Partilho aqui o meu artigo de opinião no Jornal "Raio de Luz" de Fevereiro de 2024.

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Apesar da campanha eleitoral só se iniciar, de acordo com a lei, a partir do dia 25 de Fevereiro (terminando a 8 de Março) a verdade é que existe campanha eleitoral por todo o lado (a conhecida pré-campanha eleitoral). Nomeadamente nos debates televisivos que se iniciaram a 5 de Fevereiro e que se irão prolongar até dia 22. Os únicos que não se estreiam nestas andanças são André Ventura, Inês Sousa Real e Rui Tavares. Os restantes candidatos, excepto os líderes do PCP (CDU) e do PSD (AD), são deputados na Assembleia da República (sabendo-se que nem Os Verdes, nem o CDS, nem o PPM estão representados no Parlamento).

Os próximos quatro anos serão muitíssimo complicados. Ninguém, por mais boa vontade que tenha, conseguirá resolver de um dia para o outro (e muito menos em quatro anos de legislatura, perante a incerteza que paira na Europa e no mundo), os problemas na habitação, na saúde, na educação. Nem aceder às legítimas reivindicações das diferentes classes profissionais que compõem a administração pública e também, aceder às legítimas reivindicações de todo o sector privado que sustentam a economia nacional, tornando-nos mais ou menos competitivos, enquanto país.

Parece-me que, a esquerda dividida, até poderá ser uma estratégia bem delineada. Terão consciência que a próxima legislatura será exigente, com o dossier da TAP, a decisão do aeroporto, a construção do TGV. Mas também com o PRR, com os prazos a terminar já em 2026 (com, ao que parece, uma possibilidade de prorrogação do mesmo, a nível europeu). E depois, com matérias chave de futuro, como sejam o cumprimento das metas ambientais definidas (nomeadamente a neutralidade carbónica até 2045), o lítio, o hidrogénio, as centrais solares, as eólicas flutuantes.

Mas também com a incerteza das taxas de juro. Com o impacto da inflação. Com a continuidade das duas guerras (e que correm o risco de crescer exponencialmente). Com a adesão à NATO, de países do norte da Europa. Com a entrada da Ucrânia na União Europeia. Com a possibilidade real de Trump voltar à presidência norte-americana. Com a possibilidade (cada vez mais evidente) do parlamento europeu ser invadido pela extrema-direita. A próxima legislatura não será fácil.

E a esquerda dividida parece preferir ser oposição nos próximos quatro anos do que ser ou sustentar um Governo de esquerda, perante o cenário que acima descrevi. Por outro lado, a direita unida, parece confiante e acreditará que apesar do cenário complicado, o futuro sorri e as medidas que se propõem implementar (nomeadamente com a descida de IRC e IRS) transformarão Portugal numa economia atractiva e competitiva.

A campanha eleitoral anda na rua, com sondagens quase diárias que mostram as oscilações percentuais entre esquerda e direita. E o Presidente da República já veio dizer que só irá aceitar o Governo de quem for vencedor (pondo de lado possíveis maiorias parlamentares que visem chegar ao poder sem que para isso tenham sido mandatadas pelo voto popular). E diz mais: espera que o Governo que venha a sair destas legislativas possa governar “pelo menos um ano”.

Até porque, Marcelo Rebelo de Sousa já coloca a hipótese de ter de dissolver o Parlamento pela
terceira vez.

Ao eleitorado, a todos nós, caberá decidir se queremos um Governo mais capitalista ou mais social. Ou se o equilíbrio entre ambos será o mais sensato. O problema é que não se vislumbra um qualquer acordo de governação que, limando diferenças e estabelecendo uma visão de futuro, implementasse de facto uma estratégia nacional que resolvesse efectivamente os problemas na habitação, na saúde, na educação, na justiça, na segurança, na administração pública, nas infraestruturas, na economia, no ambiente, na agricultura, nas pescas, no ordenamento do território, nas alterações climáticas, nas energias renováveis,… Uma estratégia nacional que não mudasse a cada quatro anos ou, a cada dissolução do Parlamento (hipótese avançada por Marcelo Rebelo de Sousa).

E perante tudo o que já foi debatido (e que ainda irá ser), com o início oficial da campanha (e com a hipótese vinculada pelo Presidente da República de poder vir a dissolver o Parlamento que resultar do dia 10 de Março), resta ao eleitorado decidir a quem irá atribuir os 230 lugares de deputados que compõem a Assembleia da República (sabendo-se que Marcelo Rebelo de Sousa só aceitará o Governo de quem for vencedor).

Decidirá o eleitorado eleger um Governo que corre o risco de governar apenas durante um ano? Que pressão é esta, por parte de Marcelo Rebelo de Sousa, perante o voto popular? Quererá o Presidente da República uma maioria absoluta? E de quem, sabendo-se que mesmo com maioria absoluta, o Parlamento foi dissolvido? Ou quererá uma “geringonça” em torno do candidato/partido vencedor (seja de direita ou de esquerda), sabendo-se que o único Governo “geringonça” que existiu em Portugal (de acordo com o ESS – European Social Survey) foi o mais bem avaliado pelos portugueses (e sabendo-se igualmente que esse Governo “geringonça” não resultou do voto popular mas sim de maiorias parlamentares e que Marcelo Rebelo de Sousa diz não aceitar)? Ou seja, os portugueses ficaram mais satisfeitos com um Governo que não elegeram do que com governos que elegeram. Explicando melhor: em 2015, quem venceu as eleições foi o PSD-CDS. Mas como a maioria parlamentar era de esquerda, quem formou Governo foi o PS.

O que o Presidente da República vem dizer é que, só aceita o Governo de quem ganhar as eleições. Ou seja, num primeiro cenário: a AD vence as eleições mas a esquerda tem maioria parlamentar; Marcelo Rebelo de Sousa não irá aceitar um Governo de esquerda mas apenas, um Governo que tenha como Primeiro-Ministro o vencedor (Luís Montenegro). Segundo cenário: o PS vence as eleições mas a direita tem maioria parlamentar; Marcelo Rebelo de Sousa não irá aceitar um Governo de direita mas apenas, um Governo que tenha como Primeiro-Ministro o vencedor (Pedro Nuno Santos). Resta saber quem irá sustentar o Governo de um dos vencedores. Se o vencedor for a AD, terá o apoio da IL e provavelmente do PAN. Se o vencedor for o PS, terá o apoio do BE, do LIVRE, do PAN e também, como será óbvio, do PCP.

E o CHEGA? Apoiará alguém (sabendo-se que Luís Montenegro já afirmou que uma solução de Governo excluirá o CHEGA)? Ou fará cair um Governo de direita, aliando-se ao PS? E o PS, aceitará um aliado como o CHEGA para fazer cair o Parlamento e levar o país para novo acto eleitoral?

Direi que a pressão, se a direita vencer e excluir o CHEGA da governação, estará sobre o PS. Irá o PS, se não vencer, sustentar um governo de direita? Mas também direi que a pressão, se o PS vencer e não existir uma maioria parlamentar de esquerda, estará sobre o PSD (AD). Irá o PSD (AD), se não vencer, sustentar um governo de esquerda? Estará à vista uma coligação pós-eleitoral entre PS e PSD, tal como aconteceu em 1983 (sendo que a realidade do país de hoje não é sequer comparável com a crise da década de 80 do século passado)?

Portugal é o 5º país mais seguro do mundo. É o 33º país menos corrupto do mundo. É o 56º país mais feliz do mundo. Tem problemas? Tem. Muitos e variados. É o 6º país da União Europeia (UE) onde o salário médio é mais baixo. É o 3º país da UE com a população mais envelhecida. É o país da Europa com a maior taxa de emigração (sendo uma das maiores do mundo): 30% dos jovens portugueses emigraram.

É preciso votar. Não em demagogias, convicções, promessas fáceis, discursos inflamados, acusações e gritarias. Mas em consciência, perante propostas libertas de extremas e de extremismos.

Que a abstenção seja a maior derrotada no dia 10 de Março. As eleições não são no período estival nem coincidem com pontes ou feriados. Nem tão pouco com férias escolares. Bastam 10 minutos do Domingo, dia 10 de Março, para votar. 10 minutos.

É preciso votar. À esquerda ou à direita. São 10 minutos de um Domingo. É preciso votar.



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