MAIS DOIS “ELEFANTES NA SALA” NA REUNIÃO DE CÂMARA - SESIMBRA

E mais uma vez, no seguimento da última reunião de Câmara do passado dia 21 Abril, não posso deixar de referir mais dois elefantes que estiveram na sala do Auditório Conde Ferreira, aquando da aprovação, também por unanimidade (claro está) dos Pontos 2 e 3 do período da ordem do dia (relativo a requerimentos e processos). E opto por juntar os dois elefantes num único post porque a deliberação sobre os dois pontos precisou apenas de uns míseros três minutos. Três minutos, para deliberar alegremente e, unanimemente.

Começo então pelo Ponto 2: “Viabilidade de alteração ao alvará (…) – Horta do Canino – Vila de Sesimbra”, transcrevendo textualmente aquilo que foi dito na reunião de Câmara:

…cedência para o domínio público de 3.743 para espaços verdes e de utilização colectiva. 468 para equipamento de utilização colectiva que nós não queremos aceitar, portanto é um lote que fica também numa zona quase de difícil construção. E área de cedência para a via N3B de 3.084,79. A via N3B que é a ligação de Argéis à Av. da Liberdade. Temos a criação da rotunda lá em cima junto da… e depois temos a cedência para o domínio privado e há a construção de um pequeno troço.

…a construção da rotunda para além de todas as questões que estão aqui enunciadas e a cedência para a via que vai ligar Argéis à Av. da Liberdade (…) temos aqui uma proposta de 468m a ceder para domínio privado que a Câmara se propõe não receber e substituir por taxas, isto porque esta cedência para equipamento a entrar no domínio privado municipal, para nós não nos interessa portanto, não iremos nunca fazer, nunca naquele, no canto do loteamento, nenhum, nenhuma construção, nenhum equipamento e portanto a ideia, substituir isto por taxas.”

Posto à votação, o Ponto 2 da ordem de trabalhos foi aprovado por unanimidade sem perguntas, sem respostas, sem uma única dúvida. Tudo claro e límpido. E afinal, o que é que o executivo aprovou? Receber taxas (dinheiro) em vez de terreno destinado a equipamento público. Aceitar a cedência relativa a “espaços verdes e de utilização colectiva.” Congratular-se pela cedência de parte da via N3B que irá ligar Argéis à Av. da Liberdade sendo que ter-se-á “a criação da rotunda lá em cima junto da…” e haverá “a construção de um pequeno troço.” Absolutamente fantástico. E “a criação da rotunda lá em cima junto da…”?, será que faltou dizer a palavra ‘ribeira’? É melhor acabar a frase em “junto da…”. Adiante.

E o que é que afinal foi deliberado? A deliberação tomada visou alterar um alvará de loteamento, constituindo mais 15 lotes e omitindo qual passou a ser o número total de lotes constituídos. Acresce que, igualmente omisso, mas que não levantou qualquer tipo de dúvida ou pergunta na reunião de Câmara, surgem as áreas de STP atribuídas a habitação (8.421,97m²), comércio (96,77m²) e equipamento (468,32m²), num total de 8.987,06m2, sem referência ao índice de construção, nem esclarecendo qual foi a área aprovada de STP perante a área já consolidada no alvará emitido. 

(Apenas uma nota: aparentemente o loteamento não terá esgotado a capacidade construtiva no alvará inicialmente emitido, o que terá permitido que a Câmara autorizasse mais 15 lotes e mais não sei quantos metros quadrados de área de construção (STP). Ou seja, um promotor que tem uma possibilidade construtiva de “x” optou inicialmente por não a esgotar, construindo apenas “y”. A mim, pessoalmente, espanta-me o facto de ninguém ter questionado este acréscimo de lotes e de STP. Sabendo-se que, conforme tenho referido, o PDM define para a Vila de Sesimbra um índice de construção menor ou igual a 0.8 e que, nem sequer é referenciado. É evidente que, se no conteúdo da deliberação constassem informações claras sobre esta aprovação, cairiam por terra todas estas minhas suposições. Sim, não passam de suposições face ao desconhecimento total que tenho sobre os parâmetros urbanos que terão sido aplicados e/ou cumpridos, sabendo-se que é o PDM quem define os termos de referência para estas aprovações/deliberações. Acresce que, esta minha suposição ganhará força perante a deliberação tomada na mesma reunião, relativamente à (e cito) “Viabilidade de construção de edifício de uso misto, equipamento, habitação e turismo – Rua Amélia Frade – Vila de Sesimbra ” e que aplicou um índice de construção igual a 1.3).

Foram também aprovados 94 fogos, com uma área média inferior a 89m2. E aqui, não resisto a transcrever novamente aquilo que foi dito sobre o ponto 1 da ordem de trabalhos e que referi em “UM ELEFANTE NA SALA” NA REUNIÃO DE CÂMARA - SESIMBRA: “façamos todos um esforço para perceber em que tipo de espaços é que podemos intervir em termos de requalificação na Vila de Sesimbra, que possamos transformar em apartamentos para que as pessoas se possam fixar cá, e isto não ser só palavras da boca para fora: a nossa preocupação com a desertificação da Vila.” Perdoem-me a insistência sobre esta matéria mas, a Câmara aprova mais 15 lotes, autoriza a constituição de 94 fogos e não quer o terreno para equipamento (prefere Taxas, dinheiro). Pergunto: e onde fica a “preocupação com a desertificação da Vila?” 

Atentem no que estabelece o Regulamento Municipal de Taxas e Cedências Relativas à Administração Urbanística, nomeadamente em relação ao pagamento de compensação por área de cedência em falta (no caso, o terreno destinado a equipamento com cerca de 468m²) e que transcrevo (ponto 6): “A compensação é realizada através da cedência, para domínio privado municipal, de lotes urbanos constituídos através de loteamento, com possibilidade construtiva igual à área de cedência em falta multiplicada por 0,35.” Pergunto: em 15 lotes autorizados a mais, porque não destinar um dos lotes a esta compensação, constituindo fogos com rendas acessíveis destinados a fixar população na Vila de Sesimbra? 

Atentem agora no ponto 7 (que transcrevo parcialmente) do mesmo Regulamento Municipal de Taxas e Cedências Relativas à Administração Urbanística: “A requerimento do interessado, a compensação (C) pode ser paga em numerário (…).” Ou seja, o promotor terá de requerer à Câmara que a compensação seja paga em numerário, anulando a cedência de lotes com possibilidade construtiva. E a Câmara terá de analisar o requerimento, emitir parecer e aceitar ou não, esse pagamento em numerário. O que assistimos foi a uma deliberação camarária em que ela própria decide que não quer terreno (onde podia fazer fogos com rendas acessíveis) mas sim taxas. Inacreditável.

Mas ainda há mais: ponto 12 do mesmo Regulamento Municipal de Taxas e Cedências Relativas à Administração Urbanística: “Pode ainda, também a requerimento do interessado, ser autorizada a substituição da compensação pela construção nos lotes urbanos que deveriam ser cedidos, de habitação a custos controlados, caso em que a respectiva comercialização deve ser feita segundo lista a elaborar pela Câmara.” Nem sei que diga. A Câmara deliberou substituir uma cedência de terreno por um valor em taxas (valor esse que corresponderá a cerca de 37 mil euros), anulando desde logo a possibilidade de receber lotes urbanos com possibilidade construtiva ou, habitação a custos controlados em plena Vila de Sesimbra. Talvez apenas voltar a transcrever uma das frases ditas na mesma reunião (e que referi aqui): “temos que ter uma visão… e não só ser da boca para fora em relação à fixação da população na Vila de Sesimbra…

É de facto urgente “ter uma visão”. E essa visão passará também, por ver e ler o que está escrito no Regulamento Municipal de Taxas e Cedências Relativas à Administração Urbanística e, cumprir. 

Mas há mais: foram aprovados 7 pisos (4 acima da cota de soleira e 3 abaixo da cota de soleira). 7 Pisos! E o que diz o PDM? “As novas construções deverão integrar-se na topografia natural do terreno e na escala ambiental da área em que se inserem.” O que será óbvio com sete pisos pendurados na encosta (estou a ironizar). Para já não falar na ribeira existente e sobre a qual não foi feita nenhuma referência ou estabelecida qualquer condicionante. Nem serão necessárias imagens 3D para perceber o enorme impacto que tais construções irão introduzir na paisagem onde se inserem e que, grosso modo, irão conviver com o Bloco do Moinho, a serra, a ribeira,... Absolutamente inacreditável. 7 Pisos. O “arranha-céus” tem 8 pisos e é o elemento dissonante, conforme referi NAQUELE QUE SERÁ O MAIOR ATENTADO URBANÍSTICO DA VILA DE SESIMBRA - O MONO DA VILA AMÁLIA. Só para se ter uma ordem de grandeza. Acresce que a deliberação de Câmara não refere o número total de lotes, apenas deliberando sobre o número total de fogos (94) pelo que se desconhece quantos serão os edifícios de 7 pisos espalhados pela encosta da serra e que irão surgir naquela que é a via do PDM identificada como N3B e que ligará Argéis à Av. da Liberdade. 

Dizer também que foram aprovados 26 lugares destinados a estacionamento público. E numa conta rápida, teriam de ser no mínimo, 49. A menos que tenham sido aprovados mais 26 lugares. E isso é impossível saber dado que a deliberação tomada é completamente omissa.

Termino fazendo referência ao regime jurídico da urbanização e edificação, quando estabelece que as alterações a operações de loteamento são precedidas de consulta pública. Astutamente, a deliberação de Câmara omite a área da propriedade assim como a referência à população existente no aglomerado urbano onde se insere o loteamento. Sem palavras.

Espero sinceramente que também esta deliberação seja revertida, anulada, para que sejam cumpridos os pressupostos legais e em vigor. E caberá à entidade Câmara Municipal produzir e proceder à respectiva consulta pública, disponibilizando os dados relativos a esta iniciativa privada e que não passam por imagens 3D mas sim por parâmetros urbanísticos claros (índice de construção, área da propriedade, planta de localização, planta de implantação, plantas gerais, alçados conjunto, condicionantes, infraestruturas,…), aliás convém dizer aqui que esta pretensão integrava o estudo de ordenamento da Av. da Liberdade apresentado em 2006 (nomeadamente “a via N3B que é a ligação de Argéis à Av. da Liberdade. Temos a criação da rotunda lá em cima junto da… e depois temos a cedência para o domínio privado e há a construção de um pequeno troço”). Mas isso era em 2006, quando a Câmara apelava à participação dos sesimbrenses e o Presidente Augusto Pólvora ouvia, discutia e partilhava opiniões. Agora, em 2021, e desde 2017, os tempos são outros!

Talvez seja melhor avançar para o outro “elefante na sala.

E o que dizer sobre o Ponto 3: “Obras novas – construção condomínio de 8 moradias, restaurante, health club, piscinas e muros – Rua do Casalinho – Fetais”

Talvez transcrever apenas um excerto de um dos parágrafos da deliberação tomada (dado que ninguém, absolutamente ninguém do executivo, abriu a boca sobre esta pretensão): “Considerando que se trata de uma operação urbanística com impacto semelhante a loteamento (…)”.

Ora, “uma operação urbanística com impacto semelhante a loteamento”, tem obrigatoriamente, consulta pública, porquanto não está inserida em Plano de Pormenor ou loteamento, conforme referi AQUI. Mais uma vez, é urgente que esta deliberação seja revogada, anulada, para que sejam cumpridos os pressupostos legais. E caberá, mais uma vez, à entidade Câmara Municipal produzir e proceder à respectiva consulta pública, disponibilizando os dados relativos a esta iniciativa privada e que não passam por imagens 3D nem por frases promocionais mas sim por, parâmetros urbanísticos claros (índice de construção, área da propriedade, planta de localização, planta de implantação, plantas gerais, alçados conjunto, condicionantes, infraestruturas,…).

E conforme já referi em anterior post, não se trata de calhandrice. Trata-se de cumprir a lei do país e do concelho. Promovendo a cidadania, a participação pública na democracia, na sociedade, na comunidade, na gestão do concelho que é de todos e para todos. Gerando consensos e promovendo o bem-estar das populações que serão assim, parte activa nas decisões tomadas pelos políticos que nos representam. E como são apenas nossos representantes têm de prestar contas aos representados.

A gestão de um concelho é de, e para, os cidadãos, os munícipes, de uma forma transparente e informada. E não de, e para, um qualquer promotor privado, surgindo na comunidade, no território municipal, como “novidade” e “surpresa!”.


FONTE DA IMAGEM: espectivas.wordpress.com


Comentários

Mensagens populares