A ARRÁBIDA, A UNESCO E OS EMPREENDIMENTOS TURISTICOS NO MECO

E já está! A Arrábida é, a partir de hoje, Reserva da Biosfera da UNESCO. Em Portugal, existem 12 Reservas da Biosfera: o Paul do Boquilobo (a primeira a ser declarada – Santarém); as ilhas do Corvo, Graciosa, Flores e São Jorge (Fajãs); a Ilha de Porto Santo e Santana (Madeira); o Gerês; o Arquipélago das Berlengas; a Meseta Ibérica (Bragança); o Tejo (Castelo Branco – região do Parque Natural do Tejo Internacional); e Castro Verde. 

A Arrábida será a 13ª Reserva da Biosfera portuguesa. O que poderá ser um número de sorte, no caso do Concelho de Sesimbra. 

A imagem que ilustra este post corresponde ao meu post (de 21 de Julho de 2021) relativo a MAIS 450 CAMAS APROVADAS PARA O MECO!! Com uma diferença: marquei, com uma linha amarela, o limite da área da Reserva da Biosfera da Arrábida (de uma forma livre e mais ou menos rigorosa; pelo menos na parte que mais interessa). Também marquei uma linha azul, que identifica, dentro da Reserva da Biosfera, a “Zona Tampão” (que se estende até ao mar, nuns traços azuis). Entre estas duas linhas, surgem uns traços amarelos que identificam a “Zona de Transição”. Marquei ainda (num tracejado cor de rosa), a variante ao Porto de Abrigo. E deixei, como é óbvio, todas as manchas relativas aos empreendimentos turísticos previstos e aprovados (até Julho de 2021) dentro desta que é, a partir de hoje, uma Reserva da Biosfera da Unesco. 

Começo por referir a minha crónica de Junho de 2024 (LINK), no jornal «Raio de Luz», onde abordei a consulta pública realizada sobre esta proposta de Reserva da Biosfera e, a aprovação da mesma (a 12 de Junho), em reunião de Câmara, extraordinária, à porta fechada e em segredo. 

Nessa mesma crónica referi um conjunto de dados que importa repetir (para melhor leitura da imagem que ilustra este post): 

  • Na “Zona Tampão” (que se estende até ao mar, nuns traços azuis) para “além da monitorização e investigação científica e residual e da visitação ordenada” será possível “realizar a actividade pastorícia”. 
Dizendo de outra maneira: tudo o que poderá vir a existir no futuro, dentro desta área, serão apenas “iniciativas de monitorização e investigação científica” e visitas devidamente ordenadas. Fora estas actividades, será possível utilizar o solo apenas para “realizar a actividade pastorícia”. Explicando melhor: as construções serão apenas as que existem (nada de mais construção do que quer que seja, nomeadamente estradas, infraestruturas, equipamentos, empreendimentos imobiliários e/ou turísticos). 

  • A “Zona de Transição” (que envolvem núcleos urbanos nomeadamente “a totalidade da Vila de Sesimbra” e também a Maçã, as Pedreiras, Sampaio, Santana, Corredoura, Zambujal, Fornos, Azoia, Cabo Espichel,…) e que não estará sujeita “a constrangimentos legais tão estritos” como a “Zona Tampão” (e a Zona Núcleo – quase inexistente no Concelho de Sesimbra – que está reservada “à monitorização e investigação científica, com pouca presença humana, ou com visitação ordenada e residual”). 
 Dizendo de outra maneira: tudo o que poderá vir a existir no futuro, dentro desta área, não estará sujeita “a constrangimentos legais tão estritos” mas, terá de cumprir o PROT-AML, o POPNA, a ZEC Arrábida-Espichel, a Rede Natura 2000 e a ZPE Cabo Espichel. O PDM de Sesimbra, em Revisão há mais de 18 anos!; está (conforme ficámos a saber, pela primeira e única vez em 8 anos e a pouco mais de 15 dias das eleições) desactualizado! Nomeadamente em relação ao modelo de ordenamento do território (conforme referi AQUI). Explicando melhor: O PDM em vigor não serve para rigorosamente nada em matéria de regulação e regulamentação da “Zona de Transição” definida pela Reserva da Biosfera porquanto está, desactualizado e obsoleto. É a Revisão (assim se espera) que verterá no seu regulamento e plantas de ordenamento os “constrangimentos legais” a que toda esta área estará sujeita, em cumprimento daquelas que são, a partir de hoje, as linhas de acção que garantem “uma estreita articulação e complementaridade entre os valores e os interesses em presença, contribuindo para uma harmoniosa conivência de elementos a proteger e de actividades a desenvolver”. 

Ou seja, na “Zona de Transição” terão de ser, a partir de hoje, respeitados os valores naturais existentes, preservando-os e enaltecendo-os. A ocupação humana surgirá em harmonia com a natureza, sendo que esta prevalecerá perante as vontades do homem. Nomeadamente na construção e na ocupação de espaços que, sendo florestais, agrícolas e naturais, assim devem permanecer. E decorrentes dessa valorização, estarão as práticas tradicionais ancestrais que deverão ser protegidas, promovidas e desenvolvidas. 

Agradeço por isso aos peritos da UNESCO que terão visitado o território sesimbrense e que, chegados ao Meco e percorrendo o deslumbramento de encostas e paisagens naturais até ao Cabo Espichel, terão flectido para nascente e boquiabertos, terão constatado que todo este território, que sobreviveu até aos dias de hoje, intocável, assim deve permanecer, como património de todos e para todos. 

Partilho o LINK para o formulário da candidatura da Arrábida a Reserva da Biosfera da UNESCO e que merece uma leitura. Até porque, irá nortear muita da acção política dos próximos anos. 

Termino com duas notas. 
  • A Arrábida, distinguida hoje pela UNESCO, como Reserva da Biosfera, sustenta-se em várias afirmações das quais destaco, relativamente ao turismo, apenas três: 
    • O peso do turismo da Arrábida no contexto da AML é reduzido; não existirão “enquanto se mantiver a sua atual e planificada gestão e estatuto jurídico, impactos negativos resultantes da atividade turística”; 
    • A estratégia de desenvolvimento e sustentabilidade que suporta a candidatura a Reserva da Biosfera assenta num crescimento sustentável da actividade turística”; 
    • No Plano de Acção definido consta a manutenção da “Arrábida/Espichel como paisagens e zonas únicas fora das pressões urbanas.” 
(Parece-me que está, a partir de hoje, garantida a possível reversão de empreendimentos turísticos sustentados num PDM desactualizado (conforme ficámos a saber, pela primeira e única vez em 8 anos e a pouco mais de 15 dias das eleições) e que colocam “paisagens e zonas únicas” no apetecível centro da especulação imobiliária e da pressão urbana.) 
  • A Arrábida, distinguida hoje pela UNESCO, como Reserva da Biosfera, ao definir uma estratégia de desenvolvimento sustentada na identidade arrabidina e, relativamente a acessibilidades e mobilidade na e para a Arrábida, destaco: 
    • Não se prevê a necessidade de expansão da rede viária nas próximas décadas.” 
(Ou seja, na estratégia de desenvolvimento definida pela Reserva da Biosfera, no território arrabidino “não se prevê a necessidade” de expandir a rede viária existente, durante as “próximas décadas” (plural). Dizendo de outra maneira: a rede viária existente é a que continuará a existir: sem expansões, sem alargamentos, sem ampliações. Explicando melhor: não será possível abrir novos arruamentos, nomeadamente aqueles que, estando previstos, até hoje não foram executados/consolidados. Significa que o desatualizado e obsoleto PDM em vigor, não serve para rigorosamente nada em matéria de vias que previa abrir nas áreas territoriais que, a partir de hoje são Reserva da Biosfera da UNESCO. Também o mais que desactualizado Plano de Acessibilidades do Concelho de Sesimbra, nomeadamente sobre as ligações a eixos fundamentais resultantes das grandes obras públicas que se avizinham – terceira travessia do Tejo, TGV e novo aeroporto Luís de Camões – carece de uma revisão e actualização perante os valores ambientais consolidados com esta classificação.) 

Agradeço mais uma vez aos peritos da UNESCO por garantirem a preservação deste cantinho à beira mar plantado: um território impar que foi descrito pela UNESCO como “uma jóia costeira”, que “representa 40% da flora portuguesa, incluindo 70 espécies raras e endémicas.” 

E uma nota final sobre a indústria extractiva. Transcrevo: 
A indústria extractiva – de recursos minerais não metálicos e em pedreiras -, presente em localizações incluídas na Zona de Transição proposta, representa uma reduzida área do território. (…). 
(…) presente na Zona de Transição, cumpre planos de lavra definidos, não passíveis de alargamento de superfície, e possui planos de recuperação de taludes e pedreiras exigentes e amplamente escrutinados pelas autoridades públicas presentes no território.” 
(…) Nas duas explorações atualmente activas – localizadas em Santana (Sesimbra) e Calhariz (Pedreiras) exploram-se calcários em pedreiras de grande e média dimensão, para a produção de agregados (britas) que se destinam fundamentalmente à construção civil e obras públicas, fins para os quais denotam grande aptidão técnica e que são imprescindíveis, em especial para as indústrias referidas. Estas explorações de calcário têm sido responsáveis por uma grande parte da produção da região de Lisboa e Vale do Tejo bem como da produção de calcário a nível nacional, facto que reflete a importância desta actividade. Uma parte destas pedreiras já se encontram desativadas e algumas delas em fase de recuperação face ao plano de reconversão a que estão sujeitas.” 

(A indústria extractiva presente no Concelho de Sesimbra, tem sido responsável “por uma grande parte da produção da região de Lisboa e Vale do Tejo”. Cumprem “planos de lavra definidos” e não são “passíveis de alargamento de superfície.” Mesmo com o volume de obras públicas que se avizinham e que acima mencionei?) 

Que o facto de ser a 13ª. Reserva da Biosfera em Portugal seja um golpe de sorte. E não apenas e só, mais uma classificação (como tantas outras), sem consequências absolutamente nenhumas no território sesimbrense. 

E sobre os empreendimentos turísticos previstos e viabilizados: seria interessante saber o que terão a dizer sobre os mesmos, a Comissão Consultiva, Cientifica e Executiva desta que é, a partir de hoje, a Reserva da Biosfera da UNESCO: Arrábida.




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