PROMESSAS ELEITORAIS - SESIMBRA - 1ª parte
Já são muitos os programas eleitorais que vi, ouvi e li, de diferentes partidos e de diferentes concelhos. E do conjunto de promessas que os mesmos apresentam, existem pelo menos quatro que são, no mínimo, questionáveis.
Por exemplo, haverá necessidade de prometer a execução de algo que faz parte da gestão diária e rotineira de uma autarquia? Refiro-me a expressões do tipo: “continuar a apoiar”; “continuar a reforçar”; “continuar a dinamizar”; “continuar a promover”. Seriam eventualmente consideradas promessas eleitorais se utilizassem a palavra não: “não continuar a apoiar”; “não continuar a reforçar”; “não continuar a dinamizar”; “não continuar a promover”.
Depois, surgem as outras promessas mais caricatas, do tipo, “construir a rede de saneamento” ou “melhorar a limpeza urbana” ou “ manter a rede viária” ou “renovar a rede de abastecimento”. Será que em pleno século XXI, é necessário prometer a realização de serviços básicos e imprescindíveis para o bem-estar da comunidade? Todos nós, enquanto cidadãos e munícipes contamos com essa garantia de execução, dado que a mesma faz parte das atribuições da gestão autárquica: a limpeza urbana, a manutenção da rede viária, a construção da rede de saneamento, a renovação da rede de abastecimento. E também a recolha do lixo, a manutenção dos espaços públicos, o alcatroamento de vias, a reparação de calçadas, a execução de passeios,… Não será necessário prometer aquilo que é uma competência basilar de qualquer gestão municipal.
Seguem-se aquelas promessas que se fazem sem certezas nenhumas mas que caem bem na opinião pública mais desatenta. Refiro-me a todas as promessas eleitorais que, não dependendo das forças políticas eleitas nem do seu desempenho, dependem de órgãos da administração central. E é ver frases do tipo “exigir junto de” ou “pugnar junto de” ou “construir em articulação com.”
E não posso deixar de referir outras promessas que são, consecutivamente, prometidas. E pior, são prometidas mas nunca executadas. No caso de Sesimbra, são vários os exemplos dos quais destaco apenas quatro: “concluir a Revisão do PDM” (esta é uma promessa que já dura há 13 anos, ou sejam mais de três mandatos); “construir o novo Edifício Municipal” (outra promessa com mais de três décadas, ou sejam mais de sete mandatos); construir a “Estrada dos Almocreves” e a “Variante do Porto de Abrigo” (promessas com mais de duas décadas, ou sejam mais de cinco mandatos).
E avanço desde já, com uma sugestão simples para a elaboração dos programas eleitorais: num único parágrafo (e se existir essa necessidade), prometer o óbvio e que faz parte da gestão autárquica. Num outro parágrafo, avançar com as promessas que dependem da administração central e que por isso, (e utilizando uma expressão da política actual) não serão expectáveis. E no terceiro parágrafo (existindo a necessidade de insistir nas mesmas promessas) prometer o que é prometido há décadas e que não é executado.
E ao quarto parágrafo, avançar de facto com o programa eleitoral. O programa que (para além das competências inerentes à gestão do território municipal, das promessas não expectáveis e das promessas que não passam disso), aponte de facto para uma visão, uma estratégia, uma teoria, uma ideia de desenvolvimento concreto, programado, exequível e que leve o povo, a massa eleitoral, a escolher essa visão, essa estratégia.
Claro que é fácil falar. Pior é fazer um programa eleitoral e apresentá-lo publicamente, para que seja discutido, analisado, estudado, comparado e escrutinado. E eu, que não sei nada de nada de política e que, conforme já referi, não tenho qualquer tipo de ambição politica ou partidária, dou por mim a pensar na minha terra. Naquela que seria a minha visão para Sesimbra.
E perante uma pandemia que alterou os modos de viver e de relacionamento entre os seres humanos, lembro-me de alguém questionar: se até ao século XVIII construímos impérios, se no século XIX construímos países e se, no século XX construímos cidades, como será o século XXI? E hoje, no ano de 2021, do século XXI, arrisco uma resposta possível: o século XXI será o da construção dos valores da humanidade, preservando não só a espécie humana mas também o planeta que nos alberga.
E para mim, esta é uma verdade tão absoluta que não tenho outra visão que não seja a da integração social, igualdade, partilha, crescimento sustentável, respeito pelos valores naturais, ecossistemas e todas as formas de vida e, consequentemente, promovendo o bem-estar social e económico, anulando diferenças e enriquecendo com as mesmas. Bonito. E como é que se transforma esta frase “politizada” numa proposta de programa eleitoral? Não faço a mais pequena ideia.
Nunca fiz nem nunca participei na elaboração de um programa eleitoral. Mas, dos que já vi, ouvi e li, parece-me que existirá uma qualquer regra para agrupar por temas as promessas desses mesmos temas, quando, na minha opinião, os temas são indissociáveis. Depois, parece-me que existe uma outra regra que promete a realização de obras em todos os temas definidos, como se fossem as obras prometidas a convencer o povo a votar neste ou naquele programa eleitoral. Geralmente os programas eleitorais adquirem um formato portátil, sem grandes textos, apenas com entradas tipo itens, relativas às iniciativas que promete, para que não sejam massudos e chatos (digo eu). Têm por norma uma frase efeito, tipo um slogan, e quase sempre, uma fotografia da equipa candidata.
E depois, durante a campanha eleitoral, cada partido e cada candidato, evidencia um ou outro tema que considera o mais importante ou o que pensa que irá reunir mais adesão eleitoral ou o que reflecte a vontade de determinado grupo do território municipal. O povo vota. Alguém ganha. E voltamos à rotina da gestão autárquica. Mais ou menos igual, aqui e ali diferente. Dependente de fundos governamentais e europeus. E tentando concretizar algumas promessas… nem que seja no último ano de mandato.
E decorridos os quatro anos de mandato, e no caso de Sesimbra, começa tudo de novo: não há Revisão do PDM, nem Edifício Municipal, nem Estrada dos Almocreves nem Variante ao Porto de Abrigo… e a maioria das promessas não expectáveis continuam a expectar. Restam apenas as competências e obrigações próprias da gestão camarária para enaltecer o trabalho realizado em quatro anos. E é por isso que é importante encher o programa eleitoral, a cada quatro anos, de promessas óbvias e que resultam apenas da gestão diária e rotineira do concelho, como sejam “continuar a apoiar”; “continuar a reforçar”; “continuar a dinamizar”; “continuar a promover”; “construir a rede de saneamento”; “melhorar a limpeza urbana”; “manter a rede viária”; “renovar a rede de abastecimento”… E também a recolha do lixo, a manutenção dos espaços públicos, o alcatroamento de vias, a reparação de calçadas, a execução de passeios,… para que, findo o mandato, possam ser enaltecidas como promessas cumpridas!
É tudo tão ridículo. Pergunto-me se alguém de facto, vota no partido A ou no partido B graças ao programa eleitoral que apresentam. Pergunto-me se alguém de facto, vota no partido A ou no partido B graças à competência e experiência profissional da equipa que apresentam e que, por sentido de serviço público, disponibilizam o seu saber para contribuir para o desenvolvimento da sua terra. Como diria Paulo Portas, pergunto-me se alguém de facto vota em “pessoas experientes ou, em pessoas que irão fazer experiências” nas áreas mais diversas e complexas.
Conforme tenho referido em vários posts, os políticos eleitos não são os donos da verdade e da razão. E em pleno século XXI, numa sociedade cada vez mais global e interconectada, onde cada cidadão tem um papel activo e preponderante naquela que é a sua comunidade, o seu território, o seu concelho, o seu país, é fundamental que o futuro seja participativo e agregador dos mais variados contributos, opiniões, soluções, reflexões, sugestões. Uma sociedade será próspera e solidária se a comunidade se sentir e estiver envolvida. As soluções poderão ser perfeitas, dentro de um qualquer gabinete. Mas se essas soluções não forem públicas, partilhadas e debatidas, jamais terão sucesso na sua implementação porquanto os membros da comunidade estarão excluídos da solução.
O tempo das “novidades” e das “surpresas” pertence às crianças. As “novidades” e as “surpresas” no mundo adulto têm de ser conhecidas atempadamente. Especialmente se essas “novidades” e “surpresas” alterarem os modos de vida da comunidade e se alterarem para sempre, a imagem daquela que é a terra de todos nós. Num concelho com cerca de 50 mil habitantes, delegar em cerca de oito dezenas de políticos um poder absoluto e autoritário perante uma gestão municipal que decide o futuro de Sesimbra (ou a falta dele), é abdicar de toda uma população activa, dinâmica e experiente que pode e deve contribuir, participando naquele que é um estado livre e democrático. A população, o povo, em pleno século XXI, não pode ser relegado apenas para o dia em que vai votar sendo que, durante os quatro anos de mandato é completamente esquecido. Como se não importasse para nada. Como se não existisse. Como se não fosse necessário disponibilizar de uma forma clara e inequívoca, informação apelando à participação, divulgando publicamente as reuniões de Câmara e da Assembleia Municipal (que continua com a visualização privada, sendo necessário um qualquer link e autorização), e todas as iniciativas que, pelo impacto que introduzirão no território municipal, carecem de uma divulgação global e ampla, antes da tomada de uma qualquer decisão politica ou de uma partilha nas redes sociais como uma mais-valia para Sesimbra. Por exemplo:
- Pode ou deve, uma decisão que altera o curso dos funerais na Vila de Sesimbra, ser tomada dentro de um gabinete e tornada pública como uma “surpresa!”?
- Pode ou deve, uma decisão sobre a construção de um equipamento público como o novo Centro de Saúde em Sesimbra, ser tomada sem explicar à população o porquê da localização do mesmo num dos pontos mais altos da Vila, pondo em causa o acesso de todos aqueles que têm de algum modo a sua mobilidade condicionada e que são, a grande maioria dos residentes da Freguesia de Santiago?
- Pode ou deve, uma decisão (que ascende a um milhão e trezentos mil euros) que visa implementar a sede do museu municipal no edifício da rua Aníbal Esmeriz, ser tomada dentro de um gabinete e tornada pública como uma “surpresa!”?
- Pode ou deve, uma decisão sobre a transformação do Santuário da Nossa Senhora do Cabo Espichel num hotel, ser tomada sem ouvir a população, nomeadamente os que mantêm aquele que já foi o maior culto de Portugal?
- Pode ou deve, a decisão de podar e cortar as árvores, ser tomada sem qualquer tipo de justificação ou fundamentação perante a população, nomeadamente as árvores do Jardim de Sesimbra que, em plena Primavera, continuam a mostrar-se como “troncos de Natal”?
- Pode ou deve, a decisão de montar gruas no centro da Vila para construir isto ou aquilo, ser tomada dentro de um gabinete e tornada pública como uma “surpresa!” para os residentes e comerciantes que ali ficam com um mono, meses infinitos? (parece que em pleno século XXI, é impossível construir o que quer que seja, no perímetro histórico da Vila de Sesimbra, sem uma grua… não sei como é que se construía antes do século XXI; ou melhor, antes do ano 2017 – sabendo-se dos perigos inerentes às mesmas e das proibições existentes em vários concelhos do país, nomeadamente, em centros históricos consolidados e identitários de uma vila/região).
- Pode ou deve, a decisão de demolir e construir um novo Bloco da Mata, ser tomada e realizada sem uma apresentação pública do projecto, em especial aos residentes na área envolvida?
- Pode ou deve, a decisão de construir um equipamento público como uma Biblioteca (pólo de Leitura) ser tomada sem que seja apresentado o projecto à população e que, entre outros, enquadre a necessidade de arrasar todas as árvores de porte existentes no terreno, numa altura em que a regra é manter as árvores integrando-as nas soluções a preconizar? (serão as lagartas? ou será o lixo que fazem? ou talvez as pinhas que possam cair?)
(continua AQUI)
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