O MEU ARTIGO DE OPINIÃO NO JORNAL "RAIO DE LUZ"
Partilho aqui o meu artigo de opinião publicado no Jornal "Raio de Luz", dia 21 de Janeiro de 2022.
VILA DE SESIMBRA: TURISMO, HABITAÇÃO E COMÉRCIO
É sabido que um dos grandes problemas da Vila de Sesimbra (para além do estacionamento) é o seu crescente despovoamento. Serão muitas e variadas as razões que fomentaram (e fomentam) este abandono populacional de uma das mais belas vilas portuguesas e com mais de 800 anos de história. Aquele que era um centro urbano habitacional e residencial, com eixos comerciais perfeitamente definidos e onde o comércio local era rei, tem cada vez menos população residente, que lhe dava vida e alegria e, tem cada vez menos comércio tradicional, que lhe dava alma e memória.
A “piscosa Cizimbra” cantada por Camões é cada vez mais uma memória reflectida apenas no Museu Marítimo instalado na Fortaleza de Santiago onde (a par com os dados históricos que relatam a interacção/relacção do Rei D. Carlos com a Vila, os pescadores e a pesca), estarão registadas e catalogadas as memórias de outros tempos e a identidade daquela que começou por ser a Póvoa da Ribeira: terra de pescadores, de mar e de peixe. Paralelamente, fruto do progresso, assiste-se à descaracterização do aglomerado urbano, com intervenções que, quebrando com a imagem urbana existente, introduzem mudanças radicais naquela que é a sua identidade. Há décadas que é urgente inverter esta dinâmica de descaracterização e de despovoamento da Vila de Sesimbra e que em nada contribui para a atractividade, nomeadamente enquanto destino turístico e cada vez mais sazonal.
A necessidade de preservar valor e identidade na Vila de Sesimbra ficou patente naquele que foi o Plano de Salvaguarda da Vila de Sesimbra (1986), identificando edifícios emblemáticos no sentido de os salvaguardar. Essa preocupação transpareceu para o PDM de Sesimbra (1998) que, para o núcleo urbano da Vila estipula (entre outros) a proibição de demolir edifícios que apresentem valor arquitectónico. E se este “valor arquitectónico” poderia ser questionável e até dúbio enquanto critério limitador, em 2015, é delimitado, como Área de Reabilitação Urbana (ARU), o Núcleo Antigo da Vila de Sesimbra. Esta ARU veio definir dois grandes objectivos: a obrigatoriedade de conciliar a história com a modernização da vila e, aumentar a população residente com a preservação da sua vocação turística.
No trabalho realizado, são identificados (para além dos edifícios classificados, de interesse público e religiosos), edifícios que, não estando classificados, possuem interesse patrimonial/identitário e como tal devem ser preservados (como são exemplos os edifícios do “Caseiro”, do “Farol”, do “Albatroz”, ou da “Fábrica de Conserva dos Franceses”). São também identificados conjuntos de interesse arquitectónico e urbano (que também devem ser preservados) como são exemplos o “Bairro dos Pescadores” ou o “Bloco do Moinho”.
No entanto, para que fosse possível efectivar a reabilitação urbana do Núcleo Antigo da Vila de Sesimbra, em 2017 foi aprovada a ORU - Operação de Reabilitação Urbana (e a respetiva Estratégia), tendo como entidade gestora o Município. Nessa ORU foram estabelecidos três objectivos estratégicos gerais: promover e incrementar o sector do turismo e combater a sazonalidade; repovoar a Vila; incrementar e apoiar o desenvolvimento da economia local.
E mais uma vez surgem identificados os edifícios com valor patrimonial e identitário e os conjuntos de interesse arquitectónico e urbano. Não vou como é óbvio enumerar o conjunto de critérios e objectivos definidos. Vou apenas referir que a proposta de Revisão do PDM terá de assumir como prioridade estratégica para aquela que será a Unidade Territorial da “Concha de Sesimbra”, parâmetros que assegurem inequivocamente a concretização dos objectivos definidos pela ARU.
Mais: de acordo com a estratégia definida e para garantir o sucesso da operação, teriam de ter sido aprovadas normas técnicas (o que não aconteceu) a incluir no Regulamento Municipal de Edificação e Urbanização (ou num Regulamento Municipal específico para a ARU), destinadas a “regular os aspetos morfológicos e estéticos, a que devem obedecer as intervenções, bem como à identificação dos elementos arquitetónicos a preservar nas ações reabilitadoras dos edifícios e do conjunto urbano”.
O ano de 2022 é por isso de grandiosa importância para aquele que será o futuro da Vila de Sesimbra e do Concelho. Refiro-me não apenas aos projectos que se esperam venham a ser financiados através do PRR (e de outros fundos europeus e nacionais), mas também à imperiosidade de concluir e aprovar a proposta de Revisão do PDM de Sesimbra até 31 de Dezembro. E consequentemente, rever e aprovar o Regulamento Municipal de Edificação e Urbanização adequado à proposta de Revisão do PDM e em consonância com a Estratégia definida pela ORU.
Apenas referir que, desde 2017, está definida a obrigatoriedade de constituir uma equipa de trabalho (municipal) com o objectivo especifico de gerir a reabilitação urbana do Núcleo Antigo da Vila de Sesimbra, devendo (entre outros) elaborar relatórios (de monitorização anual e de avaliação da execução da operação) e submeter os mesmos, para apreciação, à Assembleia Municipal, a cada 5 anos (o que ocorrerá em Outubro de 2022). Quer isto dizer que a Assembleia Municipal, para além da proposta de Revisão do PDM, irá apreciar também os relatórios anuais que consubstanciam as obras de reabilitação realizadas em edifícios identificados como de interesse patrimonial e identitário da Vila de Sesimbra.
Ao ler algumas das regras definidas pela ARU, como por exemplo aquela que refere a necessidade de manter os usos comerciais existentes nos pisos térreos, vedando a sua alteração para outros usos (como sejam habitação ou garagens) para que se mantenha o equilíbrio entre habitação e comércio; ou aquela outra que refere a possibilidade de as reabilitações fundirem fogos existentes (e diminutos) tendo como objectivo fomentar o aumento de fogos familiares de habitação permanente (T2, T3 e T4) e não de T0 e T1 que apenas fomentam o uso turístico e de segunda habitação, confesso que estou curiosa!
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