“A AVENIDA DO FAST-FOOD” - SESIMBRA

Em pleno século XXI, a braços com os problemas de obesidade que afectam a população mundial e em especial as crianças, em que se recomenda uma dieta mediterrânea (em detrimento da comida de plástico), introduzindo novos hábitos alimentares com mais fruta e vegetais e com menos carne e gorduras saturadas, eis que Sesimbra, depois de ter resistido durante anos (e estoicamente) à implementação deste tipo de estabelecimentos, regozija, congratula-se, festeja, respira de alívio e com entusiasmo, com o facto de Sesimbra passar a ter (fruto de deliberações sucessivas deste último mandato) não de um mas de dois estabelecimentos de fast-food. E é de tal maneira um feito que até um dos estabelecimentos (felizmente e depois de conversações que demoraram anos) vai fazer por sua conta aquela que foi apelidada como a “Avenida do Fast-Food”. Absolutamente fantástico. Até tenho alguma dificuldade em escrever o que quer que seja sobre esta matéria.

Talvez transcrever textualmente as palavras da última reunião de Câmara de Julho.2021: Nós forçámos nas Infraestruturas de Portugal a construção de um passeio entre as duas unidades. E que mesmo assim as Infraestruturas de Portugal torceram o nariz. Porque dizem que aquilo é uma via principal portanto nem sequer devia haver passeio.

Nós forçámos nas Infraestruturas de Portugal” a construção de um passeio ao longo de um troço da Estrada Nacional 378, perigoso, de dupla faixa de rodagem e com acessos automóveis às bombas de gasolina. E “as Infraestruturas de Portugal torceram o nariz.” Porque terá sido? Talvez tenham torcido o nariz porque, numa Estrada Nacional, não é suposto existirem passeios nem percursos pedonais. Porque uma Estrada Nacional é uma via principal de tráfego ligeiro e pesado, perigosa e movimentada. A última coisa que precisa é de pessoas a pé, para lá e para cá.

A menos que a Estrada Nacional atravesse uma zona urbana consolidada (como é o caso por exemplo, da Cotovia) e aí sim, o trânsito é regrado, avisado, sinalizado, face à presença de pessoas, de atravessamentos imprevisíveis de via, de estacionamentos desregrados, de acessos a comércios e serviços e até, residenciais. Mas, curiosamente, a Câmara recusou a descentralização de competências relativamente às Estradas Nacionais e nomeadamente sobre os troços que atravessam centros urbanos (“nós como se sabe recusámos em 2019, 2020; 2021 entram todas em vigor”), o que lhe permitiria regrar o espaço público, nomeadamente através da definição de percursos pedonais (passeios), como aliás veio a ser concretizado (na Cotovia) no âmbito do PAMUS e que, as Infraestruturas de Portugal autorizaram. Porque terá sido? Terão as Infraestruturas de Portugal um peso e duas medidas? Não me parece. Porque uma coisa é definir um percurso pedonal seguro ao longo de uma área urbana consolidada cuja via que a atravessa é uma Estrada Nacional. Outra coisa é construir um percurso pedonal perigoso ao longo de uma Estrada Nacional, que não atravessa uma área urbana consolidada (no troço em causa não existe comércio nem habitação). 

Se por unanimidade, a Câmara aprovou os dois estabelecimentos de fast-food, o que deveria ter assegurado seriam acessos alternativos, que permitissem o acesso pedonal distante da Estrada Nacional. Por exemplo, de acordo com o definido pelo PDM (sabendo-se que “não há um período de nojo entre o início do procedimento da Revisão e a publicação do novo PDM ou PDM revisto. Portanto mantêm-se as regras do que estão, do que está em vigor…” ), o estabelecimento que está a ser construído naquele morro que teve em tempos, uma mancha de pinheiros mansos, deveria isso sim, ter consolidado a cedência para domínio público (com a  execução parcial) da via N3c (com mais de 20m de perfil) que irá ligar a Fonte de Sesimbra à Charneca da Cotovia, anulando o tráfego intenso e perigoso da estreita Rua da Charneca transformando-a numa via secundária segura, de acesso local, habitacional e pedonal.

Já o outro estabelecimento (com acesso pela rotunda do Continente), deveria isso sim, ter privilegiado o acesso existente paralelo à Estrada Nacional (e que irá ligar àquela que será uma via N3b que entroncará com a via N1 que corresponde ao tão falado anel de ligação entre a Maçã – Estrada dos Almocreves – e o Porto de Abrigo) desviando mais uma vez o peão e o acesso automóvel de um troço da Estrada Nacional que, de acordo com PDM (outra vez) atravessa uma área de comércio e serviços que necessita e cito “de grandes espaços e boa acessibilidade”. Acresce que este troço de via existente a nascente da estrada nacional, (sem nome), liga os dois estabelecimentos de fast-food, e com a segurança necessária para a constituição de um acesso pedonal.

Voltemos às palavras da última reunião de Câmara de Julho.2021: A dificuldade em garantir as condições de acessibilidade, mobilidade e segurança aos peões naquele que é um troço, embora esteja na estrada nacional e como todos sabemos é um troço muito frequentado pelas pessoas que vão às grandes superfícies, o Continente e a outros supermercados, e agora obviamente com a instalação destes dois serviços o fluxo de peões e pessoas, de transeuntes, vai ser muito maior, calculamos nós.”

Fantástico. E a solução passa por construir um passeio, num troço com cerca de 500m, em cima da Estrada Nacional que será, nos termos definidos, uma via de acesso a espaços de serviços e comércio com necessidade “de grandes espaços e boa acessibilidade”. Ficámos a saber que “as Infraestruturas de Portugal torceram o nariz. Porque dizem que aquilo é uma via principal portanto nem sequer devia haver passeio.” Pergunto-me o que irá acontecer quando estas vias vierem de facto, à posse da Câmara (no âmbito da descentralização de competências). Atente-se na dificuldade sentida para aprovar este passeio: “com a Infraestruturas de Portugal é uma luta de tal forma grande que as obras demoram um ano, um ano e meio, e muitas vezes a concretização é puxada quase a ferros.”

Não admira. Digo eu que não percebo nada de nada de estradas nacionais. A verdade é que as Infraestruturas de Portugal aprovaram o passeio. E é exactamente sobre o passeio (cuja imagem global ilustra este post) que irei dedicar algumas palavras:

  • O passeio inicia-se no morro que teve em tempos, uma mancha de pinheiros mansos e, termina na rotunda do Continente;
  • Aparentemente, a berma da estrada (fundamental numa via como esta para uma qualquer paragem de emergência) será transformada em passeio para peões (desconhecendo-se a largura do mesmo);
  • Não é identificada a bomba de gasolina nem os acessos (entrada e saída) da mesma;
  • Não é demarcado um corredor de segurança (para o peão) nas zonas de acesso à bomba de gasolina);
  • Não se percebe onde estará localizado o passeio no troço da estrada nacional que corresponde à bomba de gasolina; 
  • Não se identificam balizadores de trânsito que assegurem a segurança do peão e também, da faixa de rodagem.

Pasme-se com as explicações prestadas na última reunião de Câmara de Julho.2021:

Eu posso-vos dizer isto com as maiores das frontalidades: a nossa proposta à, às Infraestruturas de Portugal foi até reduzir na faixa de rodagem do lado do Continente, reduzir uma faixa de rodagem. Não faz sentido aquelas duas faixas de rodagem num troço tão pequeno. E no lado, no lado das das do ponto de combustível tem também aquela faixa apenas para acesso àquela zona industrial e ao posto de combustível, é uma faixa de desaceleração e de entrada depois na outra. Até porque a dimensão daquelas duas rotundas, aquelas duas rotundas que que que limitam aquele troço de duas faixas, pá não são duas rotundas para duas faixas. Aquilo é uma coisa que na altura foi exigida pela, pelas Infraestruturas de Portugal, quando o Continente fez ali a… fez ali a… a construção do da sua superfície comercial, mas que não faz sentido nenhum. E não autorizaram. Não autorizaram. Porque a nossa solução era eliminar uma faixa de rodagem, criar uma zona pedonal numa das faixas de rodagem da zona mais a norte, portanto na zona do Continente, que seria um passeio com uma dimensão muito maior, muito mais fluido e que seria uma zona de abrandamento também.

Nem sei que diga. “Não faz sentido aquelas duas faixas de rodagem num troço tão pequeno.” Não só faz sentido como são fundamentais. Porquê? Porque a ser executado o anel de ligação entre o Porto de Abrigo e a Maçã (Estrada dos Almocreves) e, consolidado o perfil previsto para a Estrada da Mata de Sesimbra, será necessária uma via de abrandamento que redireccione o trânsito, em segurança, para o espaço urbano residencial. O que aconteceu naquele “troço tão pequeno” foi o facto de o mesmo ter sido executado primeiro, ao invés do tão famoso anel de ligação entre o Porto de Abrigo e a Maçã e, do perfil previsto para a Estrada da Mata de Sesimbra.

(Lembrar que estas vias – Estrada da Mata e anel de ligação entre o Porto de Abrigo e a Maçã - terão um perfil de 20m, com quatro faixas de rodagem; é fundamental não só a existência das rotundas como as faixas de desaceleração e de acesso aos serviços e comércios e que, simultaneamente promovam a fluidez de trânsito no perímetro urbano consolidado. Felizmente (digo eu) que as Infraestruturas de Portugal e cito: “Não autorizaram. Porque a nossa solução era eliminar uma faixa de rodagem, criar uma zona pedonal numa das faixas de rodagem da zona mais a norte, portanto na zona do Continente, que seria um passeio com uma dimensão muito maior, muito mais fluido e que seria uma zona de abrandamento também.”)

Valha-nos Deus. Pergunto-me novamente sobre o que irá acontecer quando a gestão das estradas nacionais for apenas da competência da Câmara. E reparem, aparentemente, o problema de mobilidade, acessibilidade e segurança dos peões só se verifica naquele troço de cerca de 500m. 

Volto ao título deste post: “a Avenida do Fast-Food” resume-se a 500m. Os acessos pedonais em segurança, por exemplo entre aqueles que são o público-alvo deste tipo de estabelecimentos (jovens em idade escolar), só se revelam importantes aqui, exactamente aqui neste troço. Como é que das escolas se acede à “Avenida do Fast-Food” e em que condições de segurança a mesma acontecerá, isso para já, não interessa nada. Até porque o sistema educativo e a comunidade escolar está apostada em alterar hábitos alimentares dos jovens, promovendo uma alimentação saudável e regrada, com menos carne e gorduras saturadas. E os pais em casa, também promovem uma alimentação saudável regrada pela dieta mediterrânea. Por isso, não há qualquer tipo de questão sobre esta matéria. Os jovens deslocar-se-ão em segurança e se quiserem, naqueles 500m, podem ir a pé e numa aparente segurança. 

Termino com um dado preocupante: de acordo com os dados do COSI (Childhood Obesity Surveillance Initiative), em Portugal “40% dos adolescentes bebe refrigerantes diariamente, mais de metade tem um consumo de horto-frutícolas abaixo do recomendável e mais de 20% consome açúcar acima dos níveis recomendados.

Talvez seja, o que vou dizer a seguir, a justificação para a boa disposição, por parte do executivo da Câmara Municipal, sobre a consolidação desta “Avenida do Fast-Food”: se a alimentação é importante, a diminuição do exercício físico é determinante. Ou seja, por um lado ter-se-á comida de plástico. Mas por outro, estará a ser promovido o exercício físico para lá chegar. E carregado de adrenalina: imaginem o percurso a pé, entre as escolas de Sampaio até chegar a esta “Avenida do Fast-Food.” Uma verdadeira aventura! 

O problema será apenas para todos aqueles que se deslocarem da Vila de Sesimbra. Apanham um autocarro e saem na paragem de transportes públicos, mesmo à porta dos estabelecimentos. Sem exercício físico e sem utilizarem tão grandiosa obra. 

E já agora, para quando a colocação da respectiva placa toponímica com o nome “Avenida do Fast-Food”?  

É um troço muito frequentado pelas pessoas que vão às grandes superfícies, o Continente e a outros supermercados.” A sério? Sempre pensei que “as pessoas que vão (a pé) às grandes superfícies, o Continente e a outros supermercados”, utilizassem maioritariamente, o outro lado da via. Para além de que para aceder ao Continente, deveria ser promovido (isso sim) o acesso pedonal através da via existente a poente do mesmo (Rua do Guarda Mor) na direcção do Casal de São Brás, entrando depois, em segurança, no espaço urbano consolidado. 

Mas esta, mais uma vez, é só a minha opinião. São os políticos eleitos os responsáveis pela segurança, acessibilidade e mobilidade dos munícipes do Concelho. E com toda a certeza, terão uma visão estratégica sobre esta matéria, da qual só será visível (ainda?), a “Avenida do Fast-Food”.



Comentários

  1. Esta foi a minha bandeira desde a primeira hora.
    Subscrevo tudo o que li. Dou- lhe os meus parabens ,pela primeira vez alguem me acompanha nas minhas criticas.
    Estou consigo a coligacao onde estou inserido infelizmente ,criticou- me mesmo assim nao me calei porque sou um Professor responsavel e independente .
    Conte comigo.

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