A AGENDA 2030 E OS 17 ODS. E SESIMBRA?

Terminou ontem a consulta pública sobre o "Relatório Voluntário Nacional 2023" relativa à implementação da Agenda 2030 e dos 17 Objectivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS). Trata-se do segundo RVN que Portugal irá apresentar no Fórum Politico de Alto Nível das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável.

Uma vez que concordo com o teor do "Relatório Voluntário Nacional 2023" sendo que, a participar na consulta pública, seria apenas para constatar (tristemente e infelizmente) que, na minha terra, a Agenda 2030 e os 17 Objectivos do Desenvolvimento Sustentável são assuntos inexistentes nas políticas, estratégias (que não existem), documentos e planos municipais, decidi apenas partilhar este desabafo.

São mais de duzentas páginas onde são evidenciadas as acções já realizadas e os compromissos com o futuro a nível nacional, regional e local. Do enquadramento das políticas nacionais, sustentadas na Agenda 2030 e naqueles que são os 17 ODS, o documento apresenta um diagnóstico sobre a situação actual, no país, de cada um dos 17 ODS, definindo um conjunto de acções a desenvolver, nomeadamente a nível local.

Não vou como é óbvio, transcrever o diagnóstico efectuado nem tão pouco o conjunto de acções a desenvolver. Vou apenas transcrever um dos muitos parágrafos do documento:

Os municípios têm um papel determinante para a concretização da Agenda 2030. A territorialização dos ODS é fundamental para acelerar os progressos necessários, transformando as realidades locais com uma maior proximidade e um envolvimento mais ativo das comunidades.” 

E uma das várias conclusões do documento é que os Municípios devem integrar “a Agenda 2030 nos seus instrumentos de programação financeiros, tais como os planos de atividades e respetivos orçamentos”.

E o Município de Sesimbra? Integra o Município de Sesimbra nos seus instrumentos financeiros, orçamentos e planos de actividades, a Agenda 2030 e os 17 Objectivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS)? Está a estratégia de desenvolvimento futuro concelhio (e que será aquela que estiver plasmada na proposta de Revisão do PDM), alinhada com Agenda 2030 e os 17 ODS? Não sabemos. E devíamos saber. Até porque a concretização da Agenda 2030 e dos 17 ODS depende, em muito, do envolvimento da comunidade civil (dos cidadãos comuns).

Diz o "Relatório Voluntário Nacional 2023" que:

  • A Associação Nacional de Municípios Portugueses criou uma “Secção de Municípios para os ODS”. Sesimbra não faz parte.

- Porquê??

  • A Universidade católica (através do CESOP-Local) criou o “Índice de Sustentabilidade Municipal” que permite a cada Município obter o diagnóstico do seu território em cada um dos 17 ODS. Sesimbra não faz parte.

- Porquê??

  • A ODS-Local (Plataforma Municipal dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, coordenada pelo CNADS) permite visualizar projectos no âmbito dos ODS. Sesimbra não tem nenhum projecto identificado.

- Porquê??

  • Ainda na ODS-Local, é possível monitorizar o contributo de cada município na concretização dos ODS. Sesimbra contribui apenas para a concretização de 13 dos 124 indicadores definidos nos 17 ODS.  (o que é manifestamente mais do que insuficiente)

Das iniciativas apontadas pelo "Relatório Voluntário Nacional 2023" e que devem ser concretizadas pelos Municípios, destaco:

  • A incorporação da Agenda 2030 nos instrumentos de programação e orçamentação municipais – planos estratégicos, planos de atividades e orçamentos municipais; 
  • A criação de equipas técnicas municipais, responsáveis pela dinamização dos ODS;
  • A criação de elementos e conteúdos de comunicação para divulgação nos canais de comunicação dos municípios e promoção de ações de sensibilização e eventos dedicados junto dos cidadãos e atores locais. 

E para a concretização dessa medidas, o Instituto Marquês de Valle Flôr (e outras entidades), publicou um “Manual de ação local para a transformação global” (destinado em particular, aos Municípios), tendo em vista o cumprimento da Agenda 2030 e consequentemente, dos 17 ODS. Este Manual começa por definir quatro fases que visam a concretização dos ODS:

  • Sensibilizar (nomeadamente as estruturas do Município e os actores locais); 
  • Adaptar (alinhando os ODS nas politicas públicas municipais); 
  • Implementar (integrando os ODS nas estratégias, planos e projectos); 
  • Monitorizar (aferindo e ajustando o cumprimento dos ODS). 

E em 98 páginas são explicadas as medidas a adoptar, referindo que os “ODS não necessitam obrigatoriamente de ser per si uma estratégia” mas devem isso sim, ser integrados nos planos e documentos estratégicos, nomeadamente (e apenas como exemplo):

  • Revisão do Plano Diretor Municipal (que dura há mais de 16 anos)
  • Plano de Ação de Mobilidade Urbana Sustentável (PAMUS)
  • Plano de Ação Integrada para as Comunidades Desfavorecidas (existe?)
  • Estratégia Municipal de Adaptação às Alterações (o esquecido PLLAC-ARRÁBIDA)
  • Plano de Gestão de Resíduos Urbanos (guardado dentro de uma gaveta, sem qualquer tipo de deliberação camarária e conhecido como “Relatório Preliminar -Estudo para o desenvolvimento de sistemas de recolha de biorresíduos”).

Também a BCSD (Business Council for Sustainable Development) desenvolveu um Guia específico para os decisores políticos: “Cidades Sustentáveis – a transformação urbana em 7 passos”. Nesse Guia é referido que “a sustentabilidade urbana e a gestão sustentável dos territórios têm ligações a todos os ODS” (como por exemplo a educação, a saúde, o crescimento económico, o saneamento, as fontes de energia limpas, o consumo e produção sustentáveis, o combate às alterações climáticas) sendo que o “grande desafio da transformação urbana é a necessidade de uma visão integradora dos múltiplos vetores que a constituem, reconhecendo que a atuação numa das vertentes, poderá limitar as hipóteses de atuação nas restantes”. Territórios sustentáveis pressupõem a definição/concretização de medidas relativas à:

  • Mobilidade e transportes; 
  • Planeamento, urbanismo e edificação;
  • Resíduos e poluição;
  • Governação e participação.

São definidas 7 acções que, para além de identificarem as necessidades de um território tendo em vista a sua sustentabilidade, estabelece a necessidade de desenvolver um plano de acção que vise o desenvolvimento sustentável do território.

E Sesimbra? 

Há mais de um ano, o líder da bancada do PS na Assembleia Municipal de Sesimbra, num artigo de opinião publicado no jornal “O Sesimbrense”, (conforme referi AQUI) apelava e cito: “para que, com a maior brevidade, se inicie um processo de divulgação e auscultação popular sobre os pressupostos e consequências do novo PDM.” Dizia também que não era “aceitável que as opções estratégicas que irão incorporar o novo PDM sejam estabelecidas de forma tecnocrática, dentro de quatro paredes” referindo que “não pode ter acolhimento o argumento de que a visão estratégica para o concelho estava plasmada no programa eleitoral de cada partido.” E afirmava: “é fundamental que se dê inicio a uma discussão aberta e clarificadora, envolvendo activamente toda a sociedade de Sesimbra.”

Há mais de um ano. E até hoje o que sabemos sobre a proposta de Revisão do PDM é nada. A proposta de Revisão do PDM continua fechada dentro de quatro paredes, sendo que agora, parece que já será do conhecimento de todas as forças politicas representadas na Assembleia Municipal. E estranhamente, nenhum partido ou força politica, tem uma qualquer opinião pública sobre aquele que é o instrumento de desenvolvimento concelhio que terá de estar articulado com a Agenda 2030 e os 17 Objectivos de Desenvolvimento Sustentável.

Na última Assembleia Municipal (realizada a 10 de Maio), dois deputados municipais abordaram aqueles que terão sido os pareceres das entidades consultadas no âmbito do processo de Revisão do PDM, manifestando as suas preocupações e até, surpresa, pelo teor dos mesmos (a Revisão dura há mais de 16 anos e, de acordo com a lei - que irá ser prorrogada, digo eu – a Revisão do PDM terá de ser aprovada e publicada até 31 de Dezembro deste ano – daqui por sete meses). 

Das duas, uma: 

  • Ou os deputados municipais referiram os pareceres emitidos apenas como estratégia no âmbito do debate politico (o que não me parece) ou, 
  • os pareceres a que os deputados municipais terão tido acesso, serão diferentes daqueles que terão sido os pareceres que o Presidente da Autarquia leu. 

Uma coisa é certa: ficámos a saber, nessa sessão da Assembleia Municipal, que os pareceres não são favoráveis. São “desfavoráveis” e “favoráveis condicionados”. Melhor explicado: os pareceres emitidos serão favoráveis se forem ultrapassados os motivos que levaram à emissão de pareceres desfavoráveis e se, forem cumpridos os condicionalismos dos pareceres “favoráveis condicionados”. Dizendo de outra maneira: para que os pareceres das diferentes entidades venham a ser favoráveis, a proposta de Revisão do PDM terá de ser rectificada/alterada/conformada com os pareceres emitidos. Ou seja: parece que a maioria das entidades consultadas terá optado por não emitir parecer desfavorável (o que inviabilizaria desde logo a proposta de Revisão do PDM). E assim, o “favorável condicionado” depende da satisfação aos condicionalismos impostos. Restará saber se esses condicionalismos são questões menores ou se, de acordo com o que os dois deputados municipais relataram, podem atrasar/complicar, a finalização de uma Revisão a caminho de duas décadas! 

Sesimbra caminha (?) sustentada apenas num PDM em vigor, completamente ultrapassado e desarticulado com aquelas que são as exigências do século XXI e as metas definidas a nível mundial, europeu e nacional.

O mínimo que se exige aos políticos eleitos é algum tipo de manifestação/acção sobre estas matérias. Não basta um artigo de opinião num jornal. Não basta uma indignação na Assembleia Municipal. É preciso mais, muito mais, perante um executivo CDU que gere o ordenamento do território concelhio desde 1976! Talvez este facto explique muito do que aconteceu e não aconteceu em Sesimbra (bastará ver a exposição dos 50 anos do 25 de Abril patente na Biblioteca Municipal).

Urge arregaçar as mangas. O futuro é hoje. Não pode uma matéria desta importância ser assunto apenas nas próximas campanhas eleitorais de 2025. O momento é agora. Até porque, com 9 milhões de excedente orçamental, nem devem restar quaisquer tipo de dúvidas onde e como é que o mesmo deve ser aplicado: no cumprimento da Agenda 2030 e dos 17 Objectivos de Desenvolvimento Sustentável.

Termino com uma frase do líder de bancada do PS, na Assembleia Municipal (constante do artigo de opinião que referi):

É fundamental que se dê inicio a uma discussão aberta e clarificadora, envolvendo activamente toda a sociedade de Sesimbra.

Que as palavras desta frase (com mais de um ano) não se resumam apenas a uma qualquer acção politizada sem qualquer tipo de sequência e/ou consequência.



FONTE DA IMAGEM: pplware.sapo.pt


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