Partilho aqui o meu artigo de opinião no Jornal "Raio de Luz" de Março de 2024.

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Atente-se nas palavras de Ramalho Eanes, primeiro Presidente da República Portuguesa eleito livre e democraticamente a 27 de Junho de 1976:
Acredito nos portugueses e acredito até na ciência politica porque quando se olha para a História chega-se à conclusão que mesmo quando parece que votaram mal conclui-se, afinal, que votaram bem.”

No dia em que escrevo (14 de Março) ainda não são conhecidos os resultados da Europa e do resto do mundo e que irão confirmar, ou não, o vencedor destas eleições legislativas. O que se sabe no dia de hoje é que a AD venceu, o PS perdeu, o Chega cresceu. O PCP desceu. O Livre cresceu. O BE, o PAN e a IL mantiveram os mesmos eleitos. E a abstenção desceu para 33,77%. 

Os portugueses mobilizaram-se e foram votar em massa. O que significa que a democracia portuguesa está viva e de saúde. E ao votarem expressivamente, o que parece ressaltar nos resultados apurados é o crescimento do Chega. E agora? Socorro-me das palavras de Ramalho Eanes quando diz que os portugueses “mesmo quando parece que votaram mal conclui-se, afinal, que votaram bem”.

Há muitas maneiras de olhar para os resultados eleitorais. E se se olhar com atenção, a esmagadora maioria dos portugueses (mais de 3 milhões e 300 mil) votou nos partidos do centro (à esquerda e à direita). Cerca de 2 milhões de portugueses votaram nas estremas (à esquerda e à direita). E cerca de 300 mil portugueses votaram em forças politicas que não foram eleitas.

Os portugueses não estão fartos da democracia, nem dos direitos constitucionais, nem da liberdade conquistada. Os portugueses estão fartos das politiquices entre partidos que deviam encontrar consensos de futuro, deixando de lado os interesses políticos, partidários e pessoais. Os portugueses estão fartos dos casos judiciais, das suspeitas disto ou daquilo, dos jobs for the boys. Os portugueses estão fartos de não ver ninguém julgado, nem responsabilizado ou declarado inocente. Os portugueses estão fartos de ver a troca de cadeiras e o funcionamento das portas giratórias que vai minando tudo em todo o lado com ex-isto ou ex-aquilo. Os portugueses estão cansados, exaustos. 

O tempo não está para demagogias e convicções mais ou menos ideológicas. Portugal está um caos na saúde (sem urgências, sem médicos, sem assistência permanente); está a rebentar pelas costuras na educação (com escolas degradadas que a transferência de competências entregou aos Municípios, com professores insatisfeitos, com défice de profissionais); está entupido na justiça (com instalações judiciais que necessitam de obras urgentes, com mega-processos sem fim à vista, com julgamentos que se arrastam indefinidamente); está em crise na habitação (com um pacote «mais habitação» que gerou uma onda nacional de protestos, com falta de investimento público, com património público que continua por identificar e recuperar); está perdido na agricultura (com a seca por todo o país e em particular no Algarve, com o disparate de licenciamentos de plantações de abacates, com a falta dos apoios prometidos e nunca concretizados); está à nora com as infraestruturas (com a localização do aeroporto, com a execução do TGV, com a construção de uma nova travessia sobre o Tejo); está consumido pelas energias limpas (com megas explorações de lítio, com megas instalações de centrais solares em centenas de hectares de solos, com megas instalações de fontes de energia eólica flutuante em toda a costa portuguesa); está invadido de manifestações de um sem número de classes profissionais (que reclamam melhores condições de trabalho, melhores salários, melhores valorizações e avaliações).

Os portugueses não estão fartos da democracia, nem dos direitos constitucionais, nem da liberdade conquistada. Os portugueses estão fartos de politiquices. Os portugueses estão cansados, exaustos. 

A vitória foi esmagadora nos partidos do centro (à esquerda e à direita). O que os portugueses parecem querer dizer é: entendam-se! 

Será assim tão difícil para os deputados eleitos pelos partidos do centro (à esquerda e à direita), chegarem a entendimentos que visem, em primeiro lugar, responder aos portugueses? Não são apenas as vozes de esquerda que têm razão. Nem são apenas as vozes de direita que têm razão. Até porque existe gente competente à esquerda e à direita. Assim como existe gente menos competente à esquerda e à direita. O tempo é de consensos porque o mundo está-nos a bater à porta e as consequências são imprevisíveis (as eleições nos Estados Unidos, as eleições para o Parlamento Europeu, as guerras na Europa).

Não estão em causa as ideologias políticas, nem os valores em que cada um acredita e defende. Mas caramba!, em qualquer instituição ou empresa, pessoas de direita e de esquerda conseguem funcionar em uníssono em prol da instituição ou da empresa. 

230 deputados foram eleitos. O futuro de Portugal está nas mãos de 156 deputados. 

O Chega? É apenas uma maioria na extrema-direita. E a extrema (direita e esquerda) junta, totaliza apenas 74 deputados. O peso do Chega será aquele que lhe atribuírem. E tem tanto valor o Chega (enquanto eleição que resulta do voto popular) como qualquer outro partido. Seja de extrema-esquerda, seja de extrema-direita, seja do centro-esquerda ou seja do centro-direita.

Que os dois partidos mais votados (de centro-direita e de centro-esquerda) não permitam o voo desenfreado de extremismos, em nome sabe-se lá de quê, porquê e para quê. A política é a arte do diálogo. Não é tempo para posições extremadas e oposições. 

É tempo de garantir uma qualquer estabilidade politica, pelo menos até 2026 (prazo do PRR). É tempo de definir um programa de estado entre os partidos que desde 1976, sempre governaram, através do voto popular, o destino da nação. 

E com todo o desenvolvimento e crescimento que decorreu nestes últimos 49 anos, a verdade é que as histórias são comuns aos partidos de centro-esquerda e de centro-direita, com mais ou menos maiorias, com mais ou menos acordos parlamentares, com mais ou menos dissoluções, com mais ou menos demissões,  com mais ou menos casos de justiça, com mais ou menos ex-isto ou ex-aquilo a saltarem de cadeiras em cadeiras.

Desde 1986, depois de Portugal aderir à então Comunidade Europeia, os cofres do estado português receberam 160 mil milhões de euros. Aos quais se acrescentam agora, os valores da bazuca europeia (45 mil milhões de euros). Em 40 anos, serão 295 mil milhões de euros!

Portugal precisa de um rumo, que não pode, nem deve, ser alterado consecutivamente por actos eleitorais precipitados por posições estremadas à boleia da eleição de um partido de extrema-direita. Estabeleçam-se a consensos. Firmem-se pontes de entendimento. E faça-se oposição quando a mesma tiver de ser feita e não, por uma questão de princípio ou de orientação.

Os portugueses “quando parece que votaram mal conclui-se, afinal, que votaram bem.” Acredito que os deputados eleitos e que perfazem uma maioria ao centro (esquerda e direita) honrarão o voto popular: entendam-se!




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