Partilho aqui o meu artigo de opinião no Jornal "Raio de Luz" de Maio de 2024.
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No passado dia 14 de Maio, o Primeiro-Ministro comunicou ao país a decisão sobre a localização escolhida pelo governo para a construção do novo aeroporto: Alcochete (que é em Benavente) e que terá o nome de Luís de Camões. E também, a efectivação das tão atrasadas obras no aeroporto Humberto Delgado, a construção da linha de alta velocidade – TGV – Lisboa/Madrid e, a construção da terceira travessia sobre o rio Tejo (e que ligará o Barreiro a Lisboa).
Vamos por partes.
A decisão sobre a localização do novo aeroporto de Lisboa dura há mais de 50 anos. E nestes mais de 50 anos foram várias as decisões tomadas sobre a localização do novo aeroporto: em Rio Frio (1969 – Marcelo Caetano); na Ota (1979 – António Guterres); em Alcochete (2008 – José Sócrates); na Portela com a complementaridade do Montijo (2010 – Pedro Passos Coelho); na Portela com a complementaridade do Montijo e posteriormente, Alcochete como aeroporto principal (2022 – Pedro Nuno Santos).
Esta decisão de Pedro Nuno Santos foi prontamente revogada por indicação de António Costa e, num entendimento com o então líder da oposição (Luís Montenegro), foi constituída uma Comissão Técnica Independente que analisou nove propostas de localização, apontando (no relatório que produziu) como mais favorável, para localizar o novo aeroporto de Lisboa, o Campo de Tiro de Alcochete, localizado em Benavente.
E Luís Montenegro anunciou a tomada de decisão do governo que teve por base o trabalho desenvolvido pela Comissão Técnica Independente (nomeadamente a localização mais favorável). Espero que seja finalmente desta vez, que a decisão tomada, não seja apenas mais uma decisão que fica no papel. Que desta vez a decisão se transforme efectivamente em obra, em consolidação de uma infraestrutura que é estruturante para o país há mais de 50 anos.
Para além desta decisão de localização que, a ser concretizada e materializada, estará apta a funcionar daqui por mais de 10 anos, o aeroporto Humberto Delgado precisa de obras. Porque, o volume de turistas e número de voos tem vindo a crescer exponencialmente, fazendo com que o aeroporto Humberto Delgado não consiga responder às actuais necessidades. Estas obras estão previstas há anos e, finalmente, irão ser realizadas no sentido de permitir uma maior capacidade do actual aeroporto até à concretização do novo aeroporto Luís de Camões.
(Apenas referir que o sector do Turismo é um dos grandes activos económicos do país, representando em 2023, 21.1% do PIB nacional – de acordo com o relatório “Economic Impact Research (EIR) 2023” do WTTC – World Travel & Tourism Council.)
A construção da linha de alta velocidade – TGV – Lisboa/Madrid decorre também da análise e do relatório final apresentado pela Comissão Técnica Independente: o novo aeroporto Luís de Camões terá de estar ligado a uma rede de acessibilidades rápida, segura e eficiente que ligue em minutos o novo aeroporto à capital do país. Mas também ao Porto, através de um ramal da linha de alta velocidade Lisboa/Madrid.
E com esta ligação de alta velocidade – TGV – Lisboa/Madrid, vem a construção da terceira travessia sobre o rio Tejo (e que ligará o Barreiro a Lisboa). Importa dizer duas coisas: a primeira é que esta terceira travessia sobre o rio Tejo está prevista no Programa Nacional de Investimentos 2030; a segunda é que (de acordo com a página regiaoriomaior.pt), o ministro do interior espanhol terá revelado que a terceira travessia sobre o rio Tejo está prevista no caderno de encargos relativo ao campeonato do mundo de futebol, sendo que a mesma terá de estar pronta, (para servir o fluxo de adeptos inerente ao evento e que se irão deslocar de Madrid para Lisboa e vice-versa) até 2030.
Significa portanto que as obras no aeroporto Humberto Delgado irão avançar, a terceira travessia sobre o rio Tejo terá de estar pronta em 2030 (segundo o ministro do interior espanhol) e a linha de alta velocidade – TGV – Lisboa/Madrid também. Assim como a linha Lisboa/Porto/Vigo. E lá para 2035 o novo aeroporto Luís de Camões estará em funcionamento.
Até custa a crer. Em apenas 10 anos Portugal terá um novo aeroporto, uma nova ponte sobre o Tejo e duas linhas de alta velocidade que ligarão Lisboa a Madrid e, Lisboa ao Porto e Vigo.
E para além dos estudos, dos projectos, das análises, das soluções, das implicações, dos custos, dos relatórios (nomeadamente ambientais) que terão de ser realizados antes do início de qualquer obra/construção, a verdade é que o novo aeroporto Luís de Camões, a terceira ponte sobre o Tejo e a linha de alta velocidade, terão um enorme impacto na Península de Setúbal: nas acessibilidades, no desenvolvimento urbano, no turismo, na economia e na coesão territorial com a AML, o país e a Europa.
Sesimbra não deve, nem pode, ficar “fora de jogo”. Na minha crónica de Setembro de 2022, referi um dos muitos estudos produzidos pela Área Metropolitana de Lisboa (AML), através da TML (Transportes Metropolitanos de Lisboa) que identificou, ao nível da mobilidade urbana na AML, os grandes eixos de distribuição e ligação àqueles que são os canais nacionais de distribuição e ligação com o resto do país e da Europa. Nesse estudo, Sesimbra é o único concelho que não tem um único eixo de ligação a essa rede de distribuição. Aliás, Sesimbra não tem qualquer identificação de eixos rodoviários. Nem tão pouco daqueles que são considerados como fundamentais e prioritários e que, para além de estarem previstos desde 1998 no PDM, estão consagrados no Plano de Acessibilidades do Concelho de Sesimbra.
É urgente uma nova visão que contemple esta realidade, assegurando que Sesimbra é parte integrante das soluções que vierem a ser preconizadas, nomeadamente nos estudos e projectos de acessibilidades à região e a cada um dos municípios. A construção de uma nova ponte, de uma linha de alta velocidade e de um novo aeroporto na península de Setúbal deve, por si só, obrigar a uma revisão total do Plano de Acessibilidades do Concelho de Sesimbra. E desde logo, nessa revisão, apontar soluções ferroviárias que permitam também ao concelho de Sesimbra, ligar-se ao resto do país e da Europa.
Mas também deve espelhar-se naquele que é, como se sabe, um “instrumento estratégico de excelência”: a Revisão do PDM de Sesimbra (que dura há 17 anos, 17 anos!), nomeadamente nas acessibilidades ao Concelho (prevendo uma ligação ferroviária ao Concelho e dentro do Concelho) e na mobilidade dos diferentes fluxos pelo Concelho (definindo vias principais e secundárias, vias mistas, vias pedonais e cicláveis; definindo uma linha de metro de superfície ecológica e sustentável (por exemplo ao longo da estrada da Apostiça); identificando os polos geradores e atractores de deslocações (as praias e a Vila de Sesimbra); definindo polos de estacionamento e postos de carregamento de veículos eléctricos; definido uma rede de transportes públicos articulada com os polos de estacionamento e a rede de pedonal e ciclável;…).
E apenas um parêntesis: de acordo com o transmitido na última Assembleia Municipal, o processo de Revisão do PDM está numa espécie de limbo porque e cito “de acordo com a legislação do Simplex acabou a concertação, não há concertação” e o Município está a perceber o que vai fazer. Acontece porém que a “legislação do Simplex” não acabou com a concertação no caso dos planos directores municipais. E é a própria “legislação do Simplex” que o afirma na alínea aa) do número 1 do artigo 1º, (relativamente à simplificação de procedimentos em matéria de urbanismo e ordenamento do território), agilizando os procedimentos e cito “de aprovação de planos de urbanização e planos de pormenor, através da eliminação do acompanhamento da elaboração dos mesmos pelas Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional e da eliminação da fase de concertação.” A “legislação do Simplex” não revogou nenhuma das normas aplicáveis aos planos directores municipais, nomeadamente a importante fase de concertação.
A revisão do PDM já tarda há tempo demais. É urgente concluir o procedimento (o prazo termina a 31 de Dezembro de 2024) e, tal como foi dito na mesma Assembleia Municipal, promover desde logo o inicio de um novo processo de Revisão, participativo, transparente e aglutinador de várias visões para o Concelho, na senda daquele que foi o artigo de opinião do líder de bancada do PS (e cabeça de lista para a Assembleia Municipal, nas últimas eleições autárquicas) publicado em Março de 2022 no jornal “O Sesimbrense”: “não é aceitável que as opções estratégicas que irão incorporar o novo PDM sejam estabelecidas de forma tecnocrática, dentro de quatro paredes”.
Voltando ao aeroporto, à nova ponte sobre o Tejo e à linha de alta velocidade.
Em Fevereiro de 2020, a Assembleia Municipal de Sesimbra deliberou (com os votos favoráveis apenas do PCP e do BE) emitir parecer desfavorável ao aeroporto do Montijo e defender a construção do novo aeroporto em Alcochete. Dos vários argumentos desfavoráveis, estava a necessidade de recorrer às pedreiras calcárias de Sesimbra para fornecimento de pedras e britas para a efectivação da obra no Montijo, prevendo um tráfego diário de pesados na ordem dos 63 camiões por dia. 63 camiões por dia a atravessar o Concelho e a danificar ainda mais, a miserável rede viária, com consequências negativas não só para a população mas também para o turismo (na altura questionei se o argumento cairia por terra se, por um acaso, o aeroporto fosse em Alcochete).
Agora que o novo aeroporto Luís de Camões será em Alcochete (sendo que pelo menos na Assembleia Municipal o PCP será favorável a essa localização, dado que cinco dos deputados são os mesmos que eram em 2020), com toda a certeza que os minerais extraídos das encostas da serra da Arrábida serão fundamentais para a concretização destas infraestruturas (até pela proximidade e consequentemente, redução de custos de transporte). Serão anos de grande azáfama pelas estradas do Concelho. Talvez até, mais de 63 camiões por dia a atravessar o Concelho.
Logo agora que a Câmara vai contrair um empréstimo de 4 milhões de euros para arranjar a miserável rede viária e que inclui, entre outras, a Estrada das Pedreiras.
Logo agora que a Câmara exige a reabilitação urgente da EN 379 (nomeadamente o troço da Maçã) por parte das Infraestruturas de Portugal.
Há coincidências com um timing absolutamente fantástico.
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