O CHAIMITE

É uma viatura blindada de transporte de tropas com tracção 4x4, produzida em Portugal, que pode estar equipada com lança-foguetes, torres canhão com metralhadoras, morteiro, lançador duplo de misseis,…

Ficou famoso quando serviu de transporte às tropas de Salgueiro Maia, estacionando no Largo do Carmo onde, depois de umas rajadas de metralhadoras sobre o quartel do Carmo, o Presidente do Conselho Marcelo Caetano foi transportado (de Chaimite), até ao aeroporto, exilando-se no Brasil. 

Digamos que o Chaimite, sendo um elemento bélico, de guerra, ficou associado para sempre a uma revolução sem guerra e com cravos. 

Em 2024 comemoram-se os 50 anos do 25 de Abril e, o Município de Sesimbra decidiu iniciar as comemorações no passado dia 16 de Março, lembrando o golpe militar protagonizado pelo Regimento de Infantaria 5 das Caldas da Rainha e que, acabando derrotado, levou à prisão de cerca de 33 oficiais. E para iniciar as comemorações (que decorrerão durante um ano) o Município de Sesimbra colocou um Chaimite no Largo do Município, de frente para o edifício da Câmara, entalado entre o Pelourinho, uma árvore e um banco e rodeado por quatro mastros (ligados entre si com uma corda), com quatro bandeiras com a palavra estampada “Sesimbra”. 

Vem isto a propósito da última reunião de Câmara que decorreu na passada sexta-feira na sala polivalente da biblioteca, nomeadamente sobre um dos pontos da ordem de trabalhos que, já se sabe, foi aprovado por unanimidade sem perguntas ou qualquer tipo de questão. Da explicação prestada (que foi nenhuma) ficou a ideia de que o exército português teria emprestado o Chaimite ao Município de Sesimbra e que, para o fazer, foi necessário assinar um “Protocolo”. Ou seja, o exército português cedeu um Chaimite, conforme consta no ponto 12 das “deliberações diversas” da ordem de trabalhos (link – pág. 11) “para exposição no Concelho de Sesimbra”.

E a pergunta que se poderia pôr seria: e quanto tempo vai durar essa exposição no Largo do Município? É que numa terra de paz, de liberdade, estar um Chaimite, entre quatro mastros, de frente para o edifício da Câmara, não lembra a ninguém. Já toda a gente viu o Chaimite. Podem devolver. 

Acresce que, estando uma guerra sem fim na Europa e que nos afecta a todos, o que mais precisamos é de imagens de paz e não, de imagens de guerra. E como todos sabemos, a posição da CDU sobre a “operação militar” do “sol na terra”, é a paz. Não seria melhor tirar dali o Chaimite e devolvê-lo? Ou se a ideia é que o Chaimite acompanhe as comemorações durante um ano, levem-no do centro da Vila e guardem-no na Fonte de Sesimbra. E quando fizer falta, vão buscá-lo para mostrar não sei a quem nem porquê. Agora, um Chaimite por tempo indeterminado no Largo do Município? Poupem-nos. 

O pior é que, o exército português não cedeu provisoriamente o Chaimite. E aqui é que importa reflectir. Atente-se num dos parágrafos da deliberação unânime do executivo municipal:

(…) a Câmara Municipal de Sesimbra pretende erigir um monumento de homenagem ao 25 de Abril de 1974 e endereçou um ofício a Sua Excelência o General Chefe de Estado-Maior do Exército, solicitando a cedência de uma Chaimite, veículo militar de particular valor e significado. (…)

O quê? A Câmara pretende erigir um monumento de homenagem ao 25 de Abril de 1974 e pediu um Chaimite a “Sua Excelência o General Chefe de Estado-Maior do Exército”? Então mas Sesimbra não tem há anos, na entrada da Vila, um monumento de homenagem ao 25 de Abril de 1974 com dois cravos e uma corrente partida? É preciso outro? E a ideia é um Chaimite? Valha-nos Deus.

Atente-se na justificação: 

(…) mais de dezena e meia de municípios têm integradas chaimites em espaços públicos, monumentos e arte urbana. (…)

Nem sei que diga. Portugal tem 308 Municípios. Porque raio quererá Sesimbra constar na pequena lista de Municípios que tem um Chaimite em espaço público?

E o espaço público escolhido é o Largo do Município? Valha-nos Deus.

Até tenho duas sugestões: façam um referendo à população; levem o assunto a debate na Assembleia Municipal. Mas alguém quer ver um Chaimite no Largo do Município? Um Chaimite? Mas quem é que tem estas ideias peregrinas?

Com tantos símbolos de Abril, a ideia básica foi pedir um Chaimite para fazer um novo monumento ao 25 de Abril? Na única revolução do mundo que não culminou numa guerra civil nem na consolidação de um novo regime ditatorial, foram escolher um símbolo de guerra e chamam-lhe monumento?

A revolução fez-se com cravos e música!

Uma grande parte da população, são filhos do pós-25 de Abril. Nasceram, cresceram e vivem em paz. E não querem símbolos de guerra nem maquinaria bélica exposta em espaços públicos de convívio, de paz, de amizade, de socialização e liberdade. 

Se o monumento dos cravos, simbolizando a liberdade conquistada, já não chega, e a ideia é fazer outro, façam-no com um símbolo de paz e não, com um símbolo de guerra. Simples.

Um Chaimite? Por amor de Deus.

Sou completamente contra esta ideia peregrina de chamar ao Chaimite “monumento ao 25 de Abril”. Sou completamente contra esta ideia peregrina de colocar no Largo do Município um Chaimite. Sou completamente contra esta ideia peregrina de colocar, num outro qualquer espaço público do concelho, um Chaimite. 

Que linda imagem para a procissão do Nosso Senhor Jesus das Chagas. Sinceramente.

Celebremos a paz, a vida e a música! Deixem lá o Chaimite nos livros de história, no cinema e nos museus!.

Divulguem aquelas que foram manifestações poéticas, artísticas e musicais. Há 49 anos, no dia 29 Março, foram proibidas, no 1º. Encontro da Canção Portuguesa, canções como “Venham mais cinco” ou “A morte saiu à rua num dia assim”. Este sim, teria sido um bom dia para iniciar as comemorações de um dia que nos deu a liberdade, com canções de liberdade.

Agora, um Chaimite? Não lembra a ninguém.






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