros destinam-se a despesas com pessoal;
  • 2 milhões e 300 mil euros estão destinados a festas e subsídios;
  • 1 milhão de euros está destinado a combustível para a frota automóvel;
  • 1 milhão de euros a transferir para as Juntas de Freguesia.


Restam cerca de 39 milhões e 200 mil euros, dos quais cerca de 9 milhões e 400 mil euros resultam da transferência de competências para as Autarquias e, de financiamentos a 100%, por via do PRR, perfazendo assim um total efectivo de cerca de 29 milhões e 800 mil euros. Destes, cerca de 3 milhões e 400 mil euros estão afectos à continuidade das obras em curso (Escola Navegador Rodrigues Soromenho, Capela de São Sebastião, Museu no edifício da rua Aníbal Esmeriz, Bloco da Mata, Mata da Vila Amália, Unidade de Saúde de Sesimbra), sabendo-se que a este valor virão a ser somadas as quantias relativas a revisão de preços, trabalhos a mais, trabalhos não previstos…

Sobram portanto cerca de 26 milhões e 400 mil euros para gastar, para investir. Investimento esse, digo eu, que deveria traduzir-se numa qualquer estratégia ambicionada. Atente-se na estratégia:

  • 1 milhão de euros para satisfazer promessas eleitorais (Spot das Artes na Quinta do Conde, Centro de Artes da Quinta do Conde e Auditório na Quinta do Conde). Importa salientar que, a este valor, serão somadas as revisões de preços, os trabalhos a mais, os trabalhos não previstos,… Importa também salientar que este investimento é totalmente assegurado pelo dinheiro dos nossos impostos (sem qualquer tipo de financiamento).
  • 8 prováveis candidaturas ao Portugal 2030, estando desde já previsto um investimento irrisório de 24.400 euros; o que significa que, a abrirem candidaturas, este valor será fortemente inflacionado (através de alteração orçamental, retirando verbas de outras rubricas/investimentos previstos); 
  • A manutenção de rubricas abertas (com valores irrisórios) que visam apenas manter a ilusão do cumprimento das promessas eleitorais, como seja o Posto de GNR na Quinta do Conde, a loja do cidadão na Quinta do Conde, o Tribunal, a ampliação da Escola Michel Giacometti, a nova Unidade de Saúde familiar na Quinta do Conde, o Parque de Alfarim… (num cenário utópico, se por ventura avançar algum destes processos, as verbas atribuídas serão fortemente inflacionadas, retirando verbas de outras rubricas/investimentos previstos);
  • A execução da Estratégia Local de Habitação é apenas uma ilusão (o Acordo de Colaboração, no âmbito do Programa 1º. Direito, foi homologado em Agosto de 2022 - LINK - e tem a duração de 6 anos):
    • Construção de habitação social – AUGI 24 – Ribeira do Marchante: 700 euros;
    • Construção de habitação social – Bairro Infante D. Henrique: 300 euros;
    • Construção de habitação social – Quinta do Conde – Conde 1: 300 euros;
    • Requalificação de habitação social – Fonte de Sesimbra: 300 euros;
    • Requalificação de habitação social – Rua General Humberto Delgado: 300 euros;
    • Reconstrução de 12 fogos na Rua Conselheiro Ramada Curto: 300 euros;
    • Aquisição de fogos para realojamento (mais de 130 fogos): 1.200 euros;
    • Requalificação de habitação social – Zambujal: 1.200 euros;
    • Requalificação de edifício na rua Leão de Oliveira: 1.200 euros;
    • Requalificação de habitação social – Boa Água: 300 euros;
    • Construção de habitação social na Rua Amélia Frade: 300 euros.

Dos cerca de 26 milhões e 400 mil euros restam pouco mais de 25 milhões de euros. E onde serão os mesmos investidos para regozijo e gáudio do executivo camarário?

Por exemplo, na rede viária concelhia:

  • 300.000 euros (trezentos mil euros) para novas pavimentações;
  • 700.000 euros (setecentos mil euros) para reabilitar pavimentos; 
  • 147 mil euros para conservar as estradas que ainda estão mais ou menos transitáveis;
  • 125 mil euros para calcetar passeios e bermas. 

Quer isto dizer que a miserável rede viária concelhia tem uma verba atribuída de 1 milhão e 272 mil euros. Mais do que suficiente. Encaremos esta verba como uma medida que promove o desenvolvimento empresarial do Concelho, nomeadamente das empresas de pneus e reparação automóvel. 

Por exemplo, na iluminação do Castelo de Sesimbra: 100 mil euros! O que me parece manifestamente insuficiente perante a falta de luz que o mesmo ainda apresenta… talvez seja para instalar a totalidade do círculo cromático para que numa próxima oportunidade as cores da bandeira nacional possam surgir na sequência correcta. Ou talvez seja para que o Castelo de Sesimbra fique visível de Marte. Ou então é no Castelo de Sesimbra que irá ser colocada a escada até à lua. E convém que a mesma esteja devidamente iluminada uma vez que, se cumprir o RGEU, estaremos a falar de cerca de 2 biliões e meio de degraus.

Por exemplo, na substituição de condutas de fibrocimento que ainda abastecem muitos dos lares sesimbrenses com água potável: 100€! Sim, 100 euros! Relembro que 2 milhões e 500 mil metros cúbicos de água potável são perdidos, no Concelho de Sesimbra, “devido à antiguidade e degradação das redes em baixa”! E entre o orçamento de 2022 e o orçamento para 2023, o investimento na rede de águas e abastecimento do Concelho sobe apenas cerca de 300 mil euros. Uma fortuna.

Por exemplo, na recolha do lixo. A Autarquia prevê gastar meio milhão de euros para continuar a depositar o lixo produzido em aterro sanitário. E para não repetir o que já escrevi (AQUI, AQUI e AQUI) relembro apenas que, a partir de 2030, é proibido enviar para aterro qualquer resíduo susceptível de reciclagem ou valorização. Ou sejam, biorresíduos. Se a Autarquia não cumprir este prazo, os custos da tonelada de lixo depositado em aterro poderá alcançar valores multimilionários e que se traduzirão, como é óbvio, na factura dos cidadãos sesimbrenses. (O orçamento, ao invés de propor uma estratégia de investimento tendo em vista a redução do número de toneladas de lixo a depositar em aterro, opta por apontar um valor de 2 milhões de euros a pagar já em 2025. Ou seja, o triplo do que paga actualmente. Para quando a implementação daquela que foi a “Versão Preliminar do Estudo de Desenvolvimento de Sistemas de Recolha de Biorresíduos – Município de Sesimbra” - LINK - e  que está esquecida no fundo de uma qualquer gaveta?)

Por exemplo: 1.2 milhões para as Tecnologias e Sistemas de Informação; 1 milhão para a Informação e Relações Públicas; 1 milhão para a Higiene Urbana;…

O orçamento é vazio de estratégia, de visão de futuro. Onde está reflectida no orçamento de 2023-2027, o impacto da operação urbanística resultante da aprovação unânime de 138 mil metros quadrados de construção na Mata Sul de Sesimbra? Onde está no orçamento de 2023-2027, o impacto dos várias empreendimentos turísticos viabilizados (nomeadamente na zona do Meco)? Onde está reflectida no orçamento de 2023-2027, uma estratégia clara para um desenvolvimento ambientalmente sustentável? 

Onde estão reflectidas no orçamento de 2023-2027, as opções estratégicas relativamente à eficiência energética, à mobilidade eléctrica, às alterações climáticas?

Talvez por isso, o orçamento camarário tenha sido aprovado apenas com os votos favoráveis da CDU e do MSU na Assembleia Municipal. Com a agravante de que, conforme foi referido pela bancada do PSD, o orçamento será este ou outro qualquer, perante o conjunto de alterações orçamentais que já se perspectivam. Sendo que a inquietação sobre a execução do mesmo, é evidente e transparente. Para já não falar no efeito que a inflação e a subida das taxas de juro introduzirão na gestão de 2023. Mas isso, já se sabe, é culpa da Nato e dos Estados Unidos e da Europa que fizeram com que a Rússia invadisse militarmente a Ucrânia e desencadeassem uma guerra que nos afecta a todos.

Termino com uma palavra para os trabalhadores da Autarquia: não será nesta década que o novo edifício camarário ganhará forma. A verba atribuída corresponde a 100€ . Aliás, até pelo menos 2027, a grande maioria irá continuar a trabalhar nas mesmas condições precárias. O orçamento não prevê um único cêntimo para, por exemplo, substituir os pavilhões dos anos 80 do século passado (e que serviam de instalações ao ciclo preparatório) por novas construções sem amianto, sem buracos, sem bicharada, sem gotas e goteiras. Para já não falar nas restantes instalações camarárias onde a chuva é presença habitual há anos! 

E permitam-me recuar a uma entrevista (LINK) de Julho de 2021 onde, o Presidente que foi reeleito afirmava categoricamente que, sobre o novo edifício camarário “nós neste momento, estaríamos em condições, não estou a dizer que fosse no mês de Junho mas provavelmente que fosse no mês de Julho, lançar o concurso de concessão, aquilo há-de ser um concurso de de de alienação, concurso público, estávamos em condições provavelmente se não fossem em Junho, se calhar em Julho lançar o concurso a… eu, o entendimento que faço é meu, pessoal. Não sendo, e vou ser muito frontal, não sendo uma matéria que eu sei que não é pacífica, também não vai, não vamos influenciar e intoxicar o período pré-eleitoral com… nem da parte de nós que estamos, que somos maioria com uma bandeira porque achamos que é uma bandeira, nem da parte daqueles que não acham que seja bandeira nenhuma e que ainda pode ser um ónus. Portanto não vamos lançar antes das eleições. Ponto final.” Ora sobre as eleições passaram 1 ano, três meses e 15 dias. O que é que mudou neste período temporal?, dado que o concurso público só não foi lançado porque poderia "influenciar e intoxicar o período pré-eleitoral"? Já devíamos estar com a estrutura executada, com as gruas instaladas e com o inicio da betonagem da laje do nono piso! 

Se a Câmara não fosse CDU, até sugeria a convocatória de uma manifestação com o apoio do PCP, da CGTP e do STAL, exigindo condições de trabalho para todos os que, dia após dia, fazem a máquina funcionar. 

Em suma: 2023 é um ano vazio de projectos e de obras. É apenas a gestão do dia-a-dia, do rame-rame, sustentado nas reclamações, nos pequenos arranjos decorrentes de uma qualquer ocorrência, nos eventos, nas festas, nas comemorações disto, daquilo e daqueloutro e claro, do grandioso festival do Meco que afinal é na Lagoa de Albufeira.

2023 é um ano perdido. É pena.



FONTE DA IMAGEM: jornaleconomico.pt


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