"SESIMBRA, UM CONCELHO QUE NOS UNE"
Sesimbra continua isolada e distanciada da Área Metropolitana de Lisboa, sendo o seu peso turístico reduzido ao produto Arrábida, conjuntamente com os concelhos de Palmela e Setúbal. E qual é um dos atributos que contribui inequivocamente para o produto Arrábida? A vinha, o vinho e o enoturismo. Que, como todos sabemos, é coisa que Sesimbra não tem.
E neste ser e não ser, Sesimbra foi a “pérola da Costa Azul”. Mas quase ninguém reparou. Depois, Sesimbra tornou-se “um mar de emoções… todo o ano”. E poucos foram os que deram por isso, especialmente durante todo o ano que não é verão, Carnaval ou réveillon.
E veio o “Sesimbra é peixe!” De difícil apreensão. Lembro-me de algumas perguntas e respostas, aquando da apresentação desta denominação para Sesimbra:
- Pergunta: Sesimbra é peixe? Então e o sol e o mar?
- Resposta: O produto sol e mar está muito batido. É preciso mudar.
- Pergunta: E a Quinta do Conde é peixe?
- Resposta: Sim, se por exemplo se instalar na Quinta do Conde uma universidade com cursos ligados à ciência do mar!
- Pergunta: E o Cabo Espichel também é peixe?
- Resposta: Sim, tem barcos que vão ali pescar… e tem ali perto as praias com as artes do Meco.
O que eu não percebo é esta nova frase que surgiu em todo o lado há cerca de um mês (penso que a primeira vez que foi utilizada terá sido no cartaz a publicitar o novo Tribunal de Sesimbra), sem que a mesma tenha sido apresentada e explicada publicamente e, como é hábito, com pompa e circunstância. Não. Desta vez a nova frase de Sesimbra apareceu timidamente, em rodapé, dizendo: “Sesimbra, um concelho que nos une”. A quem? A quê? Como? Onde? Quando?
A mim, parece-me uma frase de uma qualquer campanha política. Um slogan, do tipo “Sesimbra: juntos avançamos” ou “Sesimbra somos nós” ou “Sesimbra sempre consigo” ou “Mais Sesimbra” ou “Sesimbra Unida”! Vota não sei em quem! “Sesimbra, um concelho que nos une!”
A frase efeito de um concelho, de um território, de um país, na minha opinião, deve passar uma mensagem de marca desse concelho, território ou país. Com um objectivo digamos, promocional e apelativo.
O problema é que esqueceram quem foi Sesimbra e não sabem o que querem que Sesimbra seja. E é tristemente que digo isto. Paralelamente, não existe uma definição de estratégia de desenvolvimento que identifique Sesimbra, que a distinga dos seus concorrentes directos e que a potencie na Área Metropolitana de Lisboa e no país que é Portugal.
E basta olhar à volta. O Seixal vai ser a “Cidade da Água”. Almada vai ter o “Innovation District”. Setúbal vai ser a “Cidade do Conhecimento”. E de acordo com os objectivos turísticos da região de Lisboa, Sintra tem gastronomia e um litoral selvagem; Cascais tem um hub náutico de luxo e o Golf; a Ericeira tem praias e surf; Mafra tem turismo na natureza; Almada, Seixal, Barreiro, Moita, Montijo, Loures e Vila Franca de Xira estão dedicados à exploração turística fluvial e acessos via rio Tejo a Lisboa, Cascais e Oeiras; Almada (Costa da Caparica) tem o surf. Setúbal e Palmela tem o vinho e a vinha e o moscatel e as tortas de Azeitão e a gastronomia.
Para o turismo da ARL, a Sesimbra resta-lhe o produto sol e mar (o tal produto muito batido que deu origem ao “Sesimbra é peixe!”). E um bocadinho de surf e de turismo da natureza (porque as acessibilidades são o que são). E sobre o Santuário do Cabo Espichel, o Turismo da ARL diz esta frase surpreendente: “Cabo Espichel – um lugar desconhecido (…) muitas vezes despercebido ao próprio turista lisboeta.” (Pergunto-me: se o Cabo Espichel é um lugar desconhecido para os turistas lisboetas, o que será para os turistas do resto do país e do mundo?)
E tristemente Sesimbra será não sei o quê. Tristemente, o Turismo da ARL não tem uma palavra sobre a Lagoa de Albufeira. Sobre o mergulho e desportos náuticos. Sobre o peixe, o marisco e a gastronomia. Porquê? Não faço a menor ideia. Ou melhor, sei bem porquê. Porque Sesimbra é o único concelho da AML que tem potencial para sobressair enquanto destino turístico de excelência, pela oferta diferenciada e de qualidade que apresenta. O que é que falta então?
Há uns anos, numa opinião que dei sobre o então Plano Estratégico de Turismo da região de Lisboa, referi que “Sesimbra tem um conjunto de valores que não devem ficar reduzidos ao elemento de ligação dos três municípios: a Arrábida e a enologia. Os seus valores devem ser evidenciados e não apenas aparecerem como uma espécie de complemento a Palmela e Setúbal (…) É Sesimbra que tem a maior área do seu território na Arrábida. Não pode nem deve ficar dependente dos autocarros turísticos que vêm de Lisboa, Palmela, Setúbal,… visitar o castelo e o cabo espichel e, no final do dia regressam aos seus hotéis, onde dormem, comem e gastam dinheiro. Sesimbra não se deve posicionar num lugar complementar de outros destinos “vendendo” uma região vitivinícola para a qual não produz nem tem qualquer produto/adega. É Sesimbra que está no coração da Arrábida com a sua sede de Concelho e vila medieval; é Sesimbra que tem riqueza natural e patrimonial em quase 90% da sua área territorial e que é Arrábida.”
Passados estes anos, está tudo igual. Sesimbra continua subjugada para o canto que é o limite mais ocidental da AML, de difícil acesso e longe de todos os eixos de ligação viária e ferroviária. E até, pasme-se, é contra o aeroporto no Montijo porque está em causa (fruto do tráfego diário previsto de pesados – na ordem dos 63 camiões – para fornecimento das pedras e britas necessárias à obra), a degradação da rede viária, com consequências negativas não só para a população mas também para o turismo. Qual turismo?
Na mesma opinião que dei sobre o então Plano Estratégico de Turismo da Região de Lisboa, terminava dizendo. “Se todos soubermos o que queremos e o que não queremos. Explicarmos o que somos e o que temos, talvez um dia, possamos ambicionar um lugar na região, no pais e no mundo, como destino turístico efectivo.” E mantenho.
“Sesimbra, um concelho que nos une”! A quem? A quê? Como? Onde? Quando?
Sou completamente contra esta nova frase politizada e apenas com hipotético potencial para slogan de campanha eleitoral. A existir necessidade de uma nova frase, que a mesma seja global, identificando os sesimbrenses e, ao mesmo tempo, apresentando Sesimbra ao mundo.
Se Sesimbra deixou de ser “peixe!”, expliquem porquê. E se “Sesimbra”, porque “S!M”, deixou de resultar, expliquem porquê. E se há necessidade de uma nova frase, expliquem porquê, com pompa e circunstância e umas belas fotografias para partilhar na net! E se a pandemia serve de argumento para a não apresentação pública da frase, façam-no virtualmente e cumprindo as regras de segurança! Perdoem-me o tom.
E não querendo voltar ao mesmo, tenho de perguntar: qual é a estratégia definida pela Revisão do PDM? O que é que Sesimbra ambiciona ser? É na pesca? É na natureza? É na segunda habitação? Não me digam que é na enologia? Isso é que era! Uma coisa nova, com reminiscências às vinhas de outrora existentes nas encostas da Azoia até ao Cabo Espichel. Vinha salgada pelo Atlântico sul! Gosto. Ou então ali, ao Feijão, em memória das vinhas do Carlos Jacob. Vinha da piscosa! Prá frente é que é caminho!
E não é que o orçamento de Sesimbra para 2021, tem uma verba atribuída (superior a trinta mil euros) para plantar vinha?!? Fantástico. Se Sesimbra é Arrábida, vinha, vinho e enoturismo, adapte-se Sesimbra ao que a forçam a ser. Já que não consegue ser Sesimbra, ajuste-se ao que deixam que seja. E até tenho uma ideia para uma frase bonita: Sesimbra, a terra da vinha salgada!
Ou uma frase sentida: Sesimbra, no coração da Arrábida!
Ou outra mais poética: Sesimbra, a natureza abraça-nos!
Ou ainda outra mais concreta: Sesimbra do mar e da serra!
Ou então uma frase contraditória: Sesimbra, longe e perto!
Ou uma frase verdadeira: Sesimbra, no canto da AML!
Ou esta igualmente verdadeira: Sesimbra, onde a presença humana é proibida nas encostas a sul!
E esta outra também verdadeira: Sesimbra, do Santuário que vai ser um hotel!
Ou então uma frase mais melancólica: Sesimbra, o que já foste um dia…
Ou uma frase interrogatória: Sesimbra, o que fizeram de ti?
Ou então: Sesimbra, para onde vamos?
E porque não uma frase misteriosa: Sesimbra, a terra que espera por novidades!
Ou mais desportiva: Sesimbra, a terra “fora de jogo”!
Ou mais teatral: Sesimbra, ser ou não ser?
Ou uma frase adaptada de um clássico cinematográfico: We'll always have Sesimbra!
Ou utilizando um refrão musical: "Sesimbra tem… eu não sei bem como explicar…"
Ou uma frase inspirada num titulo de livro: Sesimbra, que futuro?
Ou naquele outro titulo de livro: Até amanhã Sesimbra!
E porque não uma frase inspirada numa expressão popular sesimbrense: Sesimbra atão?
Ou aquela outra: Sesimbra, vai lá vai!
Perdoem-me o entusiasmo. Talvez um pouco excessivo.
“A piscosa Sesimbra”! Urge definir caminhos e estratégias consensuais que garantam um futuro sustentável, inclusivo, moderno, que respeite a memória e identidade das suas gentes. E essa estratégia, esse caminho, não pode mudar a cada quatro anos, alterando, anulando ou revirando tudo ao contrário.
Uma estratégia, um caminho, poderá começar com a definição de numa coisa muito simples: a frase que identifica Sesimbra ao mundo. E na força dessa frase, será possível vir a construir e consolidar essa Sesimbra ambicionada. E se não existir frase nenhuma, que seja apenas “SESIMBRA”, na sua plenitude, com tudo o que a caracteriza e diferencia.
O concelho já nos une a todos há mais de oitocentos anos! O problema é que esta última frase, não sendo de uma campanha eleitoral, assume-se como tal. E esta é uma verdade tão absoluta como dizer “Sesimbra: juntos avançamos” ou “Sesimbra somos nós” ou “Sesimbra sempre consigo” ou “Mais Sesimbra” ou “Sesimbra Unida”! Vota não sei em quem! “Sesimbra, um concelho que nos une!”
Reafirmo: sou completamente contra esta frase de slogan partidário de uma qualquer campanha eleitoral. Sesimbra não é um partido, nem tem ambições políticas. Sesimbra é uma das vilas mais lindas e mais antigas de Portugal. E também por isso, merece ser referenciada com a grandeza e autenticidade que a caracterizam.
O surgimento deste slogan partidário, associado a Sesimbra, curiosamente (ou não) meses antes das eleições, talvez tenha sido um lapso, uma confusão qualquer. Conforme referi em AUTÁRQUICAS 2021 - SESIMBRA, há que separar o trigo do joio.
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