QUERUBIM LAPA E SESIMBRA
A arquitectura. A arte. O artista. O arquitecto. O mestre coordenador e aglutinador de todas as artes. Já foi assim a arquitectura e o arquitecto. No tempo em que o cliente pretendia, acima de tudo, uma obra de arte. Completa. Integrada. Portadora de beleza e sensibilidade.
Depois, bem depois o mundo avançou e a arquitectura transformou-se apenas numa ferramenta para responder às necessidades habitacionais, especulativas e de negócio. E neste novo conceito, não há tempo nem dinheiro para “artes” e “artistas”. O tempo é calibrado com orçamentos, estudos de mercado, custos e mais-valias. De fora ficam os “delírios do criador”, que, por serem um acto criativo, são descartados e alterados. Porque já ninguém se lembra que a “arquitectura” é a primeira das artes. E como qualquer outra arte, não pode ser alterada conforme o gosto ou os objectivos de determinado público. O problema é que a arte “arquitectura” antes de ter um público, tem um cliente. E é esse cliente que define as regras, alterando, anulando, substituindo… mais ao gosto do mercado e da sua algibeira
E a construção de uma casa, que é para grande parte da população, o seu maior feito, despesa e responsabilidade, é desprovida de qualquer tipo de identidade. Isto é, a casa é só mais uma, igual a tantas outras, sem nada que a marque. Sem nenhum espaço pensado para aquela família, aquela pessoa, aquele cliente. Porque não há tempo para isso. Porque a casa não sei de quem é muito linda, porque aquele material é muito bom, porque é melhor fazer como sempre se fez, porque é melhor não alterar o que já se faz desde sempre, porque…
Mas, naquele tempo (como diria Saramago 😊) antes deste tempo, o arquitecto integrava na sua obra as outras formas de arte. Para que o edificado adquirisse uma alma própria, indelével e inigualável. E o cliente, sentia-se especial. Por ter naquilo que era seu, a marca de tão diferentes mãos artísticas, perfeitamente harmoniosas e belas, respeitando a sua vontade e a sua identidade. E daquele tempo, são muitas as obras de arte que marcam as obras arquitectónicas e que, neste tempo, continuam a atrair atenções e exposições.
E lembrei-me de Querubim Lapa, um dos mais importantes ceramistas portugueses com obra espalhada por inúmeros espaços públicos e privados. E lembrei-me da Mexicana e da antiga Casa da Sorte no Chiado. E daquela cozinha de uma casa particular, com um jogo de imagens, olhares e gestos, de peixes, aves e legumes, absolutamente incríveis.
E lembrei-me de Querubim Lapa em Sesimbra. Naquela que será porventura a maior colecção de placas cerâmicas (no mesmo edifício) daquele artista. São mais de 200 placas com tamanhos e formas diferentes, com rostos, aves e peixes. Num mar de cor e movimento que marcam paredes, varandas e até, os puxadores das portas.
Por todos os motivos e mais alguns, o Hotel do Mar é a obra de arte da arquitectura sesimbrense e uma das maiores obras da arquitectura portuguesa. Com centenas de obras de outras artes.
À imagem daquelas escolhas que a revista britânica MONOCLE elege como atrações a serem visitadas em determinado ano (por exemplo, o Hotel Ritz em 2018), eu, elejo o Hotel do Mar como atracção nacional que deve ser visitada em 2020
E acrescento, qualquer sesimbrense deve pelo menos uma vez na vida, tomar um café no bar do Hotel do Mar. E ficar atento à arte que o rodeia! Porque não é todos os dias que se entra num espaço com mais de 200 peças de um dos maiores ceramistas nacionais. E claro, com máquina fotográfica 😊
Partilho aqui uma das fotografias que tirei a um dos puxadores de porta.
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