284 MIL EUROS COMPRAM TERRENO QUE "VALE MUITOS MILHÕES DE EUROS"
Naquela que foi a reunião de Câmara extraordinária realizada ontem, dia 11 de Abril, que visava aprovar (entre outras) a prestação de contas de 2022 a remeter à Assembleia Municipal, os temas enumerados e abordados foram de uma riqueza tal que não podem passar incólumes. Há pelo menos cinco temas aos quais irei dedicar algumas considerações mas, permitam-me desde já referir uma situação que marca negativamente esta reunião:
Nenhum elemento do executivo municipal teve uma palavra para com a Presidente da Junta de Freguesia do Castelo. Nada. Lamentável. A Freguesia do Castelo é a maior freguesia do Concelho de Sesimbra e, a sua Presidente, enquanto representante dos seus fregueses, é conhecida e reconhecida por todos, por ser quem é. Foi graças às Presidentes de Junta, nomeadamente à Presidente da Junta de Freguesia do Castelo, que a CDU ganhou as últimas eleições autárquicas. O mínimo que se exigiria, seria num momento de perda e de dor, uma palavra de pesar por parte daqueles que mantiveram os seus lugares, à boleia de uma pessoa popular e querida da população. Bastaria uma palavra, uma frase.
Permitam-me também uma palavra sobre o quarto elemento da CDU (desculpem, o ex-líder da oposição, eleito pelo PS): não abriu a boca durante toda a reunião. Para mim, não foi uma surpresa. Foi apenas o consolidar de uma certeza.
E também agradecer a postura dos dois vereadores eleitos pelo PS (Argentina Marques e Miguel Fernandes) que, ao questionarem, possibilitaram o debate e o esclarecimento, culminando com algumas revelações (por parte dos eleitos pela CDU) surpreendentes.
Começo pois por uma das revelações do vereador responsável pelo pelouro das finanças, durante a apresentação da prestação de contas de 2022, relativamente à aquisição de imóveis e solos (face a uma das muitas dúvidas colocadas pelo vereador Miguel Fernandes, eleito pelo PS). Trasncrevo parcial e textualmente:
"(...) pois como sabe (...)"
Primeira pergunta: Sabe? Desde quando? Desde quando e como é que o vereador Miguel Fernandes sabe? Ou será que sabem todos? Continuemos:
"(...) pois como sabe, nós adquirimos recentemente um imóvel aqui, um terreno aqui em Sesimbra, dos mais importantes alguma vez adquiridos pelo Município, aqui a..... por 284 mil euros, se a memória não me atraiçoa, que vale muitos milhões de euros (...)"
Segunda pergunta: Sabe? Desde quando? Desde quando é que "nós adquirimos" um terreno por 284 mil euros sem que a Câmara tenha deliberado sobre essa aquisição? "Nós" significa quem? Quem autoriza ou não a compra de terrenos, é o executivo municipal, através de deliberação tomada em reunião de Câmara. Onde está a deliberação de Câmara que aprovou a aquisição de um terreno que é "dos mais importantes alguma vez adquiridos pelo Município"?
E qual é afinal o terreno que "nós adquirimos recentemente"? Transcrevo parcial e textualmente:
"(...) eu passo a citar qual é que é o terreno: é aquela encosta toda em frente ao estádio Vila Amália bem como o estacionamento todo com excepção de cerca de 800 metros, de um lote de 800 metros e que vai por trás inclusive do do edifício (...)"
O quê? Então "nós adquirimos recentemente" o terreno do estacionamento em frente ao campo de futebol, assim como toda a encosta a nascente, e a notícia é dada assim, por entre os pingos da chuva, numa reunião que visava deliberar sobre a prestação de contas de 2022 a remeter à Assembleia Municipal?
Ora o terreno do estacionamento em frente ao campo de futebol, assim como toda a encosta a nascente, corresponde à Fase 2 do Estudo de Ordenamento da Avenida da Liberdade. Significa portanto que a Autarquia é proprietária da Zona 1 (correspondente ao campo de futebol e onde foi prevista a construção do mono de 9 pisos), de parte da Zona 2 (que "nós adquirimos recentemente" e onde estaria prevista a construção de seis blocos de habitação e comércio) e, de parte da Zona 3 (correspondente ao antigo Ciclo e onde estaria prevista a construção de dois blocos habitacionais).
O terreno adquirido é de facto "dos mais importantes alguma vez adquiridos pelo Município". E sendo importante, pela liberdade que introduz naquela que deverá ser a nova solução de ordenamento da Avenida da Liberdade, e que, deixando de estar presa a hipotéticos direitos construtivos que seriam reclamados pelos proprietários do terreno, poderá e deverá culminar numa solução equilibrada e integrada na realidade de Sesimbra, dignificando a entrada na Vila sede de Concelho.
Promova-se um concurso público que vise a elaboração de um novo estudo de reordenamento da Avenida da Liberdade, sustentado num novo programa preliminar que defina aquelas que são as prioridades (entre outras): devolver o espaço público ao peão, promover uma ligação pedonal acessível entre o Jardim, os equipamentos e os espaços de comércio existentes, arborizar toda a Avenida e espaços vazios, implementar zonas de descanso, definir estacionamentos (nomeadamente em caves ou em silos), relocalizar o terminal rodoviário, refazer a faixa de rodagem da Avenida mantendo o campo de futebol na sua actual localização, anular o mono de 9 pisos, definir a implantação de novas construções habitacionais (cumprindo o definido pelo PDM, sendo que "espaço H5" não significa 5 pisos),... Um concurso público que fomente a implementação de novas ideias, mais sustentáveis, mais inovadoras, mais congregadoras de todo o espaço público, mais integradoras de todas as valências existentes ao longo da Avenida.
Numa altura em que a habitação está na ordem do dia, parece-me que com esta aquisição, estarão reunidas as premissas necessárias para promover de facto a construção de habitação. Haverá que definir um novo programa de intervenção naqueles que são, maioritariamente, terrenos camarários. E ao definir o programa e rever os critérios inerentes à habitação, e que vise a consolidação de habitação permanente (nomeadamente com rendas acessíveis), estará a ser cumprida a ARU e ORU e estarão satisfeitos os requisitos necessários ao financiamento a 100%, pelo PRR. O tempo urge! Haja estratégia! Haja dinâmica! Haja vontade!
E a solução passa também e uma vez mais, por abrir concursos públicos para a elaboração dos projectos de arquitectura (como fizeram por exemplo, as Câmaras de Almada e Setúbal, através do IRHU).
Existe um excedente orçamental superior a 9 milhões de euros. 9 milhões de euros!
Invista-se no reordenamento da Avenida da Liberdade que está prometido há mais de 17 anos!
Invista-se naquilo que é urgente e que pode resolver de vez, o despovoamento da Freguesia de Santiago.
E promova-se a divulgação e participação pública em todos estes processos. Porque Sesimbra não é do executivo municipal nem dos eleitos. Sesimbra é dos sesimbrenses.
E já agora, porque estão em causa a utilização de dinheiros públicos, o mínimo exigível é que os mesmos nos sejam explicados e mostrados. Porque gostamos de saber onde e como andam a ser gastos os nossos impostos. 284 mil euros foram gastos na aquisição de um terreno que é de facto "dos mais importantes alguma vez adquiridos pelo Município". Mas, para que o mesmo tenha sido adquirido, de onde foram retirados esses 284 mil euros? Melhor dizendo: o que deixou de ser feito para que este terreno fosse comprado por "nós"?
Depois da afirmação inicial "pois como sabe", aparentemente todos sabiam de facto. Ninguém contestou a afirmação nem a esclareceu. Esperemos que estas "surpresas" que surgiam como "novidades!" no mandato anterior, não estejam de volta.
Que aquela promessa de gestão "das pessoas para as pessoas" ainda esteja presente algures, no ex-líder da oposição eleito pelo PS.
Confesso que estou curiosa pela posição do PS na Assembleia Municipal. Será que os deputados municipais não deveriam ter sido ouvidos sobre os 284 mil euros que serviram para "nós adquirimos recentemente um imóvel aqui em Sesimbra" e "que vale muitos milhões de euros"?
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