INTERVENÇÃO DESASTROSA NA MARGINAL DE SESIMBRA
Vamos por partes.
Muitos se lembrarão daquela que era a imagem da Marginal de Sesimbra na década de 80/90 do século passado, com umas manilhas de betão no centro da via, que serviam de floreiras e, largas dezenas de carros estacionados colados ao muro da praia. E muitos se lembrarão igualmente, daquela estrutura de betão, pendurada sobre a rampa de pó que dava acesso à praia e à fonte da Califórnia.
No final dos anos 90, o processo do edifício do «Mar da Califórnia» chegava ao fim, com o licenciamento do hotel e conjunto de apartamentos que todos conhecemos; com a demolição da estrutura de betão e a criação de uma praça/miradouro sobre o oceano; com a execução de um passadiço em madeira, de acesso à praia e à fonte da Califórnia; e, com a reabilitação da Marginal de Sesimbra, retirando as manilhas de betão e anulando largas dezenas de lugares de estacionamento.
A imagem que faz capa deste post, corresponde àquela que se projectava viesse a ser a imagem da Marginal de Sesimbra. E são visíveis, bem visíveis, o conjunto de esplanadas localizadas do outro lado da estrada, na marginal pedonal junto ao muro da praia.
É óbvio que ninguém do actual executivo se lembrará do projecto. Alguns poderão lembrar-se apenas da realização das obras. E provavelmente nenhum terá assistido e participado nas sessões públicas de apresentação do projecto da Marginal, onde a população (residentes, comerciantes e restauração) participou em massa.
E é igualmente óbvio que nenhum dos elementos que projectou, analisou e aprovou o projecto e, seguidamente, acompanhou e recepcionou a obra, foi tido ou achado nesta que é uma intervenção desastrosa na Marginal de Sesimbra.
Os elementos responsáveis por esta intervenção desastrosa na Marginal de Sesimbra, ao não conhecerem o projecto, nem sequer terão procurado nos arquivos camarários os desenhos do projecto da Marginal ou, perguntado a todos os que, no final da década de 90 e até 2005, acompanharam os trabalhos realizados (que como disse e afirmo, não terão sido, nem tidos nem achados nesta intervenção desastrosa).
E mais: nem sequer olharam para a Marginal e tentaram perceber a lógica, a intenção, a coerência de todo o projecto concretizado. E claro, esta perceção será fácil para muitos mas, extremamente difícil para muitos outros.
E há perguntas que precisam de ser feitas. E respostas que merecem ser dadas:
Primeira pergunta:
Alguém terá questionado (ou percebido) porque é que foram definidas plataformas planas, de nível (como se fossem degraus gigantes), com outro tipo de pavimento, elevadas em relação à estrada, com vista directa para o mar e assegurando a continuidade de um percurso pedonal livre e desimpedido junto ao muro da praia?
Primeira resposta:
Porque, naquele local, a marginal desenvolve-se em rampa; para ser possível a colocação de esplanadas, a solução de projecto (e consolidada em obra), foi a de criar plataformas de nível, lisas e planas que permitissem a colocação de esplanadas em segurança e equilibradas. Explicando melhor: aquelas plataformas existem para receber chapéus-de-sol, mesas e cadeiras. Numa palavra: esplanadas. Dito de outra maneira: aquelas plataformas não foram criadas para receber bancos. Aliás, as plataformas que foram criadas para colocar bancos, estão consolidadas e têm (não sei se terão reparado) estruturas de ensombramento (porque bancos virados a sul, sem sombra, ninguém se sentará neles durante todo o dia).
Segunda pergunta (que são duas):
Alguém terá questionado porque é que não existem mais plataformas ao longo da Marginal para receber as esplanadas? Será que, fora das plataformas, o projecto (e consolidado em obra) não previu a localização de esplanadas?
Segunda resposta:
Não existem mais plataformas na Marginal porque, a Marginal é de nível (excepto no local onde existem as plataformas). Explicando melhor: não existem mais plataformas porque não era preciso criar uma plataforma lisa e segura numa Marginal que é plana. Dito de outra maneira: não existem plataformas mas, a estereotomia do pavimento define a localização das esplanadas, de forma a manter a coerência do projecto e assegurando a manutenção de um percurso pedonal livre e desimpedido junto ao muro da praia.
E com toda a certeza que ninguém reparou que os bancos da Marginal são em madeira. Madeira. E os que não são em madeira, são em betão branco. Branco. E têm assentos e costas em madeira. E mais: que estão colocados com uma lógica, com uma intenção, de acordo com a estereotomia definida pelos pavimentos.
Terceira pergunta:
E porque é que os bancos são em madeira e em betão branco?
Terceira resposta:
Para que se destaquem, para que brilhem, para que contrastem, para que se encaixem no ambiente urbano com elegância e bom gosto.
Recordo parte da intervenção do Presidente da Autarquia na sessão da Assembleia Municipal de dia 7 de Maio sobre as obras na Marginal:
“É um projecto que não agrada a toda a gente mas foi a visão que se teve”.
Não sei qual terá sido a “visão” que tiveram. Porque colocar bancos de betão que parecem aqueles monos que são colocados para segurar terras ou vedar estradas (os “new jersey”), espalhados por espaços vazios, sem qualquer lógica ou sentido ou preocupação ou relação com a envolvente, não lembra a ninguém.
E colocar vasos, vasos!, a estreitar uma via (que já é estreita) com uns raminhos verdes a enfeitar, é de facto uma “visão” que não lembra a ninguém.
Esta intervenção desastrosa na Marginal de Sesimbra é completamente ‘démodé’.
A Marginal de Sesimbra é um espaço público de excelência que deve ser respeitado e valorizado. Não se compara com um qualquer arranjo como se fosse o quintal lá de casa: com uns bancos e uns vasos, uma vedação para o lixo e uma delimitação para os triciclos das crianças estarem arrumados. Não. A Marginal de Sesimbra é grandiosa e obedece a uma lógica global, numa linguagem moderna, sofisticada e coerente.
E nessa lógica global e coerente, o projecto da Marginal de Sesimbra também definiu, para além dos locais destinados às esplanadas, o tipo de mobiliário a utilizar: mesas, cadeiras e chapéus-de-sol brancos, sem publicidade. Numa imagem apelativa, ordenada, limpa e regrada.
Na reunião de Câmara do passado dia 21 de Maio, o Presidente da Autarquia esclareceu que (cito parcial e textualmente):
“(…) uma parte grande da zona em frente à Sociedade Musical Sesimbrense, vai ser criada uma bolsa para motociclos. Ou seja, em toda aquela extensão que nós vemos logo ali em frente à Musical Sesimbrense, não existem tantos vasos nem existem tantos pinos porque efectivamente as motas não podem passar entre os vasos e os pinos altos e portanto nós vamos criar uma bolsa de estacionamento (…) Em frente à Música vai ser criada uma bolsa para motociclos e essa bolsa de motociclos com certeza que vai ter uma delimitação que também não vai permitir que as pessoas consigam atravessar a marginal de um lado para o outro (…)”
Nem sei que diga. Nem quero imaginar a “delimitação que também não vai permitir que as pessoas consigam atravessar a marginal de um lado para o outro”, e que vai consolidar uma barreira visual que, na tal “visão” que tiveram, não lembra a ninguém.
O problema de estacionamento é geral. E não é só em relação aos motociclos. A solução não passa por consolidar uma zona de estacionamento num local que, sendo nobre, jamais teria uma “delimitação” que consolidasse esse estacionamento. A solução passa por uma “visão” de fundo, sustentada numa estratégia que respeite a Marginal, respeite a população, respeite os peões e automobilistas e que, acima de tudo acrescente valor com as soluções preconizadas.
Os motociclos, tal como os automóveis, devem ter locais próprios para estacionar. Mas não através da consolidação de uma barreira visual e poluente, que anula a ligação natural do perímetro urbano ao mar.
De novo, cito parcial e textualmente:
“Portanto vai haver uma zona específica de atravessamento. (…) Nem toda a zona em frente à Música nós vamos poder passar de um lado para o outro. Nós vamos ter também, (…) zonas onde vamos ter passadeiras específicas, iluminadas, que vão ter aqueles foquinhos, exactamente para serem zonas onde tendencialmente as pessoas devem passar (…)”.
Confesso que estas frases me levantam muitíssimas questões para as quais não encontro resposta. O que será natural: não tive nem tenho essa “visão” que norteou o executivo nestas decisões. Mas permitam-me apenas duas perguntas:
- A Marginal é, no seu todo, uma zona de atravessamentos. Até porque com a “visão” que tiveram para anular o percurso pedonal junto aos edifícios, ocupando-o com esplanadas encavalitadas em cima umas das outras e com uns vasos sobre a estrada, direi que, em cada zona de esplanada encavalitada, será uma zona de atravessamentos e de projecção sobre a via, de uma forma (como referi na minha crónica de Maio no Jornal Raio de Luz) desprotegida e perigosa. Como é que as pessoas, por exemplo, que saem das suas habitações, conseguirão chegar a “uma zona específica de atravessamento”, sem que circulem no meio da estrada, uma vez que o que era um passeio está ocupado com esplanadas encavalitadas que não permitem sequer, que os clientes entrem e saiam em segurança dos estabelecimentos?
- Numa Marginal virada a sul, onde o sol bate directamente durante todo o dia, para que raios servirão “passadeiras específicas, iluminadas, que vão ter aqueles foquinhos, exactamente para serem zonas onde tendencialmente as pessoas devem passar”, durante todo o dia? E de noite, alguém conseguirá, mesmo querendo, atravessar a marginal nas “passadeiras específicas, iluminadas, que vão ter aqueles foquinhos"?
E ainda mais uma frase, sobre a criação de uma bolsa de estacionamento para motociclos:
“(…) até porque a GNR nos dá a indicação de que não havendo um local para estacionar eles não têm forma também de fazer cumprir nenhuma regra.”
Nem sei que diga. Talvez seja permitido estacionar em tudo o que é largos, passeios, ruas, avenidas e marginais em que, por não existirem locais para estacionar, a GNR não consegue “fazer cumprir nenhuma regra”. Fantástico.
A GNR consegue “fazer cumprir” todas as regras se os locais estiverem devidamente sinalizados. Por exemplo, com aquele sinal de trânsito redondo, de fundo azul, com um traço oblíquo em vermelho (e que, em muitos casos têm também um desenho de um carro de reboque a rebocar um veiculo mal estacionado, completados com a frase “sujeito a reboque”). Aparentemente na “visão” que tiveram, não surgiu nenhum sinal de trânsito de «estacionamento proibido». Foi pena. Resolveria facilmente e mais economicamente, o estacionamento desregulado na Marginal de Sesimbra.
Termino dizendo que, e mais uma vez:
O que a Marginal precisa é de sinalização e limpeza. Limpeza. Limpeza de pavimentos, de bancos, de candeeiros. De substituir o que está estragado e partido.
O que a marginal precisa é de respeitar o projecto e a obra executada: com esplanadas nas plataformas e no pavimento que, sendo plano, respeite a estereotomia definida, com percursos pedonais contínuos dos dois lados da via, e com dissuasores que não sejam, eles próprios, responsáveis por situações que em nada aumentam a segurança, atractividade e bem-estar do espaço público, dos peões e dos automobilistas.
E sobre os dissuasores escolhidos, transcrevo uma outra frase, textualmente:
“Não vou fazer considerações aos tipos de pino… porque foi uma opção que tivemos e portanto foi vista e revista (…)”.
Foi uma opção “vista e revista”. Na tal “visão” que tiveram.
Valha-nos Deus.
Foi de facto uma “visão” que não lembraria (e permitam-me uma expressão popular) «nem ao menino Jesus» (o verdadeiro, claro).
Fonte das imagens: tetractys.pt
Ao Ler o seu artigo fico com a certeza que não sou o único a ficar Chocado com o Que se passa nesta vila
ResponderEliminarFazem se alterações enormes em areas nobres sem que haja o menor sentido de estetica, não se pensa nos comerciantes nem logistica e o Que se vê è uma vila abandonada estragada suja e sem planeamento a não ser tentar tapar os buracos Feitos durante o inverno para que no verão não se vejam