E PELA 10ª VEZ, CABO ESPICHEL OUTRA VEZ - 3ª PARTE

As peças que compõem o Procedimento relativo ao Concurso Público (AQUI) dividem-se em três pastas. A primeira pasta é relativa ao Programa do Procedimento. A segunda pasta diz respeito ao Caderno de Encargos. E a terceira pasta, é composta por sete anexos: três serão anexos ao Programa de Procedimento (com os modelos de Proposta, Declaração e Avaliação) sendo que os restantes quatro, são anexos ao Caderno de Encargos (composto por Plantas, Estudo da DGPC, Memória Histórica e Regulamento do Terreiro). Grosso modo, são seis documentos que definem as regras e critérios a que deverão obedecer as propostas a apresentar. Documentos esses complementares e, nalguns casos, contraditórios. 


PROGRAMA DO PROCEDIMENTO DO CONCURSO PÚBLICO (AQUI)

Logo no seu artigo 1º é definido que o concurso público se destina e cito: “à concessão da exploração de parte do imóvel designado por Santuário da Nossa Senhora do Cabo, no Cabo Espichel” (parte da ala sul e a ala norte), “com vista à realização de obras, incluindo de infraestruturas, e posterior exploração para fins turísticos, como estabelecimento hoteleiro, estabelecimento de alojamento local, na modalidade de estabelecimento de hospedagem, ou outro projeto de vocação turística que respeite o ambiente espiritual e identidade do espaço, nos termos da legislação em vigor.

De seguida, refere que o Santuário é um imóvel de interesse público, integra uma ZEP (Zona Especial de Protecção), uma “zona non aedificanti” sendo que está e cito: “sujeito às correspondentes proteção e restrições legais e regulamentares.”

Segue-se a informação de que a identificação completa do imóvel (correspondente à concessão), consta no Caderno de Encargos e respectivos Anexos, sendo que os mesmos contêm e cito: “os termos, condições e exigências aplicáveis às obras a realizar, bem como à atividade a explorar.”

No artigo 4º. são enumeradas as peças do procedimento das quais transcrevo:

O Caderno de Encargos tem como anexos as peças escritas e desenhadas respeitantes ao imóvel, das quais resultam, entre outros, as condicionantes da intervenção, isto é, das obras a realizar antes de iniciar a exploração turística. (…) Os anexos ao Caderno de Encargos são os seguintes:

a) Anexo 1 – Peças desenhadas (inclui a Peça desenhada 00 - Planta com identificação dos limites da área a afetar ao Projeto REVIVE);

b) Anexo 2 – Termos de referência do Projeto (Estudo da Direção-Geral do Património Cultural);

c) Anexo 3 – Memória Histórica e Artística (Estudo do Instituto de História de Arte);

d) Anexo 4 – Regulamento de uso do espaço comum (terreiro).

Ou seja, a “concessão da exploração de parte do imóvel designado por Santuário da Nossa Senhora do Cabo, no Cabo Espichel” (parte da ala sul e a ala norte), obedecerá ao definido no Caderno de Encargos e respectivos Anexos, estando sujeito “às correspondentes proteção e restrições legais e regulamentares” decorrentes do facto de se tratar de um imóvel de interesse público, integrado numa ZEP (Zona Especial de Protecção) e numa “zona non aedificanti” e consequentemente, sujeito ao regime jurídico estabelecido pela Rede Natura 2000 e Reserva Ecológica Nacional (REN).


CADERNO DE ENCARGOS (AQUI)

O clausulado do Caderno de Encargos começa por repetir/reafirmar o descrito no Programa do Procedimento do concurso público, nomeadamente em relação à classificação como imóvel de interesse público, ZEP, “zona non aedificante” e à sujeição de todas as proteções e restrições legais e regulamentares aplicáveis. Adianta que “o estabelecimento da concessão compreende, assim, o bem imóvel pertencente ao domínio privado do Município de Sesimbra e parte do bem imóvel, propriedade da Confraria de Nossa Senhora do Cabo, melhor identificados na Peça desenhada 00 - Planta com identificação dos limites da área a afetar ao Projeto REVIVE, que integra o Anexo 1 e, bem assim, nos documentos que compõem os Anexos 2, 3 e 4.”

A cláusula 3ª. define que a concessão obedecerá à descrição, limites e características expressas nos Anexos 1, 2, 3 e 4. Reafirma que a concessão obriga à “realização das obras necessárias à reabilitação do Santuário, incluindo de infraestruturas, e subsequente exploração turística do imóvel, como estabelecimento hoteleiro, estabelecimento de alojamento local, na modalidade de estabelecimento de hospedagem, ou outro projeto de vocação turística”, sendo que “a reabilitação, manutenção e, genericamente, a realização de quaisquer obras obedecem, por um lado, à legislação e regulamentação aplicável, e, por outro lado, às condicionantes da intervenção que resultam do estudo da Direção Geral do Património Cultural (DGPC) que consubstancia o Anexo 2 ao presente Caderno de Encargos, no qual se restringem e impõem comportamentos ao Concessionário.” Por último, refere que a área “a concessionar encontra-se identificada com pormenor nos anexos ao presente Caderno de Encargos, nos quais se identificam espaços, e condicionantes a intervenções futuras (cfr. Anexos 1, 2 e 3), sem prejuízo do disposto nos números seguintes.

As cláusulas seguintes referem que o concessionário ficará obrigado, para além das obras relacionadas com a concessão, à realização das seguintes obras (excluídas da área a concessionar):

  • Reabilitação estrutural total de todo o edifício da ala sul;
  • Reabilitação das fachadas e cobertura de todo o edifício da ala sul.
Acresce que (cláusula 5ª.) o estudo da DGPC (Anexo 2) é vinculativo, sendo que constitui obrigação para o concessionário, alertando que o incumprimento do mesmo poderá “levar à resolução do contrato.” Alerta também para o facto de se tratar de um “local de culto de relevo nacional e grande significado simbólico, devendo o Concessionário, no cumprimento das suas obrigações contratuais, harmonizar a exploração turística com essa condicionante, potenciando, na medida do possível, a valorização identitária do local.

Por fim, refere que o terreiro central “é propriedade da Confraria de Nossa Senhora do Cabo, não sendo uma área que integra o estabelecimento da concessão, no entanto, o Concessionário tem o direito de usar esse espaço nos termos estabelecidos e com as condições estabelecidas no anexo 4.”

Apenas três notas: 

  1. A concessão do Santuário prevê, para além das obras inerentes à própria concessão, a reabilitação de toda a ala sul das hospedarias (estruturalmente, fachadas e cobertura). Não está prevista qualquer intervenção na Igreja, nem sequer uma análise estrutural, (nomeadamente da cobertura.)
  2. O concessionário deverá harmonizar a exploração turística ao facto de se tratar de um “local de culto com relevo nacional e grande significado simbólico”, devendo potenciar, “na medida do possível, a valorização identitária do local.” Parece-me uma norma demasiadamente vaga e que “na medida do possível” será difícil de concretizar.
  3. Todas as obras a realizar estão sujeitas ao cumprimento de todas as proteções e restrições legais e regulamentares aplicáveis. Quer isto dizer que o cumprimento do regime jurídico da REN e Rede Natura 2000 é obrigatório. Assim como a “zona non aedificanti”, onde é proibido qualquer tipo de construção. 


ANEXO 1 – PEÇAS DESENHADAS:

Tratam-se das peças desenhadas que já constavam no portal REVIVE antes da abertura de concurso para a concessão. No caso da:

  • Peça desenhada 00 - Planta com identificação dos limites da área a afetar ao Projeto REVIVE (AQUI)
    • Não apresenta áreas (em metros quadrados) a concessionar nem apresenta cotas; surge apenas um limite tracejado, integrando uma faixa de terreno em redor das hospedarias (totalidade da ala norte e da ala sul) e da Igreja. Ou seja, a planta é completamente omissa relativamente à área de terreno que irá ser concessionada.
  • Peça desenhada 01 – Corte (AQUI)
    • Trata-se de um corte longitudinal, mostrando o alçado sul da ala norte das hospedarias, evidenciando as diferentes altimetrias. Curiosamente, esta peça desenhada surge datada (Setembro.2020) sendo que os muros e porta de entrada na Casa da Água não refletem aquela alteração efectuada (desde Maio e ‘inaugurada’ quase secretamente em Setembro de 2020, com base numa fotografia que apareceu, desconhecendo-se a origem da mesma, data, onde foi encontrada, validação,…). Será que estará prevista neste programa de concessão, a reposição daquela que era a nossa memória colectiva?
Apenas uma nota: o limite tracejado, integrando uma faixa de terreno em redor das hospedarias (totalidade da ala norte e da ala sul) e da Igreja corresponde a uma área classificada como REN sendo parte integrante da Rede Natura 2000. É também, desde 1963, “zona non aedificanti”. Ou seja, apesar de integrar a área a concessionar, estará proibida qualquer tipo de construção dentro deste limite tracejado.


ANEXO 2 – TERMOS DE REFERÊNCIA DO PROJETO (ESTUDO DA DIREÇÃO-GERAL DO PATRIMÓNIO CULTURAL) (AQUI):

Este será porventura, o Anexo mais importante, dado que estabelece as condições vinculativas relativas à recuperação do edificado objecto de concessão. É composto pelo Caderno de Encargos que define os termos de referência para o projecto e, três Anexos fundamentais:

    • Anexo I – Obrigações legais e exigências do programa
    • Anexo II – Peças Desenhadas
    • Anexo III – Registo Fotográfico

  • CADERNO DE ENCARGOS

Nas primeiras páginas surgem dois mapas de localização, o enquadramento histórico e uma breve cronologia do Santuário. Na página 12, surge a primeira planta identificando o limite da área a afectar a uso turístico (sem referência a áreas) e, os espaços edificados e exteriores a afectar a uso turístico (também sem referência a áreas).

Na página 13, é feito o enquadramento da pretensão sendo que apenas realço e cito: “a necessidade do devido acompanhamento de um departamento de Arqueologia” e, sendo o conjunto destinado a actividades turísticas, o mesmo corresponderá à “instalação de um empreendimento turístico de qualidade elevada.

E faço aqui um parêntesis: “um empreendimento turístico de qualidade elevada” corresponderá (digo eu) pelo menos, a um empreendimento turístico de quatro estrelas e que poderá ser (de acordo com o definido no Caderno de Encargos) “um estabelecimento hoteleiro, um estabelecimento de alojamento local, na modalidade de estabelecimento de hospedagem, ou outro projeto de vocação turística que respeite o ambiente espiritual e identidade do espaço, nos termos da legislação em vigor.

Atente-se nos requisitos gerais estabelecidos pelo regime jurídico da instalação, exploração e funcionamento dos empreendimentos turísticos (RJET):

  • cumprir as normas constantes do regime jurídico da urbanização e edificação, bem como as normas técnicas de construção aplicáveis às edificações em geral, designadamente em matéria de segurança contra incêndio, saúde, higiene, ruído e eficiência energética;
  • garantir as condições de acessibilidade (a satisfazer no projeto e na construção), dispondo de instalações, equipamentos e, pelo menos, de uma unidade de alojamento (quarto) que permitam a sua utilização por utentes com mobilidade condicionada.
Atente-se agora em alguns dos requisitos obrigatórios e específicos da instalação, classificação e funcionamento de cada tipo de empreendimento turístico, “de qualidade elevada”, nomeadamente para:

  • Estabelecimento hoteleiro” (quatro estrelas):
    • Climatização de todo o edificado;
    • Garagem ou parque de estacionamento com capacidade para um número de veículos correspondente a 20% do número de quartos do empreendimento, situado no empreendimento ou na sua proximidade;
    • Meios de comunicação electrónicas (telefone e internet)
  • Estabelecimento de alojamento local, na modalidade de estabelecimento de hospedagem”: 
    • Ligação à rede pública de abastecimento de água ou dotação de um sistema privativo de abastecimento de água com origem devidamente controlada;
    • Ligação à rede pública de esgotos ou dotação de fossas sépticas dimensionadas para a capacidade máxima do estabelecimento;
  • Outro projeto de vocação turística que respeite o ambiente espiritual e identidade do espaço”, por exemplo:
    • Apartamentos turísticos:
      • Estacionamento privativo com capacidade para um veículo por quarto; 
      • Meios de comunicação electrónicas (telefone e internet)
    • Hotel Rural:
      • Grosso modo, serão os mesmos requisitos estipulados para um estabelecimento hoteleiro, sendo que e relativamente aos requisitos gerais estabelecidos pelo regime jurídico da instalação, exploração e funcionamento dos empreendimentos turísticos, o Santuário não terá de cumprir as normas legais e regulamentares em vigor dado que o mesmo foi construído numa época anterior às normas em vigor (conforme estabelece o regime jurídico da urbanização e edificação).
Acresce que, será comum a qualquer um dos possíveis empreendimentos turísticos a concretizar, a definição/implementação de equipamentos de uso comum (como sejam piscinas, campo de jogos,…) e de estabelecimentos comerciais e de prestação de serviços, incluindo os de restauração e de bebidas.

Continuando. Na página 14 é apresentada uma “Planta de Afectação”, definindo as áreas a concessionar e o uso que as mesmas poderão vir a ter. Uma linha a tracejado e que envolve o Santuário (edificado) define o limite da área a afectar ao uso turístico (sem áreas definidas). 

São identificadas a Igreja (como edifício religioso não afecto à função hoteleira) e, parte da ala sul das hospedarias (como imóvel afecto à Diocese de Setúbal). Seguidamente, é identificado (cor azul) o edificado existente (ala norte a parte da ala sul das hospedarias) e que será afecto a quartos, espaços sociais e serviços de apoio.

Restam duas identificações:

  • A primeira identificação (cor cinzento-claro) corresponde às ruínas existentes (Casa da Ópera, Casa Real, Cisterna,…) e que serão possíveis de reconstruir, sendo afecto a quartos, espaços sociais e serviços de apoio e/ou, a estruturas lúdicas, tais como piscinas, campos de jogos ou outras.
  • A segunda identificação (riscas de cor verde) corresponde a áreas exteriores destinadas a estacionamento.
Nas páginas 15 e 17 surge a definição do “Programa Funcional do Estabelecimento Hoteleiro”, organizado em cinco núcleos programáticos:

  • Alojamento”: referindo que a área destinada aos quartos será em ambas as alas das hospedarias, sendo que, os espaços sociais e de serviços de apoio, e também as estruturas lúdicas, podem vir a ocupar a antiga Casa da Ópera e ruínas adjacentes assim como a construção existentes e cito, “junto ao actual restaurante a sul.”
  • Restauração”: Cito: “Apesar de já existir um restaurante no conjunto, admite-se a existência de vários espaços de restauração e afins.”
  • Lazer e Bem-estar”: Cito: “O factor de miradouro natural do lugar convida uma considerável afluência de visitantes, que pode ser apoiada por equipamentos no conjunto.”
  • Espaços Multiusos”: referindo que será conveniente a ocupação de divisões existentes para a criação destes espaços que possam acolher diferentes actividades.
  • Vocação Religiosa”: Resumidamente, resume-se à Ermida, à Igreja e ao “recinto central” e que ficam excluídos da concessão. Acresce que, a manutenção do “recinto central” será da responsabilidade da Autarquia mas, para a sua utilização e/ou realização de qualquer tipo de evento, será necessário obter junto da Diocese de Setúbal, autorização. Ao concessionário, é pedido que tenha “consciência”.
Nem sei que diga. Talvez dizer que a página 16 repete a planta da página 14. E que na página 18, surge uma nova planta identificada como “Planta de Espaços Disponíveis”, sendo que pela primeira vez, surge identificada a Casa da Água como “sistema de abastecimento de água”.

(continua)



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