SESIMBRA NA GRANDE ROTA EUROPEIA

Sesimbra tem cerca de 80% do seu território integrado em áreas de Reserva Ecológica Nacional, Áreas de Protecção Especial integradas no Parque Natural da Arrábida, Rede Natura 2000, Zonas de Protecção Especial, Áreas Agrícolas e Florestais,… assumindo-se como o grande pulmão verde da Península de Setúbal. E cada vez mais são muitos os que escolhem o concelho de Sesimbra para a prática de passeios, sejam de bicicleta, sejam as caminhadas a pé. 

Vem isto a propósito do guia de caminhadas que integrava o Expresso deste fim-de-semana. Na página dedicada a Setúbal, surgem quatro percursos pedestres. Um deles (Setúbal) inicia-se no Portinho da Arrábida, atravessa a Serra do Louro e termina na Serra do Risco, depois das Marmitas do Gigante, não referindo o concelho de Sesimbra. Um outro (Almada) tem início pela Arriba Fóssil da Costa da Caparica, atravessando a Mata dos Medos e terminando na Lagoa de Albufeira e cito, “na vizinha Sesimbra”.

Dei por mim a pensar: quando é que Sesimbra se irá apropriar do espaço que é seu, enquanto uma mais-valia atractiva e apelativa do chamado turismo de natureza? Porque é que os percursos dos concelhos vizinhos não se ligam com Sesimbra? Ou melhor, porque é que Sesimbra não liga estes dois percursos? Mostrando e divulgando a sua costa atlântica, o seu património, a sua Vila sede de concelho, as suas gentes, as suas artes de pesca, a sua gastronomia?

Ontem, acidentalmente, vi o edital da Câmara Municipal de Sesimbra tornando público que a Câmara deliberou submeter e cito “a audiência dos interessados o levantamento, identificação, localização e caracterização do conjunto de trilhos que compõem a Grande Rota 11/E9, no troço situado no concelho de Sesimbra”, dizendo o mesmo edital que os interessados teriam um prazo de 15 dias para se pronunciarem, “a contar da publicação do aviso na 2ª. Série, do Diário da República”. Há coincidências fantásticas. Pesquisei a respectiva pasta que disponibiliza os vários elementos para consulta pública AQUI e, fui pesquisar a 2ª. Série do Diário da República para saber quando terminariam os 15 dias. E desde segunda-feira da semana passada até hoje, não encontrei a publicação do respectivo Aviso (e peço desculpa desde já se porventura foi publicado e eu não o encontrei). Não sei se a página da Câmara irá publicitar de uma forma visível, o início do período de consulta pública, referindo o términus da mesma. E por isso, porque me parece importante, decidi partilhar aqui a minha opinião (extensa) sobre o troço situado no concelho de Sesimbra e que integra a Grande Rota 11/E9.

A Grande Rota 11/E9 é um percurso pedestre transeuropeu, também conhecido como Grande Rota Europeia – Caminho do Atlântico. Este percurso percorre toda a costa atlântica da Europa, iniciando-se na Rússia e percorrendo a linha de costa de dez países (Estónia, Letónia, Lituânia, Polónia, Alemanha, Holanda, Bélgica, França, Reino Unido, Espanha) até entrar em Portugal (em Valença) e terminar no Cabo de Sagres (São Vicente). No Concelho de Sesimbra, o troço da Grande Rota continua do fim do troço que integra o Concelho de Almada (e que vinha descrito no guia do jornal) e estende-se até ao inicio do troço que integra o Concelho de Setúbal (e que vinha descrito no mesmo guia). 

Nos documentos disponibilizados para consulta pública surgem 73 plantas com a demarcação do percurso pedestre que irá atravessar o Concelho (e ligando Almada a Setúbal), um documento escrito identificado como “Caracterização e Fundamentação” e, um anexo com a “Identificação e características dos terrenos e do traçado da GR11-E9 no concelho de Sesimbra”. Desde já felicitar o trabalho desenvolvido e apresentado. Finalmente, o Concelho de Sesimbra vai ligar-se aos percursos pedestres que existem nos concelhos limítrofes e que, sem identificarem Sesimbra, utilizam os seus recursos como mais-valias próprias. Mais, o Concelho de Sesimbra será finalmente parte integrante de uma das grandes rotas pedestres da Europa. Com todas as mais-valias que essa integração poderá vir a representar (nomeadamente no comércio e restauração).

Grosso modo, o percurso irá continuar pela Mata dos Medos (Almada), contornando a Lagoa de Albufeira e seguindo na direcção da praia do Meco. Continua junto à linha de costa subindo ao Cabo Espichel, Serra da Azoia, Pinheirinhos. Entra no Zambujal, desce na direcção do Porto de Abrigo para voltar a subir pela Estrada da Assenta. Chega à Corredoura, sobe para Santana e segue para as Pedreiras, entrando por Calhariz e seguindo para a Serra do Louro. 

Curiosamente, nenhum dos troços englobados no percurso da Grande Rota utiliza aquela que “foi uma verdadeira revolução em termos de mobilidade suave”. Estou a falar daquela obra que dizem ser PAMUS. Ora se foram gastos mais de três milhões de euros na construção desta “mobilidade suave”, não se entende o porquê de desperdiçar esta “rede que provavelmente vai ser um grande exemplo para futuro daquilo que deve ser feito.” Ainda bem, digo eu 😊. Mas talvez exista uma qualquer explicação óbvia e clara.

Importa também referir que, com esta Grande Rota implementada, estão reunidas as condições para fazer um conjunto de promessas a constar nos programas eleitorais. E claro, nos vários orçamentos municipais que vierem a ser apresentados 😊

Entrando no documento escrito identificado como “Caracterização e Fundamentação” é referido (página 4) que os “percursos serão estabelecidos ao longo de caminhos já existentes e com utilização ancestral” sendo que, dos seis objectivos e critérios definidos, transcrevo apenas um: “Evitar situações de potencial insegurança e/ou risco para utilizadores”.

No mesmo documento (página 10) é referido que “a sinalização e a marcação do percurso serão efetuadas (…) seguindo as melhores práticas internacionais e utilizando materiais adaptados ao meio ambiente e resistentes ao vandalismo”, sendo que, “ao longo do traçado serão colocadas as indicações do percurso (em suportes existentes ou em suportes físicos adequados).” Não são, no entanto, referidas medidas de protecção a implementar para garantir a segurança dos utilizadores.

Existem dez troços do percurso definido, nos termos do descrito no documento “Caracterização e Fundamentação”, que carecem de algumas intervenções urgentes, nomeadamente porque já são hoje, utilizadas para caminhadas e/ou corridas. Nestas, as intervenções passariam pela regularização de pavimentos e marcações horizontais definindo o percurso pedonal. Conforme refere o mesmo documento, o pedestrianismo tem “verificado o aumento massivo de utilização dos grupos informais, bem como o aumento de grupos organizados com origem no associativismo.” Ou seja, estes grupos informais ou organizados, não têm um horário ou um dia definido. O que significa que a utilização da Grande Rota pode ocorrer todos os dias do ano, sem qualquer tipo de anúncio ou publicidade. Assim, e estando prevista “a sinalização e a marcação do percurso” a mesma deverá contemplar também sinalização para que os condutores (que se irão deparar em vários troços com esta Grande Rota), estejam devidamente alertados sobre a eventualidade de poderem encontrar um grupo de caminhantes. 

Seis dos troços a que me refiro dizem respeito aos percursos compreendidos entre:

  • o Cabeço da Flauta e a Ribeira da Aiana (Plantas 61 - 62);
  • a entrada da Doca e o acesso à Praia do Ouro (Planta 10);
  • a Estrada de Palames, junto à ERG e até ao estacionamento existente (Planta 9);
  • o cruzamento entre a Estrada de Palames e a Estrada da Assenta (Planta 9); 
  • a Estrada da Assenta até ao cruzamento para a CHE Zambujalense (Planta 9);
  • a estrada da Assenta até ao cruzamento para o Castelo de Sesimbra (Planta 7). 

Os restantes quatro troços dizem respeito:

  • Zambujal (Plantas 14 – 15 – 16);
  • Pedreiras (Planta 3);
  • Corredoura (Planta 6);
  • Santana (Planta 5).

Não entendo no entanto, em que medida é que o troço da Corredoura (Planta 6) e o troço de Santana (Planta 5) – e que irão levar os seus utilizadores para o meio de áreas urbanas consolidadas, com um elevado tráfego rodoviário, com elevados níveis de poluição sonora e do ar, sem pontos de interesse (de acordo com o Anexo II – Planta Geral e que integra os documentos disponibilizados para consulta pública), com problemas de segurança e não garantindo um percurso livre e desimpedido –, se constituirão como mais-valias da Grande Rota. 

O percurso da Corredoura, no troço compreendido entre a rotunda do D. Sancho I e a Igreja da Corredoura, é perigoso e apertado. Tem uma pequena recta que depois, numa subida ligeira e em curva, se torna extremamente apertada, perigosa e sem visibilidade. É uma via com bastante tráfego rodoviário, sem passeios e sem a definição de um percurso pedonal livre, desimpedido e seguro sendo que, actualmente, quem efectua este percurso a pé, realiza-o pelo meio da estrada.

O percurso de Santana percorre uma das vias com maior tráfego do Concelho de Sesimbra. Santana será a maior zona de caos urbano do Concelho de Sesimbra. Não me parece de todo, que esta solução seja a indicada para servir uma actividade inserida numa Grande Rota que será conhecida por onze países diferentes, numa modalidade onde, conforme já referi, se tem “verificado o aumento massivo de utilização dos grupos informais, bem como o aumento de grupos organizados com origem no associativismo.” Não deverá ser criado mais um problema no caos urbano que é Santana. Deverá isso sim e em primeiro lugar, ser resolvido esse caos urbano (faço aqui um parêntesis para o que referi em IDEIAS E PROJECTOS PARA SESIMBRA, nomeadamente sobre a importância do Plano de Urbanização de Santana). E depois, só depois, pensar em Santana como parte integrante da Grande Rota.

No mesmo documento é referido (página 1) que o “pedestrianismo é a atividade desportiva, turística e ambiental que consiste em percorrer percursos a pé ao longo de trilhos, preferencialmente tradicionais ou históricos, na natureza ou em meio urbano. (…) Esta prática promove a conservação do património viário histórico e a preservação do património cultural das regiões que atravessam, nomeadamente a gastronomia e o património construído, contribuindo igualmente para a dinamização do comércio local.” 

E assim, de acordo com o que acima referi, seriam de anular os troços da Corredoura e de Santana. Mas esta é só a minha opinião. E completamente criticável. E criticável é também o que proponho em seguida: a Grande Rota deve entrar na Vila de Sesimbra. E sugiro a seguinte alternativa (igualmente criticável): 

  1. Chegando ao cruzamento da Estrada da Assenta para o Castelo, seguir em frente pela via calcetada adjacente ao Parque de Merendas do Castelo e descer por aquela que foi a primeira via de acesso à Vila e ao mar de Sesimbra. Descer a rua Conselheiro Ramada Curto (passando pela Capela de São Sebastião), a rua Cândido dos Reis (passando pela Igreja de Santiago e Capela do Espirito Santo dos Mareantes). Entrar na rua da Fortaleza, seguindo pela marginal na direcção da Praça da Califórnia (este troço substituiria o troço da Corredoura).
  2. Subir da Praça da Califórnia na direcção do Bairro dos Pescadores e continuar pela Estrada de Argéis até ao cruzamento de Sampaio, seguindo para a direita, na direcção das Pedreiras (este troço substituiria o troço de Santana). 

Nestes dois troços alternativos que proponho, para além dos vários pontos de interesse existentes, os caminhantes ficariam a conhecer “a gastronomia e o património construído, contribuindo igualmente para a dinamização do comércio local.” Acresce que Sesimbra é a única Vila localizada dentro do coração da Serra da Arrábida, tendo aos pés um Parque Marinho. E a Fortaleza de Santiago, assumindo-se como miradouro sobre o Atlântico e guardando a história da pesca e que esteve na origem deste povoado, seria também um dos pontos de acesso à Grande Rota (conforme define o quadro constante na página 10 do mesmo documento). Para que também, quem esteja na Vila, possa iniciar o percurso naquela que é uma rota europeia com mais de cinco mil quilómetros. E depois seguir por Argéis, entrando no verde da Serra da Arrábida e com uma das mais belas vistas sobre a baía de Sesimbra e o seu Castelo.

O que eu espero sinceramente? Que, se esta marcação e definição da Grande Rota avançar no Concelho de Sesimbra, não fique resumida apenas a uma iniciativa pontual que com o passar do tempo, é descorada e abandonada. Ou pior ainda, que não seja apenas uma deliberação com uma fotografia qualquer num ponto qualquer da Grande Rota. E já agora, que nenhum troço do percurso da Grande Rota entre em áreas onde é proibida a presença humana (essa norma que, sendo inconstitucional, digo eu 😊, consta no regulamento do Parque Natural da Arrábida).


FONTE DA IMAGEM: wikipédia

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