ENTÃO E A SAÚDE EM SESIMBRA?

Hoje de manhã, as notícias televisivas mostravam em directo, a chegada dos Presidentes das Câmaras de Setúbal, Palmela e Sesimbra à porta do Ministério da Saúde, exigindo o agendamento de uma reunião com o Ministro da Saúde perante aquele que é o cenário conhecido do Hospital de São Bernardo em Setúbal. Quase em simultâneo, surgiam também reportagens em directo do Hospital de São Bernardo dando conta de que o serviço de pediatria estava a funcionar com normalidade.

Uma de duas conclusões se poderá tirar destas duas notícias em directo: ou se trata de uma coincidência fantástica ou, o Ministro da Saúde quando soube que três presidentes de Câmara estavam à porta do Ministério para exigir uma reunião sobre o Hospital de São Bernardo, tirou do bolso uma equipa de médicos e enfermeiros para abrir a unidade de pediatria.

A mim, o que me espanta, não é esta iniciativa dos três Presidentes de Câmara a exigir o normal funcionamento de um hospital que serve mais de 300 mil pessoas. A mim, o que me espanta, é a falta de iniciativa de um Presidente de Câmara em concreto, perante o fecho, desde o dia 9 de Dezembro, do serviço de Atendimento Complementar de Sesimbra.

E mais ainda me espanta o facto de, nem a Câmara, nem a Assembleia Municipal, nem as Juntas de Freguesia (em especial as de Santiago e do Castelo) se terem manifestado sobre o assunto.

Explicando melhor: o Agrupamento de Centros de Saúde da Arrábida (ACES-Arrábida) emitiu um comunicado transmitindo a decisão que tomou de encerrar o serviço de Atendimento Complementar de Sesimbra, nos dias úteis, a partir do dia 9 de Dezembro deste ano. Informou porém que, aos sábados, domingos e feriados, o Atendimento Complementar de Sesimbra funcionará entre as 11h e as 21h (e cito) “com o objectivo de garantir o acesso – em termos de doença aguda – maioritariamente à população inscrita no concelho de Sesimbra.

E porque é que o ACES-Arrábida tomou esta decisão? Por vários motivos:

  • Existem três Unidades de Saúde Familiar no Concelho de Sesimbra que funcionam entre as 8h e as 20h, e que garantem o acesso a cuidados de saúde a 76% da população inscrita no Concelho;
  • Existe uma Unidade de Cuidados de Saúde Personalizados na Quinta do Conde (UCSP-Quinta do Conde) a funcionar entre as 8h e as 18h, que garante o acesso a cuidados de saúde a mais de 5 mil utentes;
  • Existe também, um protocolo com a Santa Casa da Misericórdia de Sesimbra que garante a existência de consultas diárias a utentes sem médico de família e que estão inscritos na UCSP - Quinta do Conde;
  • Não existem, nas freguesias de Santiago e do Castelo, utentes inscritos sem médico de família (ou seja, toda a população inscrita, destas freguesias, tem médico de família);
  • Não existe, há mais de 3 meses, escala de médico para os dias úteis, no serviço de Atendimento Complementar de Sesimbra.

E porque o Concelho de Sesimbra é um privilegiado ao nível da saúde, assegurando a todos os seus habitantes serviços de saúde a tempo e horas, uma vez que e pasme-se, toda a população tem médico de família nas freguesias de Santiago e do Castelo, é encerrado o serviço de Atendimento Complementar de Sesimbra, a partir do dia 9 de Dezembro.

Mas, porque na Quinta do Conde existem mais de 6 mil utentes sem médico de família, diz o ACES-Arrábida que (e cito) “está a ser equacionada uma solução específica para este local, com o objectivo de garantir uma resposta a doença aguda a esta população em concreto.” O que descansará toda a gente.

Importa dizer o que é afinal um serviço de Atendimento Complementar. Cito:

É um serviço que se destina à prestação de cuidados de saúde em situações de doença aguda, que possam surgir fora do horário de funcionamento da Unidade de Saúde.”

E a quem se destina essa prestação de cuidados de saúde? A cidadãos inscritos nas Unidades de Saúde do Concelho e (cito) “a qualquer outro cidadão deslocado temporariamente que por motivo de doença aguda ou acidente, necessite de cuidados de saúde imediatos.

Resumindo: como o Concelho de Sesimbra tem um sistema de saúde exemplar, nenhum dos seus habitantes necessita de cuidados de saúde, “por motivo de doença aguda ou acidente” entre as oito da noite e as oito da manhã. Até porque, aos sábados, domingos e feriados, o Atendimento Complementar de Sesimbra funciona entre as 11h e as 21h (e cito) “com o objectivo de garantir o acesso – em termos de doença aguda – maioritariamente à população inscrita no concelho de Sesimbra” (realço a quem se destina este serviço: “maioritariamente à população inscrita no concelho de Sesimbra”).

Então mas ainda ninguém explicou ao ACES-Arrábida que mais de 50% das habitações existentes nas freguesias de Santiago e do Castelo não são de população residente? Ainda ninguém explicou ao ACES-Arrábida que a população sazonal, com segunda habitação no Concelho de Sesimbra, ultrapassa em muito, a população residente, nomeadamente na freguesia de Santiago? Mais: ainda ninguém explicou ao ACES-Arrábida que Sesimbra é um destino turístico?, onde os serviços de saúde têm de estar garantidos para todos aqueles que nos visitam e que, por motivos de doença aguda ou acidente, necessitam de cuidados de saúde imediatos e que, como é óbvio, não estão inscritos nas Unidades de Saúde do Concelho?

Das razões evocadas pelo ACES-Arrábida para encerrar o serviço de Atendimento Complementar em Sesimbra é que, não existe, há mais de 3 meses, escala de médico para os dias úteis. E a solução, perante essa falta (que na opinião do ACES-Arrábida não faz falta nenhuma) é encerrar o serviço. Quem ficar doente ou sofrer um acidente, vá para o Hospital de São Bernardo… ou para o Barreiro… ou Almada… ou atravesse a ponte e vá a um hospital de Lisboa. 

O melhor mesmo é toda a gente saber que não existem cuidados de saúde em Sesimbra. Esqueçam lá essa ideia de vir jantar a Sesimbra ou pernoitar. Se alguém ficar doente ou sofrer um acidente, não poderá dizer que não sabia que Sesimbra, um concelho metropolitano, destino turístico badalado aos sete ventos, que pela sua atractividade continua a atrair investimento privado para construir cada vez mais empreendimentos turísticos e camas em alojamentos turísticos, não tem um serviço de Atendimento Complementar que preste, em situação de doença aguda ou acidente, os necessários e urgentes cuidados de saúde.  

Em Sesimbra, a saúde só trata os inscritos. E desde que cumpram o horário em que podem ficar doentes. A partir daí, chamem os bombeiros, o INEM, e rezem ao Senhor das Chagas!

Sabendo-se que irão estar em Sesimbra uns milhares de pessoas (que não são residentes e por isso, não estão inscritas nas Unidades de Saúde do Concelho) pela passagem do ano, talvez não fosse mau avisar todos os hotéis, alojamentos, restaurantes, bares,… que não existem serviços de saúde disponíveis. 

E até avanço desde já com uma sugestão: um comunicado a toda a comunicação social nacional e a operadores turísticos, alertando para o facto de, na noite que também é conhecida pelos excessos e em que podem ocorrer doenças agudas ou acidentes, Sesimbra não irá prestar os necessários cuidados de saúde imediatos. Por decisão do ACES-Arrábida e aceite silenciosamente por todos os órgãos de soberania do poder local: Assembleia Municipal, Câmara Municipal, Assembleias de Freguesia e Juntas de Freguesia.

Que belo cartão-de-visita! 

Dizer que a comunicação transmitida pelo ACES-Arrábida é por tempo indeterminado. Ou seja, não tem fim à vista. Melhor explicando: para o ACES-Arrábida, o Concelho de Sesimbra não precisa de nenhum tipo de cuidados de saúde para além daqueles que já dispõe (excepto na Quinta do Conde “onde está a ser equacionada uma solução específica”). E porquê? Porque Sesimbra arrisca ser o único Concelho do país onde todos os utentes têm médico de família e serviços de saúde exemplares que respondem a todas as solicitações da população residente (desde que dentro do horário, claro está). 

Nem sei que diga.

Talvez terminar dizendo que deveria ser emitido um comunicado a toda a população residente no Concelho e inscrita nas respectivas Unidades de Saúde dizendo que, desde o passado dia 9 de Dezembro e por decisão do ACES-Arrábida e aceite silenciosamente por todos os órgãos de soberania do poder local, só podem ficar doentes ou a necessitar de cuidados médicos urgentes nos dias úteis, até às oito horas da noite e, aos sábados, domingos e feriados, até às nove horas da noite. Fora deste horário, não existem cuidados médicos em Sesimbra. 

E um outro comunicado a todos os residentes que, não estando inscritos nas Unidades de Saúde do Concelho, não têm direito a cuidados médicos de saúde. Excepto aos sábados, domingos e feriados, entre as 11h e as 21h, no Atendimento Complementar de Sesimbra que visa acudir “maioritariamente à população inscrita no concelho de Sesimbra” (não sei se vão distribuir algum tipo de senhas para os não inscritos que tenham a ousadia de ficar doentes e necessitarem de algum tipo de cuidado médico).

E ainda um outro comunicado a todos os hotéis e alojamentos existentes no Concelho dizendo que, Sesimbra não presta cuidados de saúde a turistas e visitantes que, estando deslocados temporariamente das suas áreas de residência, necessitem por motivo de doença aguda ou acidente, de cuidados de saúde imediatos.

Para que ninguém venha reclamar de que não sabia ou que não foi informado.

Valha-nos Deus. 

Pergunto-me quem, como e quando estará garantido o funcionamento do novo Centro de Saúde de Sesimbra quando hoje, ninguém consegue assegurar apenas uma escala de médico para os dias úteis, no serviço de Atendimento Complementar de Sesimbra. Para já não falar numa escala de médico para os sábados, domingos e feriados, a partir das nove horas da noite. 

(Nota: Saiu uma convocatória da "Comissão de Utentes dos Serviços Públicos do Concelho de Sesimbra" para uma concentração na USF de Sesimbra no próximo dia 16 de Dezembro, às 8 da manhã, com dois pontos: "Pela reabertura do Atendimento Complementar nos dias úteis" e, "Pela contratação de médicos e enfermeiros de família". Haja alguém que promova algum tipo de iniciativa quando o silêncio, por parte dos órgãos autárquicos, é absoluto).


FONTE DA IMAGEM: fotografia de um momento de reportagem transmitido na RTP3.


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