REVOLUÇÃO EM SESIMBRA?? - 2ª. PARTE
Permitam-me que inicie este post com uma história: há cerca de 30 anos, quando se começava a dar os primeiros passos no encontro de soluções para a mobilidade e acessibilidade, nomeadamente de pessoas com dificuldades motoras, começaram a ser implementadas algumas soluções nos espaços públicos, através da substituição de pavimentos e da construção de rampas de acesso. E a faculdade não foi excepção. Substituiu alguns pavimentos e construiu rampas que, pela inclinação e material aplicado eram autênticos escorregas. Lembro-me de um dos professores (arquitecto) já com alguma idade, dizer: “Não usem as rampas que fizeram por aí. Porque quem não tiver dificuldades motoras corre o risco de as ficar a ter.”
Vem isto a propósito (mais uma vez) da notícia que foi publicada no jornal regional “Sem Mais”, (no passado sábado, dia 13 de Junho) com uma explicação do Presidente da Câmara, nomeadamente sobre o "Plano de Acção e Mobilidade (Urbana) Sustentável (PAMUS)". Diz a notícia que este plano “implica num investimento de cerca de 3,2 milhões”. E o Presidente da Câmara explica: “Temos vindo a intervir em várias frentes, falta construir o percurso pedonal que ligará a Azoia à Aldeia Nova da Azoia, todos os outros estão executados”.
E faço aqui uma pausa, apenas para repetir a afirmação do Presidente da Câmara: falta apenas construir o percurso pedonal na Azoia porque, todos os outros estão executados.
Voltando à notícia, e às palavras do Presidente da Câmara: “Trata-se de uma verdadeira revolução que permite o acesso pedonal aos principais hubs de transportes públicos do concelho.”
Uma revolução. E é de facto o melhor adjectivo para empregar. Em pleno século XXI, com os milhares de exemplos construídos um pouco por todo o mundo, relativos a acessos pedonais e mobilidade sustentável, são no mínimo, revolucionárias, as soluções que foram implementadas ao longo de troços de estradas e arruamentos do concelho. E não, não vou enumerar as obras realizadas na Aiana, ou em Alfarim, ou na Cotovia, ou em Sampaio, ou até na Maçã e junto ao Parque Augusto Pólvora. Nada disso. Até porque a página da CMSesimbra noticiava em Julho de 2019 que “as soluções arquitectónicas variam de acordo com as características de cada local.” E de facto, os locais têm características diferentes e diferenciadoras. E daria quase para desenvolver uma tese sobre o assunto. O que não cabe neste registo em post.
Perdoem-me a ironia mas, acredito que não serei só eu a ficar boquiaberta com algumas das soluções implementadas. Duvido até que, “as soluções arquitectónicas” implementadas no terreno tenham mão de arquitectos. E não quero acreditar que aquelas imagens que a página da CMSesimbra partilhou, com várias intenções desenhadas sobre uma planta aerofotogramétrica tenham servido como projecto, para a execução das obras. É sobre levantamento topográfico que se elabora um projecto de execução. Em especial, projectos de arruamentos (como estes). Por isso repito, não acredito que o que se vê executado tenha resultado de um projecto de execução sobre levantamento topográfico e, tenha sido elaborado por um arquitecto.
A verdade é que, “soluções arquitectónicas” (conforme referi no post: O QUE TEMOS DENTRO DE NÓS), todo o ser humano é capaz e competente para as apresentar. Aliás, todos os cidadãos do mundo nascem com duas profissões: treinadores de futebol e, arquitectos. Está no ADN, na genética da humanidade. E esta verdade justifica muito do que se vê, e do que não se vê, um pouco por todo o planeta. Adiante. Voltando à notícia.
A razão deste post é apenas pela afirmação do Presidente da Câmara dizendo que só falta fazer um troço na Azoia e que, todos os outros estão executados. Confesso que pensei que as obras estivessem paradas. À espera de finalização. Mas não. Afinal já estão executados.
Por isso, vou apenas referir-me ao acesso pedonal que foi executado na entrada da Vila, tendo em vista a posterior ligação ao tão aguardado Parque da Mata da Vila Amália. Trata-se de um acesso pedonal, em calçada, com zona de rebaixo no passeio para que pessoas com mobilidade reduzida possam aceder àquele percurso, assim como carrinhos de bebé.
E poderia agora transcrever o decreto-lei que regula as condições de acessibilidade a satisfazer nos projectos e na construção de espaços públicos. Vou limitar-me apenas à referência do número do decreto-lei: 163/2006 de 8 de Agosto. E vou apenas nomear sete pontos constantes do Anexo que estabelece as Normas técnicas para melhoria da acessibilidade das pessoas com mobilidade condicionada, para quem tenha paciência os ler e consultar: 1.2.1, 1.5.1, 4.3.1, 4.3.2, 4.5.1, 4.7.6 e 4.14.2.
Posto isto, o que vos proponho é um passeio por este percurso pedonal verdadeiramente revolucionário. Sugiro que iniciem o percurso como se viessem do Feijão em direcção ao semáforo antes dos Cravos. Entrem no percurso, à vossa esquerda, com calma e devagar. Porque a ribanceira está mesmo ali e podem precipitar-vos para uma valente queda em cambalhotas de uma altura perto dos 3 metros. Ultrapassado este susto, caminhem para a direita. Cuidado com a cabeça nas placas de sinalização. E quando começarem a descer, cuidado se forem com calçado de borracha e atenção com a curva acentuada. Podem escorregar, cair, bater no muppi, bater com a cabeça no murete branco que faz de separador para o asfalto, ou na placa toponímica. E não se assustem se por acaso nesse exacto momento passar um autocarro mesmo, mesmo, pertinho de vocês. E chegam à base do talude, com mais de 3 metros de altura. Podem respirar. Mas sempre atentos à estrada. Depois, podem continuar a experiência, voltando a fazer o percurso para cima. Com cuidados acrescidos porque agora, os carros estão nas nossas costas e bem pertinho. E não temos onde nos agarrar.
É de facto uma experiência revolucionária. E claramente um percurso pedonal, de mobilidade sustentável e recomendável a qualquer utilizador. Perdoem-me mais uma vez a ironia.
Voltando ao Estudo de ordenamento da Avenida da Liberdade que a CMSesimbra apresentou em Maio de 2006 (e que referi no post: REVOLUÇÃO EM SESIMBRA), este acesso seria executado parcialmente em escada, que ligaria a uma passadeira até à paragem do Feijão. Ou seja, esta solução revolucionária e perigosíssima, não faz parte deste estudo de 2006. Haverá com toda a certeza outro estudo. Que não conhecemos. Não é público. Com certeza virá a ser um dia… com tempo e no tempo certo.
Não mereciam os Sesimbrenses ser informados destas obras, realizadas com dinheiros públicos, dos nossos impostos, que atingem um valor de 3,2 milhões de euros? Obras que põem em causa a segurança dos seus utilizadores mas que surgem classificadas como “acesso pedonal aos principais hubs de transportes públicos” de acordo com um “Plano de Acção de Mobilidade (Urbana) Sustentável”?
Quererão os Sesimbrenses um percurso sinuoso, perigoso e revolucionário que põe em causa a segurança dos seus filhos e dos seus avós? Alguém consegue imaginar um adulto de bengala, ou de cadeira de rodas, ou cego, a caminhar naquele acesso pedonal? Alguém consegue imaginar uns pais com um carrinho de bebé? Alguém consegue imaginar um grupo de crianças, em correrias, puxões e encontrões numa ribanceira com mais de 3 metros de altura e precipitada sobre a estrada?
Mas o objectivo não era criar acessos pedonais “aos principais hubs de transportes públicos”? Então esta intervenção deveria ter sido efectuada junto à paragem do Feijão. É lá que dezenas de crianças (para não dizer centenas) apanham diariamente os autocarros? O acesso da Escola à paragem, esse sim, carece há anos, de uma solução de Mobilidade Sustentável e em segurança, anulando aquele perigo de escadas, muros, rampas, baias,…
Enfim. Perdoem-me a insistência mas, tudo tem o seu tempo. E haverá, com toda a certeza, um tempo certo. Algures no futuro. E nesse futuro, teremos com toda a certeza, mais surpresas como esta. Nem sei de ria se chore.
Com toda a certeza que o Presidente da Câmara quando referiu que os percursos pedonais já estavam todos executados (excepto o que irá ligar a Azoia à Aldeia da Azoia), ter-se-á esquecido deste em particular. Quero acreditar que, até à concretização do Parque da Mata da Vila Amália, e que fará a ligação a este percurso, serão implementadas medidas de segurança… e que a obra executada é experimental… depois será corrigida. Ou até demolida e reposta a imagem de antigamente. Fica a ideia. Que não é inédita: repor a imagem original.
Conheço um arquitecto que um certo dia, pegando numa planta de Sesimbra, começou a marcar com lápis-de-cor os edifícios que, na sua opinião, deviam ser implodidos. Como o entendo tão bem. Também eu era capaz de mandar uma série de coisas pelo ar! E provavelmente, este acesso pedonal seria o primeiro.
Mas, até lá, todo o cuidado é pouco. E não, não estou a exagerar. Partilho em baixo algumas imagens porque, de facto, dizem mais do que mil palavras. Lembrai-vos das palavras sábias do professor (arquitecto) que referi no início do post: “quem não tiver dificuldades motoras corre o risco de as ficar a ter.”
E termino com uma pergunta: para quando um Plano de Acção e Mobilidade Urbana Sustentável global, para todo o Concelho, pensado e regrado, definindo vias partilhadas e de sentido único? Definindo ciclovias e percursos pedonais seguros para todos os utilizadores? Definindo passeios arborizados, zonas de estadia e descanso? Regrando o estacionamento, em especial junto das vias principais que atravessam o Concelho e as zonas urbanas consolidadas, com comércio a debitar directamente sobre essas vias? Definindo para a Vila uma utilização pedonal e viária coerente, de acessos pedonais, de percursos acessíveis a pessoas com mobilidade reduzida e resolvendo, de uma vez por todas, o problema de estacionamento? Plano esse que sirva de programa autárquico relativamente às grandes opções dos planos orçamentais anuais? E que passe a integrar a gestão diária de obras, reparações e alterações na estrutura viária e que, fazem parte da gestão normal do trabalho operacional de uma autarquia? Para que as obras sejam coordenadas? Para que quando se alcatroar um troço, uma semana depois não se vá abrir uma vala e fazer um remendo? Será isto uma utopia? Inalcançável num concelho como Sesimbra?
E lembrei-me agora: alguém saberá porque é que o orçamento de 2020 não está disponível na página da CM Sesimbra? Será segredo? Ou será que está a ser revisto face à pandemia mundial e, oportunamente, também Sesimbra apresentará publicamente, um Orçamento Rectificativo? Não sabemos.
Bem, tudo a seu tempo! Aguardemos pela Revisão do PDM. De certeza que estas questões (e outras) estão todas consideradas 😊
Não conhecia o "trajecto pedonal" . Realmente 1 imagem diz mais que mil palavras . Acessível ? a quem ?
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