UTOPIAS E DELÍRIOS

Permitam-me voltar à reunião de Câmara do passado dia 8 de Fevereiro onde o executivo municipal deliberou de rajada, sobre os 35 pontos que compunham a “Ordem do Dia”. Relembro que apenas um dos pontos mereceu considerações, justificações e opiniões durante cerca de 15 minutos. Nos restantes 34 pontos, o executivo municipal precisou apenas de cerca de 25 minutos para deliberar por unanimidade e em silêncio, numa média de 44 segundos por ponto; direi que é um novo recorde!

E porque o silêncio é ensurdecedor, perante os pontos que são lidos e completados com as duas frases da praxe: “quem vota contra?; quem se abstém?” e a conclusão: “aprovado por unanimidade”, há dúvidas que se geram e perguntas que ficam no ar.

E a primeira pergunta é: 

  • Pode um loteamento alterar um Plano Municipal?

E a resposta: 

  • Não. Um Plano Municipal só pode ser alterado por um outro Plano.


Segunda pergunta: 

  • Pode um Plano Municipal ser alterado por um loteamento municipal?

E a resposta: 

  • Não. Um Plano Municipal só pode ser alterado por um outro Plano.


Terceira pergunta: 

  • Podem ser alterados Planos Municipais em vigor se for verificada essa necessidade?

E a resposta: 

  • Sim, nos termos definidos pelo RJIGT - Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial.


Quarta pergunta: 

  • E nos termos do RJIGT, como podem ser alterados os Planos Municipais em vigor? 

E a resposta: 

  • Cumprindo o estipulado na “SECÇÃO V – Dinâmica” do RJIGT, e enquadrando a alteração pretendida no(s) respectivo(s) artigo(s). (link)


Vamos por partes: 

São Planos Municipais os Planos Directores Municipais, os Planos de Urbanização e os Planos de Pormenor. Podem ser, (entre outros) alterados (como foi recentemente a alteração efectuada ao PDM de Sesimbra em vigor, por força do POC Espichel-Odeceixe) nos termos definidos pelo RJIGT sendo que, não é possível alterar um qualquer Plano Municipal através da elaboração de um loteamento municipal. Até porque, os Planos são aprovados pela Assembleia Municipal e, os loteamentos são aprovados em reunião de Câmara pelo executivo municipal.

E são três os artigos do RJIGT que definem como se processam as alterações aos Planos Municipais:

1. Por ADAPTAÇÃO (artigo 121º), resultante (entre outras) da entrada em vigor de leis ou regulamentos, sendo que compete à Assembleia Municipal aprovar essa adaptação, sendo depois transmitida essa aprovação à CCDR e remetida para publicação em Diário da República. 

2. Por se verificar a necessidade de proceder a CORRECÇÕES MATERIAIS (artigo 122º) resultantes (entre outras) de acertos de cartografia, correcção de omissões e correcção de lapsos gramaticais, sendo que compete (mais uma vez) à Assembleia Municipal aprovar essas correcções, sendo as mesmas transmitidas à CCDR e remetidas para publicação em Diário da República.

3. Por (entre outras) se prever uma outra forma de execução que vise traduzir (entre outras) a execução de Estratégia Local de Habitação. Neste caso, será uma ALTERAÇÃO SIMPLIFICADA (artigo 123º) sendo que a Câmara terá de proceder a consulta pública (10 dias) sobre a alteração proposta; remeter a alteração pretendida à CCDR, que emite parecer vinculativo; enviar à Assembleia Municipal, tendo em vista a respectiva aprovação; remeter para publicação em Diário da República.


Voltemos à reunião de Câmara e àquelas que foram as deliberações tomadas pelo executivo municipal sobre seis dos pontos da extensa “Ordem de Trabalhos”. Por unanimidade e em silêncio, a deliberação tomada aprovou a execução de loteamentos municipais que visam alterar o Plano de Pormenor da AUGI 24 da Ribeira do Marchante (publicado e em vigor -link), anexando um conjunto de lotes. 

Melhor explicando: os loteamentos municipais aprovados eliminam 11 dos lotes definidos pelo Plano de Pormenor da AUGI 24. Acresce que, o Plano de Pormenor da AUGI 24 tem efeitos registais. Significa portanto que estão constituídos, registados e descritos na Conservatória, 491 lotes sendo que, com estas anexações, serão reduzidos a 480 lotes.

Permitam-me ainda acrescentar: os Planos Municipais podem ser alterados (também) no sentido de (entre outras) “corrigir distorções de oferta no mercado imobiliário” e “garantir a oferta de terrenos e lotes destinados a edificações, com rendas ou a custos controlados” (artigo 188ª do RJIGT). Ora todos sabemos (conforme referi AQUI) que, apesar de não estar expresso na deliberação tomada, neste caso concreto, a Estratégia Local de Habitação aponta para a área do Plano de Pormenor da AUGI 24 da Ribeira do Marchante, a construção de 72 fogos exactamente nos lotes que estão a ser anexados. 

Que fique bem claro que não tenho rigorosamente nada contra a anexação de lotes na área do Plano de Pormenor da AUGI 24 da Ribeira do Marchante. Mas, um loteamento é aprovado na Câmara e um Plano de Pormenor é aprovado pela Assembleia Municipal e publicado em Diário da República. Ou seja, uma deliberação unânime e em silêncio por parte do executivo municipal, não altera um Decreto de Lei nacional que publica uma aprovação tomada pela Assembleia Municipal.

Volto a referir: um Plano Municipal só pode ser alterado por um outro Plano e não, por loteamentos municipais. Um Plano Municipal pode também ser alterado se cumprir as regras definidas pelo Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial, nomeadamente o definido na “SECÇÃO V – Dinâmica”. Digo eu.

Com toda a certeza que existe um qualquer enquadramento jurídico e que esta ideia de alterar um Plano de Pormenor com loteamentos municipais é perfeitamente possível e exequível. E se assim for, peço desde já as minhas desculpas face ao teor deste post, dado que não percebo nada de nada do RJIGT, nem do Plano de Pormenor da AUGI 24 da Ribeira do Marchante, nem de loteamentos municipais, nem tão pouco, de alterações a Planos Municipais. 

Mas lá está, como o executivo municipal está informado, entende não ter de informar o que quer que seja. E depois dá nisto: textos utópicos e delirantes. Que bom seria se a frase proferida pelo Vereador eleito pelo PS (Miguel Fernandes) no “Período antes da ordem do dia” se mantivesse ao longo do período da “Ordem do dia”. Poupar-se-iam com toda a certeza muitas letras, palavras, frases e textos. Transcrevo textualmente: “são temas que são importantes e que importa também aproveitar este canal para informar os munícipes”. 

E depois desta frase, foram transmitidas várias informações sobre as quais não escreverei uma única palavra. Até porque, teria tanto, mas tanto a escrever que o melhor é não o fazer (sob pena de transformar este post num ensaio literário). 

Lembrei-me apenas que o regulamento do Plano de Urbanização da Lagoa de Albufeira (artigo 87º) estabelece: “o prazo de vigência do PULA é de 10 anos”. O Plano foi publicado a 16 de Agosto de 2013, entrando em vigor no dia seguinte (17 de Agosto). Talvez não fosse má ideia deliberar proceder à Revisão ou Alteração do PU, sob pena de, a partir do dia 17 de Agosto deste ano (faltam cerca de seis meses), a Lagoa de Albufeira ficar sem Plano. Digo eu. 

Até porque, (tal como aconteceu com o PDM, que tem a mesma frase no artigo 5º. do seu regulamento: “o Plano tem o prazo de vigência de 10 anos”), enquanto durar a Revisão ou Alteração, o Plano manter-se-á em vigor (“os planos municipais podem ter um prazo de vigência máximo previamente fixado, permanecendo, no entanto, eficazes até à entrada em vigor da respetiva revisão ou alteração.” – ponto 1 do artigo 93º. do RJIGT).

Claro que esta é apenas a minha opinião, de cidadã comum, sendo que não percebo nada de nada sobre nada. Muito menos sobre prazos de vigência de planos. 


Termino com uma pergunta:  hoje, passado um ano sobre a invasão militar da Rússia sobre a Ucrânia, provocando uma guerra que nos atinge a todos, não podia o Castelo de Sesimbra estar com as cores da bandeira da Ucrânia?



FONTE DA IMAGEM: ideiasderua.blogspot.com

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