O MAIOR ORÇAMENTO DE SEMPRE

Partilho aqui o meu artigo de opinião no Jornal "Raio de Luz", dia 31 de Janeiro de 2023.



Sesimbra terminou o ano de 2022 com a aprovação do Orçamento Municipal para 2023. Cerca de 77 milhões de euros fazem com que este seja o maior Orçamento de sempre. São cerca de 6 milhões e 400 mil euros por mês; 213 mil euros por dia; 8 mil e 900 euros por hora; 148 euros por minuto! É muito dinheiro. 

Importa dizer que o Orçamento apresenta também um Plano Plurianual de Investimentos (definido pelo executivo municipal) para os próximos cinco anos (ou seja, até 2027). Neste Plano Plurianual de Investimentos o executivo prevê que já em 2024 o orçamento municipal ascenda (em termos de receitas) aos 78 milhões de euros, começando a descer nos anos seguintes e prevendo cerca de 75 milhões de euros para 2027. O que poderá levar a concluir que a estratégia de desenvolvimento e crescimento concelhio que o executivo definiu até 2027, provocará um decréscimo nas receitas. 

Ou seja, não será até 2027, que a estratégia que estará definida relativamente à habitação, ao turismo, ao comércio e serviços, à captação de novas dinâmicas empresariais e tecnológicas, à repovoação da Vila sede de Concelho,… se irá concretizar e que faria subir as receitas, nomeadamente as receitas que resultariam dos impostos directos (e que correspondem a cerca de 40% do total do Orçamento: IMI, IMT, IUC e Derrama) mas também, as receitas resultantes das transferências directas do Estado (e que correspondem a cerca de 19% do total do Orçamento: Fundo de Equilíbrio Financeiro, Fundo Social Municipal, participação fixa no IRS e no IVA,…). E esta é uma visão preocupante: Sesimbra em vez de crescer nos próximos cinco anos, irá decrescer. 

Convém lembrar que o Orçamento de 2022 ascendeu a cerca de 64 milhões de euros e que, este acréscimo de receita para 2023 (na ordem dos 12.9 milhões de euros) se deve maioritariamente ao valor recebido pela Autarquia no âmbito do processo de transferência e delegação de competências nas áreas de acção social, educação e saúde (cerca de 10 milhões de euros). Quer isto dizer que, sem o montante relativo à transferência e delegação de competências, Sesimbra cresceu entre 2022 e 2023, cerca de 3%. 

E esta tímida tendência de crescimento, de acordo com a previsão do executivo, irá desaparecer a partir de 2024. O que será estranho, face ao conjunto de viabilidades aprovadas para a construção de empreendimentos turísticos e habitacionais que, sendo assim, não serão concretizados até 2027, uma vez que as receitas correntes não reflectem esse aumento de receita que seria de esperar. Assim como, no caso das receitas de capital, não estão previstas as receitas oriundas dos financiamentos do PRR para, por exemplo, a consolidação da Estratégia Local de Habitação (que ascende a um total superior a 49 milhões de euros a concretizar até 2028) ou, para a construção do novo Centro de Saúde na Quinta do Conde, orçado em cerca de 1 milhão e 400 mil euros e que terá de estar concretizado até 2025. 

A verdade é que o executivo municipal aprovou por unanimidade o orçamento para 2023. Importa relembrar que o executivo eleito pela CDU afirmou que o Orçamento concretizava e planeava grandes acções e investimentos, na “constante melhoria das condições do concelho e dos seus habitantes”. E o executivo eleito pelo PS afirmou que o orçamento era o resultado de uma participação activa do PS na sua elaboração e nas “tomadas de decisão/responsabilização nas grandes obras e investimentos” e que, tendo assumido “tempos e pelouros” responsabilizou-se “por uma postura de grande envolvência na governação, com uma posição constante, sem demagogias ou falsos populismos”. E por tudo isto (e mais algumas coisas) “seria completamente incoerente o PS não viabilizar o presente orçamento”. 

E quais são então as grandes acções e investimentos que o Orçamento para 2023 se propõe concretizar na senda da “constante melhoria das condições do concelho e dos seus habitantes”? 

Antes de mais, importará retirar desde logo dos cerca de 77 milhões o montante relativo à transferência e delegação de competências (dado que este montante é canalizado para o fim a que se destina e que agora é, competência da Câmara), e o montante destinado às despesas de pessoal (daqueles que, não sendo eleitos, dedicam a maior parte da sua vida ao serviço público). 

O maior orçamento de sempre fica reduzido a cerca de 33 milhões de euros. Importa também retirar a este montante, os montantes que resultam de obras em curso e que se prolongam durante o ano de 2023 (Escola Navegador Rodrigues Soromenho, Capela de São Sebastião, Museu no edifício da rua Aníbal Esmeriz, Bloco da Mata, Mata da Vila Amália, Unidade de Saúde de Sesimbra) e retirar também as verbas que resultam de financiamentos oriundos do PRR (a 100%) e de outros programas de financiamento (como o PEDU, o POSEUR ou o FEDER). 

Quer isto dizer que serão pouco mais de 25 milhões de euros que irão concretizar as grandes acções e investimentos previstas no Orçamento para 2023 e que conseguiram a proeza de reunir a aprovação unânime do executivo municipal em reunião de Câmara. Não vou, como é óbvio, descrever ponto por ponto o conjunto de verbas que estão destinadas a diferentes acções. Vou referir apenas 4 verbas que porventura merecem ser referenciadas:
  • 2 milhões e 300 mil euros destinam-se a festas e subsídios;
  • 1 milhão e 272 mil euros destina-se a reparações e pavimentações da miserável rede viária do concelho;
  • 1 milhão de euros destina-se a combustível (gasolina e gasóleo) para a frota automóvel da Autarquia;
  • 100 euros destinam-se à substituição de condutas de fibrocimento que ainda abastecem muitos dos lares sesimbrenses com água potável.
E referir unicamente aquela que deveria ser uma das grandes áreas de investimento: a rede de abastecimento de águas. Mais de 2 milhões e 500 mil metros cúbicos de água potável são perdidos, no Concelho de Sesimbra, “devido à antiguidade e degradação das redes em baixa”. O Concelho de Sesimbra tem cerca de 50 mil habitantes que gastarão por ano, cerca de 3 milhões e 850 mil metros cúbicos de água. A água que é perdida abasteceria mais de metade da população sesimbrense. E entre o orçamento de 2022 e o orçamento para 2023, o investimento na rede de abastecimento de águas do Concelho sobe apenas cerca de 300 mil euros. Com a agravante de que, a partir de 2024, o investimento será ainda menor fruto do decrescimento da receita prevista pelo executivo municipal. 

O Orçamento para 2023 não está consubstanciado numa qualquer visão estratégica de crescimento e desenvolvimento sustentável que aponte metas e defina prioridades por exemplo, relativamente ao ambiente, ao impacto das alterações climáticas, às energias renováveis,… 

É o maior orçamento de sempre que resumidamente se destina, apenas e só, a gerir o dia-a-dia, fazendo face apenas às despesas que já são conhecidas, descurando aquele que se avizinha ser um cenário difícil, com a subida das taxas de juro e os impactos da inflação nas contas de todos os portugueses. 

(Por exemplo, na Acção Social, retirando as verbas que resultam de financiamentos oriundos do PRR (a 100%; ou seja, a Autarquia não vai gastar um tostão dos cofres camarários) e retirando as verbas que resultam do processo de transferência e delegação de competências, a verba atribuída em 2023 é inferior à verba atribuída em 2022). 

Diz a CDU, utilizando uma frase de Sebastião da Gama, que é “pelo sonho é que vamos” e não, pela realidade do mundo. 

Termino com um facto: na Assembleia Municipal de Sesimbra o Orçamento para 2023 foi aprovado apenas com os votos favoráveis da bancada da CDU e do MSU. Dá que pensar.

(A imagem que ilustra este texto, foi captada do «youtube.com/cmsesimbra» e corresponde à reunião de Câmara que aprovou o Orçamento municipal para 2023)


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