MAS ALGUÉM ACREDITA QUE O NOVO CENTRO DE SAÚDE DA QUINTA DO CONDE VAI CUSTAR 1 MILHÃO E 400 MIL EUROS??

O novo Centro de Saúde da Quinta do Conde tem um financiamento a 100%, via PRR, no valor de 1 milhão e 400 mil euros, sendo que a assinatura do contrato de financiamento para a sua construção foi assinado ontem.

Importa lembrar que o novo Centro de Saúde de Sesimbra custou mais de 3 milhões de euros ou seja, mais do dobro daquilo que irá custar o novo Centro de Saúde da Quinta do Conde.

E lembrar também que, quando foi inaugurado em 2012 o actual Centro de Saúde da Quinta do Conde, o investimento foi de 1 milhão e 200 mil euros. Passaram mais de 10 anos. Como é que em 2023 se vai construir um novo Centro de Saúde com 1 milhão e 400 mil euros, tendo como exemplo o novo Centro de Saúde de Sesimbra que ultrapassa os 3 milhões de euros?

Mas alguém acredita que o novo Centro de Saúde da Quinta do Conde vai custar 1 milhão e 400 mil euros? Ninguém. Nem o executivo municipal. Ou melhor, nenhum elemento do executivo municipal, eleito pela CDU, acredita nisso. 

Vem isto a propósito da reunião de Câmara que decorreu na passada sexta-feira (24 de Março) em que o candidato eleito pelo Chega e agora, independente, trazia um agradecimento da população da Quinta do Conde sobre (e cito textualmente) “a tomada de posição da CDU em relação à construção da Unidade de Saúde da Quinta do Conde que era uma promessa do governo central e que agora a Câmara fez saber que vai fazer essa obra."

Ora a reacção não se fez esperar. De quem? Do primeiro candidato eleito pelo PS. Cito textualmente: "Quero esclarecer que não é uma obra CDU, é uma obra do executivo municipal que é composto por eleitos da CDU, eleitos do Partido Socialista e um independente e que é com recursos a fundos do PRR. Não é uma obra da CDU, é uma obra do executivo municipal que é composto por várias forças políticas nomeadamente CDU e PS e um independente”.

E a resposta do candidato eleito pelo Chega e agora, independente (cito parcial e textualmente): "eu disse CDU porque os outdoors e cartazes que tão lá, estão escritos CDU, e quando fui chamado como representante do povo, eleito por esse povo, só fiz aquilo que o povo pediu.

E de seguida, a reacção (ou melhor, a satisfação misturada com preocupação) do Vereador das Finanças, eleito pela CDU. Cito textualmente: "Espero é que o valor do PRR chegue para o Centro de Saúde, porque aqui em cima aquilo que o Município recebeu para fazer este aqui, que está praticamente concluído, se calhar não chega a metade do valor lá despendido. Mais o acompanhamento da obra, mais os projectos, mais o terreno, mais isso tudo. Portanto nós temos sido sempre parte da solução e não parte do problema no que à saúde nos diz respeito e só queríamos era que o governo de facto colocasse cá os médicos."

E as palavras da Vice-Presidente: "Como todos sabemos o PRR não financia na totalidade porque há muitas verbas que terão de ser suportadas, já não tou a falar do terreno, já não tou a falar do projecto, já não tou a falar da fiscalização da obra, tou a falar mesmo de entrar com dinheiro do orçamento municipal, ou seja dinheiro de todos nós, que pagamos os nossos impostos em Sesimbra, para a construção deste novo Centro de Saúde, portanto esperemos que este esforço que também mais uma vez está a ser pedido aos sesimbrenses se reverta depois em melhores cuidados de saúde para os mesmos."

E o que dizem afinal os outdoors e cartazes da CDU espalhados pela Quinta do Conde? Transcrevo: 

A Autarquia assume uma obra que competia ao governo PS: cedência do terreno, candidatura ao PRR, lançamento do concurso, gestão e fiscalização de obra.”

Vamos lá por partes:

1.A Autarquia assume uma obra que competia ao governo PS”. Exactamente. E porquê? Permitam-me utilizar uma expressão da moda política sesimbrense: há quatro dimensões:

Primeira dimensão:

  • Porque, foi o governo PS, através da ARS, que desenvolveu o projecto do novo Centro de Saúde da Quinta do Conde, do qual obteve financiamento através do Portugal 2020. Aliás, uma das promessas da CDU constantes no programa eleitoral das eleições autárquicas de 26 de Setembro de 2021 afirma: "Continuar a exigir o lançamento da empreitada de construção da nova Unidade de Saúde familiar da Quinta do Conde, cujo projecto se encontra concluído e com candidatura a fundos comunitários aprovada, e construir os acessos e arranjos exteriores".

Segunda dimensão:

  • Porque, foi o governo PS que publicou o Anúncio que possibilitava o lançamento do concurso para a Construção do novo Centro de Saúde da Quinta do Conde. E foi a ARS que dinamizou esse concurso. Aliás, o Comunicado da CDU de Sesimbra datado de dia 1 de Outubro de 2021, refere ter sido publicado o "anúncio para o lançamento do concurso público para a Empreitada da Construção do Novo Centro de Saúde da Quinta do Conde."

Terceira dimensão:

  • O concurso foi dinamizado pela ARS mas, infelizmente não houve candidatos. Ou seja, o concurso ficou deserto. E o financiamento do Portugal 2020, perdeu-se.

Quarta dimensão:

  • Entretanto, foi aprovado o PRR. E nesse âmbito, com financiamento a 100%, surgia a possibilidade de construir novas unidades de saúde “para substituir edifícios desadequados”. E foi quando a Autarquia recebeu o projecto desenvolvido pela ARS e dinamizou a respectiva candidatura, assumindo “uma obra que competia ao governo PS” com financiamento a 100%, pago exclusivamente pelos dinheiros vindos da Europa.

2. A “cedência do terreno” e segundo consta, parte do terreno é propriedade da ARS sendo que a Autarquia cedeu apenas duas parcelas e não, a totalidade do terreno necessário para implementar o novo Centro de Saúde. Mas, importa referir que compete à Autarquia garantir, através da aplicação dos planos de ordenamento do território, os terrenos necessários à implantação de equipamentos, nomeadamente e no caso, do Centro de Saúde. A Autarquia não fez mais nem menos do que aquilo que é a sua competência: assegurar os terrenos necessários para construir equipamentos, sejam eles Centros de Saúde, Escolas, Tribunais, Postos de GNR,…

3. A “candidatura ao PRR” e o “lançamento do concurso”, que se saiba, não tem qualquer tipo de custo associado. O custo que terá associado decorre unicamente do desempenho das funções diárias dos técnicos responsáveis por estas matérias e que integram os quadros da Autarquia. Mais: o custo associado é aquele que corresponderá ao valor salarial mensal dos técnicos que promovem, no âmbito das suas competências diárias, as candidaturas e os lançamentos de concursos promovidos pela Autarquia.

4. A “gestão e fiscalização de obra” serão (digo eu) asseguradas pelos técnicos da Autarquia (como em muitas outras obras promovidas pela Autarquia) e o custo associado corresponderá também e unicamente, ao valor salarial mensal dos técnicos que no desempenho das funções diárias, efectuam a gestão e fiscalização das obras promovidas pela Autarquia. 

5. Na palavra “assume” não consta qualquer tipo de custo associado; melhor explicando: é a Autarquia que lidera o processo mas, é o PRR que paga. Tudo.

Voltemos às palavras da Vice-Presidente: "Como todos sabemos o PRR não financia na totalidade porque há muitas verbas que terão de ser suportadas.” Quais? Não disse. Mas disse que não se estava a referir nem ao “terreno”, nem ao “projecto”, nem à “fiscalização da obra”. Como é óbvio. Novamente três dimensões:

  • O “terreno” destinado a equipamentos públicos resultam dos planos de ordenamento do território sendo que compete à Autarquia assegurar os mesmos (seja através de cedências; seja através de aquisição; seja através de expropriação por interesse público). Acresce que, uma parte do “terreno” é da ARS.
  • O “projecto” foi desenvolvido, elaborado, executado pela ARS. E até esteve em vias de ser construído se por um acaso o respectivo concurso (para a construção do novo Centro de Saúde), não tivesse ficado deserto. A Autarquia, quando recebeu o projecto da ARS, procedeu à sua revisão, pormenorização e orçamentação. Esses trabalhos foram desenvolvidos pelos técnicos da Autarquia. Ou seja, o custo associado à revisão, pormenorização e orçamentação do projecto da ARS, corresponde ao ordenado auferido mensalmente (e que é como sabemos, uma fortuna incalculável) pelos técnicos da Autarquia que os elaboraram. A menos que tenha sido efectuado algum contrato de prestação de serviços (tal como aconteceu relativamente ao novo Auditório para o Parque Augusto Pólvora, com um ajuste directo no valor de 19.700€ - mais IVA - com um prazo de 90 dias; ou sejam pouco mais de 6.500€ por mês; com este valor mensal são pagos os ordenados de pelo menos, quatro técnicos da Autarquia) e aí seria útil saber qual foi o montante despendido e que terá sido pago com o dinheiro dos nossos impostos.
  • A “fiscalização da obra” (a menos que venha a ser efectuado algum contrato de prestação de serviços; e aí será útil saber qual o montante que irá ser despendido e que será pago com o dinheiro dos nossos impostos) será assegurada (como em muitas obras da Autarquia) pelos técnicos da Câmara pelo valor que auferem mensalmente, para desempenhar essas funções.

Ora se existem outros custos que não estes (porque todos estes decorrem das despesas com pessoal devidamente previstas e programadas anualmente no orçamento municipal) quais são os outros custos que “o PRR não financia” e para os quais será necessário “entrar com dinheiro do orçamento municipal, ou seja dinheiro de todos nós, que pagamos os nossos impostos em Sesimbra”?

O PRR paga tudo, tendo por base (e permitam-me voltar, de novo, a uma explicação prestada na reunião de Câmara que aprovou o Orçamento Municipal de 2021 e que referi AQUI), a “maturidade nos projectos (…) alguns projectos ou estudos prévios pelo menos de arquitectura, com estimativa de custos, que serão essenciais e fundamentais para que possamos ir a jogo. (…)” 

E o “ir a jogo” seria “naquilo que já sabemos hoje que são as prioridades de investimento do Plano de Recuperação e Resiliência (que é muito apetecível porque tem financiamento a 100%)”. Estávamos em 2020. 

E o PRR era “muito apetecível porque tem financiamento a 100%”. Ou seja, paga tudo aquilo que for descriminado nos “projectos ou estudos prévios pelo menos de arquitectura, com estimativa de custos” e que terão “maturidade” para “ir a jogo”. Nem mais um cêntimo. Significa portanto que, se no decorrer da obra existirem trabalhos que não estavam previstos nem considerados na “estimativa de custos”, terá de ser alguém, que não o PRR, a assumi-los. No caso do novo Centro de Saúde da Quinta do Conde (cujo financiamento aprovado pelo PRR é de 1 milhão e 400 mil euros), se vierem a existir trabalhos que não estavam previstos nem considerados na “estimativa de custos” terá de ser a Autarquia a assumi-los e não, o PRR.

Ou seja, a Autarquia, entrará “com dinheiro do orçamento municipal, ou seja dinheiro de todos nós, que pagamos os nossos impostos em Sesimbra” para suportar os trabalhos não previstos nem considerados na “estimativa de custos”. Mas, se a Autarquia, não entrar “com dinheiro do orçamento municipal, ou seja dinheiro de todos nós, que pagamos os nossos impostos em Sesimbra” (o que seria inédito), a obra decorrerá apenas e só, de acordo com o projecto com “maturidade” que foi financiado pelo PRR. Mas ainda tem outra possibilidade: ao invés de entrar “com dinheiro do orçamento municipal, ou seja dinheiro de todos nós, que pagamos os nossos impostos em Sesimbra”, para suportar os trabalhos não previstos nem considerados na “estimativa de custos”, e se os mesmos se revelarem de superior importância, poderá anular trabalhos inicialmente previstos e considerados na “estimativa de custos” que correspondam ao mesmo valor dos trabalhos que não estavam previstos nem considerados na “estimativa de custos”. Simples.

E poder-se-á perguntar porque é que podem existir trabalhos não previstos nem considerados na “estimativa de custos” que foi financiada pelo PRR? Simples: Porque em pouco mais de dois meses não se elaboram projectos com “maturidade”. Relembro que a 6 de Julho de 2022 (conforme referi AQUI), o Presidente da Autarquia afirmou que “o projecto ainda não está totalmente finalizado, ainda não foi quantificado o montante”. E que no dia seguinte foi publicado o Aviso, no âmbito do PRR, para submissão de candidaturas até ao dia 30 de Setembro de 2022. 

Um projecto com “maturidade” precisa de tempo! Tempo para rever o projecto da ARS. Tempo, muito tempo, para pormenorizar. Para contabilizar. Para coordenar. Para definir soluções e materiais. Um projecto com “maturidade” não se faz em cima do joelho, recorrendo às “organizações Zé Rocha”. Reparem: é mais o tempo que decorreu entre o dia 30 de Setembro de 2022 e ontem, data da assinatura do contrato de financiamento para a construção do novo Centro de Saúde da Quinta do Conde (seis meses em burocracias) do que o tempo para rever, pormenorizar, quantificar e orçamentar um projecto com “maturidade” e com um financiamento aprovado no valor de 1 milhão e 400 mil euros. Nem mais um cêntimo. 

Voltemos às palavras do Vereador das Finanças: "espero é que o valor do PRR chegue para o Centro de Saúde, porque aqui em cima aquilo que o Município recebeu para fazer este aqui, que está praticamente concluído, se calhar não chega a metade do valor lá despendido".

Esta preocupação está revestida de uma grande fé. 

Mas alguém acredita que o novo Centro de Saúde da Quinta do Conde vai custar 1 milhão e 400 mil euros? Ninguém. E o executivo municipal, eleito pela CDU, parece saber que irão existir “muitas verbas que terão de ser suportadas (…) com dinheiro do orçamento municipal, ou seja dinheiro de todos nós, que pagamos os nossos impostos em Sesimbra.”

Muitas verbas que terão de ser suportadas” e que, neste momento, ninguém saberá a quanto corresponderá. Sabendo-se que o PRR não paga trabalhos não previstos nem considerados, importa também referir que ainda não está definido se o PRR assumirá ou não as actualizações orçamentais resultantes da subida de custos de materiais e matérias-primas e que não decorrem de trabalhos não previstos nem considerados, mas sim do efeito da guerra desencadeada pela Rússia ao invadir militarmente a Ucrânia. 

E afinal de quem é a responsabilidade do novo Centro de Saúde da Quinta do Conde? Não é, com toda a certeza, nem da CDU, nem do PS, nem de qualquer outra força político/partidária. Será da ARS que fez o projecto. Será do governo que lançou o anúncio que ficou deserto. Será da Autarquia que fez a revisão, a pormenorização e a orçamentação. E será do PPR que o financia a 100% pelo PRR. E se vierem a existir trabalhos que não estavam previstos nem considerados na “estimativa de custos” será pago com o dinheiro dos nossos impostos. 

O novo Centro de Saúde da Quinta do Conde vai ser de todos nós e não será de ninguém em particular. 

Terão tempo de puxar a brasa às vossas sardinhas em 2025. Até lá, era bom que resolvessem, promovessem e implementassem o que prometem há anos, e que é única e exclusivamente da responsabilidade da Autarquia, não tendo de se substituir nem ao governo nem a ninguém! (e nem sequer vou dar exemplos).


Fonte da imagem: sesimbra.pt

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