Começo por transcrever uma das muitas frases (proferidas pelo executivo da CDU) que ilustraram a reunião de Câmara do passado dia 11 de Abril e que visou, entre outros, aprovar o «Inventário de todos os bens, direitos e obrigações patrimoniais e respectiva avaliação e prestação de contas de 2024»: “Os vereadores tiveram durante estes quatro anos uma gestão partilhada da Câmara.”
A frase refere-se aos vereadores eleitos pelo PS, perante a abstenção daqueles sobre o «Inventário e Prestação de Contas de 2024». Absolutamente fantástico. No último ano de mandato, na última prestação de contas deste executivo, a CDU afirma que o PS esteve numa “gestão partilhada da Câmara”. Importa talvez lembrar a inqualificável reunião de Câmara de dia 9 de Fevereiro de 2022, em que o mesmo executivo da CDU afirmou que os vereadores do PS não estavam numa «gestão partilhada» mas apenas numa «gestão participada». E durante quatro anos fomos ouvindo esta afirmação aliada ao repúdio constante relativamente àquilo que muitos diziam existir: um acordo pós-eleitoral e que tinha transformado uma vereação multipartidária num único partido: o “partido da Câmara”.
O «inventário e prestação de contas de 2024» foi aprovado em reunião de Câmara com a abstenção de dois dos vereadores do PS (o terceiro vereador não participou na votação; ausentou-se da sala depois de uma interrupção de 5 minutos para que os vereadores do PS pudessem conversar). E eis que surge a frase: “Os vereadores tiveram durante estes quatro anos uma gestão partilhada da Câmara.” Sendo que o executivo CDU garante que, “sinceramente” não percebe, mesmo sendo ano de eleições autárquicas. Eventualmente, ninguém terá percebido. Nomeadamente que, ao fim de quatro anos, a CDU venha dizer que a gestão foi «partilhada» quando, andou os mesmos quatro anos a afirmar que se tratava apenas de uma «gestão participada».
No passado dia 23 de Abril, o «inventário e prestação de contas de 2024» foi aprovado pela Assembleia Municipal, com a abstenção da bancada do PS (e do PSD e do BE) perante, mais uma vez, a indignação do executivo CDU. O que levou o líder de bancada do PS a afirmar que “a CDU sempre repudiou a ideia de uma gestão partilhada.” Exactamente. E até porque, conforme foi afirmado pela bancada do PS em 2022, na Assembleia Municipal “o PS é oposição”.
Foi pena que não o tivesse sido também, na Câmara Municipal. Até porque, numa «gestão participada» que, a menos de cinco meses das eleições autárquicas, se torna «partilhada», nada impedia a existência de oposição, nomeadamente por parte daqueles que, com a frase “Sesimbra vai mudar”, prometiam fazer diferente (sabendo-se que as posições e votações dos três vereadores eleitos pelo PS eram completamente irrelevantes perante a unanimidade entre o executivo CDU e o vereador eleito pelo Chega, que se tornou independente).
A verdade é que as eleições autárquicas estão aí à porta e ninguém saberá o impacto que os resultados legislativos terão nas mesmas: o Chega venceu no distrito e no Concelho de Sesimbra (no caso de Sesimbra, o PS ficou em segundo lugar – com menos 2678 votos do que o Chega e com mais 277 votos do que a coligação PSD/CDS, que ficou em terceiro; a CDU surge em sexto lugar, atrás da Iniciativa Liberal e do Livre).
Direi que o PS terá uma tarefa árdua pela frente: conseguir provar ao eleitorado sesimbrense que agora é que é! (depois de ter prometido em 2021 “Sesimbra vai mudar”). E se associarmos a isto, o impacto que podem causar os resultados das legislativas nas autárquicas, direi que o PS não pode ficar confortável e confiante de que a vitória lhe irá cair ao colo. O candidato à Presidência da Câmara é o líder da bancada do PS na Assembleia Municipal e onde, o “PS é oposição”. Talvez consiga descolar o PS da CDU e convencer o eleitorado de que, se sair vencedor, a CDU passará a oposição, não integrando nem uma «gestão partilhada», nem uma «gestão participada» (a CDU será o que foram durante vários mandatos os vereadores eleitos pelo PS: apenas oposição). Mas se não sair vencedor, se for essa a vontade do povo, que o PS continuará a ser oposição e não integrará um novo “partido da Câmara”. Parece-me que estes serão os pontos fulcrais desta campanha autárquica: convencer o eleitorado sesimbrense de que o PS não é a CDU e que, seja qual for o cenário, essa diferença será evidenciada afincadamente. Até porque, ao contrário do Parlamento, a Câmara e a Assembleia Municipal não caiem se virem reprovados os orçamentos (veja-se o exemplo do Seixal, em 2023 e de Setúbal em 2024).
Também a CDU tem uma tarefa árdua. Até ao dia em que escrevo (20 de Maio) ainda não é conhecido o candidato à Presidência da Câmara e da Assembleia Municipal. Ouve-se que serão os mesmos. Ouve-se que serão outros. Estará a CDU com algum tipo de dúvida sobre os candidatos que deverá apoiar? Ou serão candidatas? A verdade é que a escolha dos candidatos/as certos/as será fundamental, perante o mais que provável impacto dos resultados legislativos em Sesimbra. Sabendo-se que, independentemente dos candidatos/as escolhidos/as, a recandidatura, ou não, das actuais presidentes de Junta das freguesias do Castelo e de Santiago, influenciará em muito, o resultado da CDU. Não são favas contadas.
A coligação PSD/CDS poderá vir a aproveitar a onda laranja que pintou o território nacional. O PSD/CDS tem aqui a grande oportunidade de, não tendo feito parte do executivo municipal, mostrar ao eleitorado que é uma alternativa. E se, não sair vencedor, se for essa a vontade do eleitorado, continuar a mostrar-se como alternativa. Ninguém quererá uma nova aliança (essa sim de «gestão partilhada» durante anos!) entre o PSD/CDS e a CDU.
Mas há outra força crescente no concelho de Sesimbra: o Chega. Que impacto terão nos resultados autárquicos os 9 mil 525 votos que o Chega alcançou em Sesimbra, nas eleições legislativas? E será que a Iniciativa Liberal e o Livre provocarão algum dano, nomeadamente nos votos que naturalmente seriam PSD/CDS ou CDU?
A verdade é que as eleições autárquicas são muito diferentes das eleições legislativas. Nas autárquicas, a escolha do candidato à Presidência da Câmara é fulcral. É o candidato e a sua popularidade, que ajudará à vitória, ou não, de determinado partido. Direi que as eleições autárquicas não são apenas vitórias partidárias. São também vitórias pessoais. Se o candidato não for o certo, o partido sofre com essa escolha menos assertiva. O mesmo se dirá se o partido estiver em queda: o candidato, mesmo sendo o certo, sofrerá com essa queda.
Que impacto terão nas eleições autárquicas o resultado das eleições legislativas? Irão a Iniciativa Liberal e o Livre apresentar candidaturas? E que força terá o Chega com o candidato que já apresentou? Sesimbra fará parte, no panorama nacional, das surpresas da noite eleitoral autárquica? (Sabendo-se que é a Quinta do Conde que decide eleições).
Uma última nota:
Na sessão da Assembleia Municipal de dia 7 de Maio os deputados municipais questionaram o Presidente da Autarquia sobre as obras que decorrem na marginal de Sesimbra. Ficámos a saber que as obras que estão a decorrer resultam de um ‘plano de reabilitação’ efectuado para a marginal e, sobre o que já se vê e que tem causado, obviamente, indignação, transcrevo parte da resposta:
“É um projecto que foi acompanhado por nós, pelo executivo, eu acredito que possam discordar mas pronto, lá está, é competência da Câmara. (…) É um projecto que não agrada a toda a gente mas foi a visão que se teve. (…) Lá está, nós estamos cá para tomar decisões e as decisões que temos de tomar às vezes agradam mais a uns, agradam menos a outros, não podem agradar a todos (…)”
Confesso que estas declarações não me provocam qualquer espanto. Desde 2017 que nos habituámos a decisões tomadas dentro de quatro paredes, sem divulgação pública, sem o envolvimento da população e sem qualquer tipo de esclarecimento. E apesar de ser uma “competência da Câmara”, é também uma decisão sobre o espaço público que não é da Câmara nem do executivo. É de todos. E é sabido que qualquer intervenção no espaço público que é de todos, quanto mais divulgada, explicada, debatida e consensualizada estiver, menos contestação provocará na reacção de todos.
A marginal de Sesimbra sendo pedonal, é também uma marginal com carros que atravessam todo o espaço. E porquê? Porque a marginal de Sesimbra tem um conjunto de garagens (e de comércios, restauração, habitação) que inviabilizam qualquer ideia de marginal sem carros. A questão da “zona de coexistência” resolve-se apenas e simplesmente com sinalização: definindo locais e horas para cargas e descargas; colocando dissuadores verticais retráteis; atribuindo a cada morador um dístico que lhes permita abrir os dissuadores retráteis e aceder às suas garagens.
Acresce que nos pisos térreos dos edifícios que ladeiam a marginal, existem vários comércios, restauração e acessos a habitações. É um erro crasso anular o passeio que garantia a circulação em segurança de todos os peões junto dos edifícios: sejam os que entram e saem dos comércios; da restauração; ou de suas casas. Ao anular esse percurso seguro, projetam para a via pública os peões, de forma perigosa e desprotegida.
Os dissuasores escolhidos (e que já provocaram danos: pneus danificados, tropeções e quedas de peões), são utilizados em vias largas e com poucos atravessamentos. Melhor explicando: em vias que não têm dezenas de comércios e restauração a debitar para uma estrada apertada. E porquê? Porque sendo toda a marginal um local de atravessamentos, os dissuasores, por serem baixos, tornam-se quase invisíveis para quem atravessa a marginal, transversalmente, provocando tropeções e quedas. E por terem sido colocados de maneira a estreitar a via, as rodas dos carros facilmente embatem nos mesmos, rasgando os pneus.
Do outro lado da marginal, diz o Presidente da Autarquia, deixam de existir esplanadas e será delimitada uma bolsa de estacionamento para motas. Que, como é óbvio, é o que acontece em qualquer marginal à beira mar de um destino turístico: o lugar nobre, com vista de mar, é invadido por motas e, as esplanadas, desaparecem.
De onde é que saem estas ideias? A marginal é a imagem de marca da Vila de Sesimbra. É, por excelência, o postal turístico.
Ninguém quererá sair de um comércio ou restaurante ou habitação directamente para a via pública, sem qualquer tipo de protecção, podendo ser atropelado, tropeçar em dissuasores que não são para estes tipos de espaços e, deparar-se com uma montra de motas, que para além de se constituírem como barreira visual, encantam todo o espaço com a poluição dos seus rateres mais ou menos entusiásticos. Que linda imagem! Para ficar perfeito só falta a definição de locais para cada partido divulgar a sua propaganda durante o ano inteiro: com vista de mar, para que todos os que chegam de barco possam ver, não as esplanadas mas sim, cartazes de propaganda política e motas estacionadas.
O que a marginal precisa é de voltar a ser o que era: com esplanadas com vista de mar (como em qualquer marginal que se localiza à beira mar) e, com percursos pedonais contínuos dos dois lados da via, devolvendo ao peão e ao espaço público, segurança, atractividade e bem-estar.
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