MAIS 180 CAMAS APROVADAS NO MECO

Na reunião de Câmara que decorreu ontem (dia 12 de Outubro) e depois de aceso debate, duvidas, perguntas, explicações e baralhações, foram aprovadas mais 180 camas no Meco, por maioria. Ou seja, com os votos favoráveis da CDU e do vereador eleito pelo Chega (e agora independente). O PS, não votando favoravelmente, absteve-se.

Permitam-me começar por dizer que, neste caso concreto e de acordo com a informação prestada pelo Presidente, as 180 camas aprovadas localizam-se numa zona classificada no PDM em vigor como “espaço turístico”. Ou seja, não se trata de subverter a excepção prevista no PDM para a possibilidade de construir empreendimentos turísticos em espaços florestais. Não. Neste caso (e de acordo com a informação prestada pelo Presidente) o espaço é “turístico” e como tal, perfeitamente definido e previsto no PDM em vigor.

Na informação que consta na ordem de trabalhos presente a reunião de Câmara é referido que a proposta apresentada (e transcrevo): “se conforma na generalidade com o PIP aprovado por deliberação de Câmara, na sua reunião de 6/11/2019”. Ora nessa reunião (de 6 de Novembro de 2019), foi aprovado por unanimidade (e cito): “Viabilidade de construção de aldeamento turístico de 4 * – pedido de informação prévia – informação favorável – Fetais.” Quer isto dizer que, esta viabilidade aprovada corresponderia (de acordo com a informação prestada pelo Presidente) a um “espaço turístico” localizado nos Fetais tratando-se (digo eu) do espaço identificado no PDM como T52 – Fetais (uma hipótese completamente especulativa já que esta informação não consta nem na deliberação de ontem nem na deliberação de 2019).

Conforme tenho vindo a referir, um PIP (Pedido de Informação Prévia) é válido por um ano (ou seja, o promotor tem um ano para requerer o licenciamento). Ao fim desse ano, o promotor (se não tiver efectuado o pedido de licenciamento), pode requerer ao Presidente da Câmara uma declaração que estabeleça que (e cito o regime jurídico de urbanização e edificação) “se mantêm os pressupostos de facto e de direito que levaram à anterior decisão favorável”. E se essa declaração for emitida, significa que o promotor terá novamente mais um ano para apresentar o pedido de licenciamento. Ora se o PIP aprovado resulta da deliberação de Câmara tomada na sua reunião de 6/11/2019 (há quase três anos) parece-me que, esta informação seria fundamental constar na proposta aprovada que apenas avança a data de 2019 para sustentar a conformidade (“na generalidade”) do projecto apresentado com o PIP aprovado. Adiante.

E o que motivou um debate aceso entre os eleitos do PCP e um dos eleitos do PS? Se, neste caso concreto, não deveria existir um estudo de impacto ambiental. Até porque, legalmente, é obrigatório se o aldeamento turístico ultrapassar o valor de 50hab/ha. E não ultrapassando, pode a Câmara exigir esse estudo dado que a lei prevê a possibilidade de os aldeamentos turísticos serem analisados caso a caso, face à especificidade das localizações e dos valores naturais e paisagísticos eventualmente existentes nessas localizações.

E a resposta resumiu-se a uma pergunta (repetida) que, grosso modo, visada vincular posições futuras do PS sobre empreendimentos turísticos. Transcrevo parcial e textualmente:

Se numa próxima ocasião, que não há-de ser muito distante, vier um processo com uma declaração de impacto ambiental válida (…), se a votação do Partido Socialista é favorável só por essa perspectiva?

E depois de uma resposta negativa por parte do PS, a explicação de que (transcrevo textualmente):

O promotor, porque reduziu a capacidade construtiva máxima que lhe é permitida e as unidades de alojamento, entrou na legislação ao abrigo da legislação, num campo onde não necessita de ter uma declaração de impacto ambiental.

O PS deu conta de existir uma troca de e-mails entre o promotor e a Câmara, sendo que num desses e-mails o promotor afirma que (transcrevo textualmente o e-mail lido pelo Vereador Miguel Fernandes):

O motivo de desistência do estudo de impacto ambiental prende-se com alterações submetidas recentemente ao projecto de redução de utentes para número inferior a 50 habitantes por hectare, deixando assim de ser exigível o referido estudo.

E depois de mais perguntas, respostas, baralhações e explicações, transcrevo apenas e textualmente duas das respostas finais:

Se a alteração proposta ao empreendimento deixou de exigir a apresentação de um estudo e a consequente DIA, ela não tem de lá estar.

Neste momento não se torna exigível o estudo de impacto ambiental e a DIA, portanto é só isto. Não há mais nada. Tão simples quanto isto.

Ou seja, aparentemente, a Câmara aceitou o argumento apresentado pelo promotor de que, face às alterações efectuadas ao projecto, deixou de ser exigível o estudo de impacto ambiental, até porque se verificou a “redução de utentes para número inferior a 50 habitantes por hectare”. 

Mas eu, que não percebo nada de nada de estudos de impacto ambiental, considero que, neste caso, a Câmara poderia (deveria) ter solicitado o mesmo (até porque a lei prevê essa possibilidade). Por duas razões:

  • A primeira, (conforme referi AQUI) porque foram aprovadas por unanimidade, nos últimos quatro anos do anterior mandato, 4.100 camas para a zona da Aldeia do Meco, sendo que um estudo de impacto ambiental analisa também, os impactos cumulativos.
  • A segunda, porque a proposta deliberada identifica desde logo a existência de sobreiros na propriedade, admitindo até o abate dos mesmos (desde que autorizado pelo ICNF); o estudo de impacto ambiental não só preservaria os sobreiros existentes como identificaria e preservaria outros valores naturais (que ninguém saberá se existem ou não).

O que proponho de seguida é um exercício. E como qualquer exercício, começa por identificar os dados e uma pergunta:

  • Foram aprovadas 180 camas distribuídas por 58 Unidades de Alojamento. Quantos habitantes são esperados neste aldeamento turístico?

Imaginem um qualquer aldeamento turístico. Grosso modo, em todas as Unidades de Alojamento existem camas de casal. O que significará que, se as 180 camas aprovadas forem camas de casal, estaremos a falar de 360 habitantes. A propriedade (de acordo com os dados que constam na proposta deliberada) tem 3,625ha. Se dividirmos 360 habitantes por 3,625ha, teremos 99,31 habitantes por hectare (correspondendo quase ao dobro do número de habitantes que desobriga o estudo de impacto ambiental: 50 habitantes por hectare).

Porque uma cama não significa um habitante. Dependendo da capacidade da cama, assim será definido o número de habitantes. Ora este dado é completamente omisso na deliberação mas sustenta a mesma com base na afirmação do promotor de que se verificou a “redução de utentes para número inferior a 50 habitantes por hectare”.

A menos que este aldeamento turístico seja composto apenas por camas individuais! E assim teremos 180 camas para 180 habitantes e estará verificada a “redução de utentes para número inferior a 50 habitantes por hectare”.

Explicando melhor. O que a lei diz claramente é que, o estudo de impacto ambiental não é exigido se, e no caso dos aldeamentos turísticos, o número de habitantes por hectare for inferior a 50. Ou seja, a regra é sobre os habitantes e não, sobre o número de camas e unidades de alojamento. Ora a propriedade (de acordo com os dados que constam na proposta deliberada) tem 3,625ha. Naquela regra de três simples, se a 1ha correspondem 50 habitantes, a 3,625ha corresponderão 181,25 habitantes. Se distribuirmos estes habitantes por camas de casal, ter-se-ão 90,625 camas. Porque o número de camas não é igual ao número de habitantes.

Mas o que a Câmara aprovou foram 180 camas. E não, 180 habitantes. A menos que este seja um novo conceito de aldeamento turístico composto apenas por camas individuais. E se assim for, o número de camas é igual ao número de habitantes e verifica-se de facto a “redução de utentes para número inferior a 50 habitantes por hectare”. Quer isto dizer que nos 3,625ha estarão 180 habitantes o que perfaz uma média de 49,65 habitantes por hectare. Mesmo à pele! Será? Não sabemos. O que é pena.

Mas imaginemos ainda um outro cenário. As 180 camas irão estar distribuídas por 58 Unidades de Alojamento. Assim, cada Unidade de Alojamento terá 3,1 camas. Consideremos que apenas uma das camas é de casal e as outras duas, serão individuais e estarão num “quarto duplo”. Diz um despacho de 2007 do Ministério da Economia e Inovação que, no caso dos “quartos duplos”, e face à sazonalidade deste tipo de empreendimentos, deve ser considerado por cada “quarto duplo”, 1,5 habitantes e não, 2 habitantes.

Façamos contas: em 58 Unidades de Alojamento existirão 58 camas de casal e 122 camas individuais em “quartos duplos”. A 58 camas de casal corresponderão 116 habitantes; a 122 camas individuais em “quartos duplos” corresponderão 91,5 habitantes. Quer isto dizer que estaremos na presença de 207,5 habitantes em 3,625ha. Ou seja, existirão 57,24 habitantes por hectare e não, os 50 habitantes por hectare e que não exigem o estudo de impacto ambiental. 

Foi pena nenhuma das perguntas, respostas, explicações e baralhações ter esclarecido esta questão. 

Quantos habitantes estarão em 58 Unidades de Alojamento com um total de 180 camas?

O que sustenta a deliberação que não apenas a informação trocada por e-mail com o promotor, em que o mesmo refere que “o motivo de desistência do estudo de impacto ambiental prende-se com alterações submetidas recentemente ao projecto de redução de utentes para número inferior a 50 habitantes por hectare, deixando assim de ser exigível o referido estudo”?

Depois de tantas perguntas, respostas, baralhações e explicações não sei se de facto alguém terá ficado esclarecido. A verdade é que, com ou sem o voto favorável do PS, o empreendimento turístico foi aprovado.

Resta-me agradecer o facto do PS, desta vez, ter decidido intervir e questionar um dos pontos da ordem de trabalhos, promovendo o debate e permitindo ao cidadão comum perceber o que vai acontecendo (e não acontecendo) neste nosso Concelho.

Foi pena o PS não ter decidido intervir noutros pontos, (como por exemplo no ponto anterior a este, nomeadamente sobre a ausência de estacionamento público para um edifício com mais de 30 fogos - e mais de 80 habitantes).

Sobre a fabulosa apresentação dos contratos de urbanização dos Planos da Mata de Sesimbra, e sobre a maravilha de perguntas realizadas sobre os mesmos, tenho tanto a dizer. Mas não agora, porque o post já vai longo e é apenas sobre a aprovação de mais 180 camas no Meco!


FONTE DA IMAGEM: www.nit.pt

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