ESCLARECIMENTO QUE NADA ESCLARECE SOBRE AS OBRAS QUE CONTINUAM PARADAS NA MATA DE SESIMBRA

Atente-se no esclarecimento prestado pelo Presidente da Autarquia na reunião de Câmara do passado dia 18 de Junho de 2025 (ao minuto 13:00) depois de questionado pela visível paragem e abandono das obras da Mata de Sesimbra: 

Sobre a questão também da obra da 1ª. Fase da Mata Sul... Fase 1. Portanto como se sabe também, ela teve parada devido à questão dos cortes de sobreiros (…)” 

De facto todos ficámos a saber que seria um sobreiro (na zona do depósito de água) que teria bloqueado o bom andamento dos trabalhos, salvo erro (porque a memória, pelo menos a mim, já me falha) desde o final de 2023, início de 2024. E, na reunião de Câmara de dia 17 de Julho de 2024, que prorrogou o prazo de execução das obras de urbanização (por mais 9 meses), aquando da leitura do respectivo ponto da ordem de trabalhos foi transmitido (e cito – minuto 19:57): 

    Estamos a falar daquelas obras de urbanização de parte da Fase 1 da Mata Sul que como se sabe estão paradas à espera da decisão do ICNF relativamente ao corte de um conjunto de sobreiros.” 

Ou seja, a prorrogação do prazo de execução das obras resultava da paragem verificada perante a espera de uma decisão do ICNF para autorizar (ou não) o corte de sobreiros. E com essa prorrogação do prazo da obra, era evitada a caducidade do processo. Digo eu. Voltemos ao esclarecimento: 

“(…) teve parada devido à questão dos cortes de sobreiros a...… que entretanto foi solicitado ao ICNF... a... o processo nem sequer passou pela Câmara, portanto o manifesto, já foi desbloqueada essa situação uma vez que o projecto em si é um projecto de interesse nacional e portanto é gerida até pelo próprio governo, entre os vários departamentos, sei que foi sanada essa essa situação (…)” 

O que raio tem a ver o “projecto de interesse nacional” com a paragem/abandono das obras? 

Nada. Rigorosamente nada de nada. 

Importa dizer que o Decreto-Lei que instituiu o sistema de acompanhamento de um “projecto de interesse nacional”, na secção relativa a «operações urbanísticas», remete para o disposto no RJUE, alterando apenas os prazos de decisão sobre os pedidos de licenciamento (reduzindo-o para 30 dias). 

E o que diz o RJUE sobre a paragem ou abandono de obras? Que a caducidade não ocorre se as obras estiverem suspensas por “facto não imputável ao titular da licença” (alínea b) do número 3 do artigo 71º). E obriga a que, no Livro de Obra, estejam registados “todos os factos que impliquem a sua paragem ou suspensão” (número 2 do artigo 97º). 

As perguntas que se impõem: 

  1. Qual é o “facto não imputável ao titular da licença” que poderá levar à suspensão da obra, mantendo válida a prorrogação do prazo de execução (deliberada a 17 de Julho de 2024)? 
  2. Quais são os “factos” que terão implicado a suspensão da obra e que foram, obrigatoriamente registados no Livro de Obra? 
Perguntando de outra maneira: 

  1. Terão os sobreiros nascido espontaneamente, entre 2020 (ano relativo ao pedido de licenciamento) e 2022 (ano em que foi emitido o alvará de loteamento)? 
  2. Numa pesquisa rápida na net, nas condições perfeitas, um sobreiro cresce cerca de 50cm por ano. Estaremos a falar de sobreiros com pelo menos, metro e meio de altura e que, provavelmente, o titular da licença não terá detectado aquando da apresentação do pedido de licenciamento à Câmara Municipal? 
Continuemos com o esclarecimento: 

(…) sei que tão a retomar a montagem do estaleiro e a informação que eu tenho não oficial também, é que provavelmente no final deste mês de Junho, inicio de Julho, retomarão os trabalhos (…)” 

O prazo para a execução das obras terminou no dia 17 de Abril de 2025. E não é possível voltar a prorrogar o prazo das mesmas. O loteamento (e obras de urbanização) aprovado para a Mata de Sesimbra, caducou. Avancemos com o fim do esclarecimento: 

(…) Há um processo também, com toda a clareza do mundo, há um processo de alteração ao loteamento que tem a ver com uma rectificação de áreas das, não são quatro lotes, sim são quatro lotes, que equivaliam às quatro parcelas dessa primeira fase a... em que não foram ainda registadas... na conservatória depois da emissão a... do alvará de loteamento e portanto tá uma fase de neste momento de alteração ao loteamento em curso também, para rectificação como eu disse das respectivas áreas." 

E o que raio tem a ver “um processo de alteração ao loteamento”, com a paragem/abandono das obras? 

Nada. Rigorosamente nada. 

Uma alteração de um qualquer loteamento aprovado só suspende as obras se resultar da “reposição da legalidade urbanística” (artigo 102º. do RJUE) resultante da “desconformidade com os respetivos atos administrativos de controlo prévio” (alínea b) do número 1) ou, “ao abrigo de ato administrativo de controlo prévio revogado ou declarado nulo” (alínea c) do mesmo número 1). 

Compete ao Presidente da Câmara ordenar “a realização de trabalhos de correcção ou alteração da obra, fixando um prazo para o efeito, tendo em conta a natureza e o grau de complexidade dos mesmos” (número 1 do artigo 105º. do RJUE). E é essa “ordem de realização de trabalhos de correcção ou alteração“ que “suspende o prazo que estiver fixado no respectivo alvará de licença pelo período estabelecido nos termos do n.º 1.” (número 4 do mesmo artigo 105º.). 

Acresce que, “o prazo referido no n.º 1 interrompe-se com a apresentação de pedido de alteração à licença” (número 5 do mesmo artigo 105º.) e, “obedece ao procedimento estabelecido” pelo RJUE (artigo 27º). Ou seja, a Câmara teria (nos termos do RJUE) um prazo de 200 dias para deliberar sobre o pedido de alteração à licença mas, sendo um “projecto de interesse nacional”, dispõe apenas de 30 dias. 

As perguntas que se impõem: 

  1. Existem algumas “desconformidades” verificadas que possam ter resultado na emissão de uma ordem do Presidente da Câmara para a “reposição da legalidade urbanística”, levando à suspensão das obras? 
  2. Se sim, qual foi o prazo fixado pelo Presidente da Câmara para a “reposição da legalidade urbanística”, “tendo em conta a natureza e o grau de complexidade” dos trabalhos a realizar? 
O esclarecimento prestado pelo Presidente da Autarquia na reunião de Câmara do passado dia 18 de Junho de 2025, nada esclarece. Apenas diz o que já sabíamos (a existência de sobreiros que levaram à paragem da execução das obras), acrescentando um conjunto de dados que nada acrescentam e não respondem à questão que lhe foi colocada (ao minuto 7:00): 

(…) o projecto da Mata que tá parado, (…) pode responder alguma coisa sobre este projecto que está parado e também tá deixando ali transparecer que a obra tá ao abandono (…)” 

Conforme referi na minha crónica (Abril) no jornal «Raio de Luz», as obras de urbanização relativas ao loteamento da Mata de Sesimbra, foram aprovadas com um prazo de execução de 18 meses, que foi prorrogado por mais 9 meses, tendo terminado esse prazo, no dia 17 de Abril de 2025. 

Não existe a possibilidade de prorrogar, mais uma vez, o prazo para a execução das obras de urbanização. Ou seja, o loteamento (e obras de urbanização) aprovado para a Mata de Sesimbra, caducou. 

A menos que exista um facto não imputável ao titular do alvará, registado no livro de obra e devidamente fundamentado, que motivou a paragem, a suspensão, o abandono das obras. Ou, as obras tenham sido suspensas (por ordem do Presidente da Câmara) no sentido de repôr a “legalidade urbanística”. E assim sendo, faltou dizer essa parte, “com toda a clareza do mundo”, no esclarecimento que nada esclareceu. 

Até porque, nem o ICNF, nem um “projecto de interesse nacional”, nem uma alteração a um loteamento requerido pelo seu titular, suspendem um acto administrativo que compete única e exclusivamente à entidade licenciadora. 

E uma pergunta final: 

  • Se a obra já estava parada, abandonada, na reunião de Câmara que aprovou a prorrogação do prazo de execução das obras por mais 9 meses (evitando a caducidade do processo) e uma vez que continua parada, abandonada até ao dia de hoje, como é que podem decorrer obras de urbanização, com aquela dimensão, tituladas por um alvará de loteamento caducado? 
Com toda a certeza que existirá um qualquer fundamento que enquadrará todo este imbróglio. Não sei que fundamento será. O que é natural, como é óbvio; sou apenas uma cidadã comum “cuja opinião vale o que vale” e claro, não percebo nada de nada sobre absolutamente nada. Muito menos sobre suspensões e caducidades de obras e factos não imputáveis aos titulares de alvarás. 

E lembrei-me agora: e a WWF? Continua a apoiar este “projecto de interesse nacional”, no sentido de garantir o cumprimento das metas ambientais e de sustentabilidade do programa «One Planet Living» para um empreendimento que está parado/suspenso por causa do abate de sobreiros? Vou enviar-lhes um e-mail. 


FONTE DA IMAGEM: agroportal.pt

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