A HONRA, A RESPONSABILIDADE E O DEVER

Confesso que só agora tive oportunidade de ver e ouvir aquelas que foram as últimas duas reuniões deliberativas dos órgãos de soberania do poder local, nomeadamente Câmara Municipal e Assembleia Municipal. Refiro-me à reunião de Câmara realizada a 22 de Junho e à segunda reunião da sessão da Assembleia Municipal realizada a 23 de Junho.

E tanto, tanto que teria para dizer sobre a reunião de Câmara de 22 de Junho. Mas não vou dizer rigorosamente nada. Até porque estão de regresso as mesmas dinâmicas na discussão, apreciação e deliberação dos vários pontos da ordem de trabalhos que compõem os assuntos presentes a reunião de Câmara e que se resumem apenas à leitura dos mesmos com as duas perguntas da praxe (“quem vota contra?, quem se abstêm?”) e a conclusão: “aprovado por unanimidade”. Tudo uma maravilha vermelha e rosa com laivos de independência incolor (?). E claro, sem explicações ou perguntas, sem debate, sem nada de nada. Porque dúvidas, perguntas, explicações,… se as houve, terão sido colocadas naquelas que são as reuniões preparatórias das reuniões de Câmara, e aí sim, fica tudo esclarecido longe dos holofotes e dos munícipes que elegem os órgãos de soberania do poder local e, no caso, os membros do executivo municipal.

Foi também para acabar com este registo tipo “reunião de amigos que temos de fazer porque somos obrigados”, que o povo sesimbrense saiu à rua e votou: retirando a maioria absoluta à CDU, acreditando na “alternativa a um executivo camarário, gasto” (promessa do vereador eleito pelo Chega e agora independente) e na promessa de uma gestão “das pessoas para as pessoas” com um slogan que afirmava “Sesimbra vai mudar” e que foi bandeira do PS. 

O povo votou pela mudança. E decidiu eleger apenas três candidatos da CDU (descartando aquele que seria o quarto eleito pela CDU e, retirando a maioria absoluta). Decidiu eleger três candidatos do PS e um candidato do Chega, não elegendo ninguém pelo PSD e CDS. E sendo o povo “quem mais ordena”, decidiu, na Assembleia Municipal, retirar a maioria absoluta à CDU, e estabelecer uma maioria absoluta no lado da suposta oposição. Foi isto que o povo decidiu. E tudo parecia indiciar uma mudança… até à consolidação de um executivo camarário sem oposição (e que até chama a si candidatos não eleitos e que foram descartados pelo voto popular) e, até à consolidação de uma Assembleia Municipal que jamais fará uma oposição clara e inequívoca a uma gestão de maioria CDU (com mais de 16 anos) que o povo, que é soberano, decidiu retirar a 26 de Setembro de 2021. 

Como disse Jerónimo de Sousa, será necessário apelar à “dinamização da luta de massas”. O povo votou pela mudança. O povo não votou na continuidade. Sesimbra caminha a passos largos para um beco sem saída. E até já consigo antever os resultados eleitorais das autárquicas de 2025 mas que, como é óbvio, não irei partilhar. Prefiro manter só para mim, alimentando a esperança que, sendo a última a morrer, me permite acreditar que ainda é possível uma mudança em conformidade com aqueles que foram os resultados eleitorais. 

Entretanto, os dias vão correndo às mil maravilhas! Boa disposição e alegria! A gestão concelhia resume-se ao rame-rame diário, com festas, bailaricos e festivais porque “o que faz falta é animar a malta.” E quando surgem perguntas (que na maioria das vezes parecem ensaiadas e combinadas entre quem pergunta e quem responde) ficamos todos descansados e sossegados porque está tudo pensado, está tudo definido, está tudo em andamento, está tudo salvaguardado, está tudo contabilizado, está tudo, absolutamente tudo, considerado. E claro, a Revisão do PDM que será um “instrumento estratégico de excelência” irá definir para todas as matérias, uma estratégia que culminará num futuro próspero e risonho para o concelho de Sesimbra. Valha-nos Deus.

Na Assembleia Municipal, os trabalhos decorreram como costume: um sem número de perguntas lançadas sobre o executivo municipal, perante aquela que é “uma agenda de eventos” e não um relatório sobre a actividade municipal. Seguidos de um conjunto de respostas (ou falta delas) explorando até ao infinito explicações sobre aquilo que menos interessa e cingindo-se a respostas curtas e pouco elaboradas sobre assuntos que esses sim, interessam e muito. E como os tempos ficaram esgotados, os deputados fatigados, o alerta para as horas, a referência aos atrasos de muitos dos deputados, as justificações pelos atrasos, a informação (comum a muitos deputados) de que no dia seguinte iriam trabalhar, que tinham horários a cumprir, que entravam às sete e meia, oito, nove horas da manhã, a segunda reunião da sessão da Assembleia Municipal terminou alegremente, com votos de boas férias e um adeus até Setembro. 

Confesso que foram muitos os temas questionados pelos deputados municipais e sobre os quais teria muito a dizer perante as explicações que (não) foram dadas. No entanto limitar-me-ei apenas àquela que a mim me causa maior perplexidade. 

Ficámos a saber através da intervenção do Grupo Municipal do BE que, naquela que foi a apresentação da Revisão do PDM aos deputados municipais, não constavam aqueles que são os documentos mais importantes de qualquer plano de ordenamento: as plantas de usos do solo. E por isso, questionava o executivo, e uma vez que já tinha decorrido a primeira reunião consultiva sobre a Revisão do PDM, quando seriam disponibilizados aos deputados municipais os documentos apresentados ao conjunto de entidades que compõem a dita Comissão e que, como é óbvio, integram as diferentes cartas de usos do solo, nomeadamente a planta de ordenamento.

(E aqui, apenas um aparte: estranhamente, o Grupo Municipal do PS não fez qualquer menção sobre esta matéria. Depois do desafio lançado pelo líder de bancada, num artigo de opinião publicado no jornal “O Sesimbrense”, apelando a que, e cito: “com a maior brevidade, se inicie um processo de divulgação e auscultação popular sobre os pressupostos e consequências do novo PDM”, o silêncio foi total. Quero acreditar que o facto do Grupo Municipal do PS ter permanecido em silêncio sobre este tema, se deva apenas ao facto de os 10 minutos que detém para intervir, já estarem esgotados… Será? Adiante.

Atente-se na primeira explicação sobre a questão colocada pelo Grupo Municipal do BE e que transcrevo textualmente:

(…) fiquei altamente desagradado, penso que já transmiti isso, com o facto da data prevista para emissão dos pareceres das entidades ser 16 de Janeiro de 2023 (…)

Importa recuar aquela que foi a sessão da Assembleia Municipal de Sesimbra realizada no dia 6 de Maio, e em que o grupo Municipal do PS questionou, com surpresa, o facto da segunda reunião da Comissão Consultiva estar marcada para Janeiro de 2023. E transcrever textualmente a resposta sorridente e bem-disposta: “a surpresa para nós também foi igual” não adiantando mais nada sobre o assunto.

Não vou repetir o que já referi no post “A REVISÃO DO PDM? TALVEZ NO PRÓXIMO MANDATO” sobre essa sessão da Assembleia Municipal realizada a 6 de Maio.

No entanto, “desagradado” não é sinónimo de “surpresa”. Porque uma coisa é ficar “desagradado”, descontente, desgostado, aborrecido. Outra coisa bem diferente é ficar “surpreso”, perplexo, pasmado, surpreendido.

Esta primeira explicação fez-me questionar o porquê de voltar a este assunto quando a pergunta colocada pelo Grupo Municipal do BE não era sobre o desagrado ou sobre a surpresa perante a “data prevista para emissão dos pareceres das entidades ser 16 de Janeiro de 2023”.  

O que faltou então dizer? 

Faltou dizer que:

No passado dia 15 de Junho teve lugar uma reunião do Conselho de Ministros que, entre outros, aprovou a prorrogação do prazo de conclusão dos processos de Revisão dos PDM para 31 de Dezembro de 2023 (conforme foi proposto pela Associação Nacional dos Municípios Portugueses). Ou seja, não será antes do final do próximo ano que a Revisão do PDM de Sesimbra estará aprovada e em vigor. No entanto, reafirmo o que já referi noutros posts: no próximo ano assistiremos a nova prorrogação de prazos, sendo que não será neste mandato que Sesimbra terá a Revisão do PDM aprovada e publicada. Pode ser que esteja redondamente enganada. Assim o espero. 

Pergunto: porque é que não foi transmitida esta informação? Será que ninguém conhece aquelas que são as decisões tomadas em Conselho de Ministros sobre esta matéria? E se assim for, permitam-me desde já uma sugestão: contratar mais uma assessoria destinada apenas a manter informados os órgãos de soberania do poder local (no caso, Câmara e Assembleia Municipal) sobre as matérias discutidas e propostas pela Associação Nacional dos Municípios Portugueses, e sobre aquelas que são as deliberações tomadas pelo Conselho de Ministros e que influenciam a gestão do território municipal. Poupavam-se perguntas e respostas. Poupavam-se momentos de “surpresa” e de “desagrado”. E mais importante ainda: tempo. Aquele tempo precioso de 10 minutos que cada Grupo Municipal detém para intervir. 

Sobre a resposta efectiva à pergunta colocada pelo Grupo Municipal do BE, e apesar de concordar com a mesma, não posso deixar no entanto de referir o seguinte:

A honra, responsabilidade e dever estão presentes em igual medida, em todos os eleitos. Sejam Presidentes, Vereadores ou Deputados Municipais. E cada um dos eleitos, em consciência, saberá com toda a certeza, que são documentos provisórios, com uma proposta que visa a discussão por parte de mais de duas dezenas de entidades. 

Todos saberão, em consciência, que não são documentos aprovados e por isso, não são susceptíveis de gerar qualquer tipo de expectativas em quem quer que seja. As expectativas, se forem criadas, serão iguais àquelas que se geram aquando de uma qualquer aposta no Euro milhões: poderão ou não, vir a acontecer.

Como disse e bem, o líder de bancada do PS no seu artigo de opinião publicado no jornal “O Sesimbrense” que acima referi, e que cito: “não é aceitável que as opções estratégicas que irão incorporar o novo PDM sejam estabelecidas de forma tecnocrática, dentro de quatro paredes.” 

Na minha opinião, não pode nem deve um documento como a Revisão do PDM (que dura há mais de 15 anos!) estar entregue apenas a um grupo restrito de uma única força política/partidária. Esse grupo restrito não é mais nem menos do que todos aqueles que, pelo voto popular, foram eleitos para integrar os órgãos de soberania do poder local. 

E permitam-me três perguntas: 

  1. De que vale um pedido de parecer jurídico perante uma decisão politica que visa apenas facultar a todos os eleitos um conjunto de informação que será deliberada politicamente e não, juridicamente? 
  2. De que vale consultar a CCDR (que preside a Comissão Consultiva) se aquela que é a proposta de Revisão do PDM pode ou não ser do conhecimento do executivo e deputados municipais? 
  3. Aliás, não deveria a Câmara ter deliberado remeter à CCDR a proposta de Revisão do PDM tendo em vista a sua análise por parte da Comissão Consultiva?

Cada um dos eleitos assumirá as suas responsabilidades. Sendo que os valores de honra, responsabilidade e dever estão presentes em igual medida, em todos os que foram eleitos e que compõem os órgãos de soberania do poder local sesimbrense. Sejam Presidentes, Vereadores ou Deputados Municipais.



FONTE DA IMAGEM: jornaltornado.pt


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