ESPECIALISTAS E POLÍTICOS
E pela 6ª. vez no Infarmed, especialistas, políticos, Presidente da República e governo, reuniram-se. Com uma diferença: esta foi a primeira reunião depois do fim do estado de emergência e visou analisar o desconfinamento e definir uma nova etapa. Em especial depois de conhecidos os valores relativos às semanas que se seguirão aos dias 18 Maio e 1 de Junho.
E os especialistas apresentaram dados, projecções, cenários, valores para o famoso valor de “R” e medidas que deverão ser adoptadas e equacionadas para que a linha continue achatada e os serviços de saúde não bloqueiem.
Sabendo-se que o nosso Primeiro-Ministro já disse que, se tiver de recuar nalguma das medidas apontadas, irá recuar.
Comecei a pensar nesta coisa dos políticos ouvirem, aceitarem e acatarem as opiniões dos especialistas. Algo inédito no país e no mundo. Desde quando é que um especialista decide uma posição política? Desde que este vírus nos invadiu por todo o lado. Não me lembro, em mais nenhum outro momento, que os políticos ouvissem e decidissem unanimemente de acordo com a opinião dos especialistas. E neste unanimemente entenda-se todos os políticos e forças políticas de esquerda e de direita.
E quem são os especialistas sobre o COVID? Médicos, biólogos, bioquímicos, alergologistas, cientistas, imunologistas, epidemiologistas…. São aqueles que têm, de facto, conhecimento sobre a matéria. E que político teria a coragem ou ousadia, de perante factos e projecções e cenários, contrariar essa informação? Só me lembro de dois: Trump e Bolsonaro (com os resultados que todos conhecemos).
E é graças a esta confiança política nos especialistas que Portugal já é apontado como um país exemplar no combate ao vírus. Que bom seria que esta confiança política trespassasse como exemplo para outras áreas, também elas com especialistas. Seriamos com toda a certeza um país, um mundo diferente.
Por exemplo, se os políticos ouvissem unanimemente os ambientalistas, também eles especialistas, provavelmente o planeta estaria menos poluído e muito mais sustentável.
Se os políticos ouvissem unanimemente as organizações humanitárias, também elas compostas por especialistas, provavelmente o planeta teria muito menos fome e miséria.
Se os políticos ouvissem unanimemente a ONU, também ela composta por especialistas, provavelmente a humanidade seria humana.
Se os políticos ouvissem unanimemente a UNICEF, também ela composta por especialistas, provavelmente o planeta não assistiria ao cenário de 6 mil (6 MIL) crianças que morrerão por dia nos próximos 6 meses (ou sejam, 1 milhão e 200 mil crianças morrerão em seis meses), por força da pandemia que irá atingir as comunidades mais pobres do planeta.
Se os políticos ouvissem unanimemente o desespero daqueles que têm menos, que vivem em condições miseráveis e inimagináveis, sem água potável, sem rede de esgotos, sem electricidade, sem internet, sem uma casa, sem comida, sem perspectiva de futuro (e que, neste cenário, são verdadeiros especialistas da sobrevivência), provavelmente o planeta não assistiria à falta de tudo (sistema de saúde, máscaras, higienização, ventiladores,…) numa pandemia como esta. Eram necessárias mais Fundações que, sem qualquer tipo de interesse ou perspectiva de lucro, compram ventiladores e doam, oferecem, dão, aos países mais pobres, numa réstia de esperança, de sobrevivência, de futuro.
Países pobres que não conseguem competir no mercado mundial, nomeadamente na aquisição de assistência médica e respectivos equipamentos, no caso, os caríssimos ventiladores. E que têm dividas externas altíssimas, uma vez que o resto do mundo, os chamados países ricos, investem naqueles, explorando recursos naturais e oportunidades de negócio que visam, em primeiro lugar, gerar riqueza para quem investe. E lembro aqui uma notícia que ouvi ontem: África pondera entre pagar dívida ou, combater a pandemia. Fantástico. E a humanidade dos países ricos, prefere o dinheiro. Porque uma coisa é a dívida, outra coisa é a pandemia. E como são coisas diferentes, têm de ser tratadas diferentemente.
Enfim. Já cansa tanta humanidade monetária. Dizem que depois disto tudo passar, seremos todos pessoas diferentes. Mais humanas. Não sei de chore ou se ria. Basta ver as posições da Europa e do BCE e dos políticos e da política, para ajudar os seus pares. Para ajudar os países que sustentam a própria Comunidade Europeia. Ajudar? Sim, mas. Esperemos pelas consequências do “mas” nas dívidas externas, nos PIB’s, na crise, na economia, no emprego, nas pessoas, na humanidade europeia e mundial.
É preciso respirar. “Vai tudo ficar bem”. Quero acreditar que sim.
Porque seremos todos pessoas diferentes, dizem. E se sairmos de facto, desta pandemia, pessoas diferentes, uma pergunta completamente descabida:
Será que os políticos vão passar a ouvir unanimemente os especialistas das diferentes áreas profissionais? E passarão a aceitar e a decidir de acordo com essa análise dos diferentes especialistas? Não me parece. Até porque todos os políticos sabem falar de tudo e sobre tudo. Seja economia, finanças, direito constitucional, saúde, educação, turismo, habitação, planeamento urbano, infraestruturas, agricultura, pesca… e até futebol!
E o que é que interessa a análise de alguém que tem a formação, o conhecimento e a experiência em determinada matéria? Nada. Absolutamente nada. Talvez isto explique muitas das decisões políticas que são tomadas apenas com base em opiniões que nada têm de “especialista”.
Seremos todos pessoas diferentes, dizem. Com verdades absolutas que se irão manter: políticos que são formados em direito, economia,… mas que decidem sobre educação, saúde, habitação, planeamento urbano, infraestruturas... E os “especialistas” que ouvem serão também eles políticos (do mesmo partido ou até familiares), assessores, adjuntos e secretários e que, em muitos casos, para além de não terem formação, conhecimento e experiência sobre determinada matéria, nunca desempenhariam um papel relevante, nomeadamente na tomada de decisões políticas e “especiais” (de especialista 😊).
Seremos todos pessoas diferentes, dizem. E continuaremos a eleger democrática e livremente os políticos que decidem o nosso futuro e que ouvem os secretários e os assessores “especialistas”. E talvez esta situação ridícula entre os políticos, os partidos políticos, o governo, o Primeiro-Ministro, o Presidente da República, o Centeno, o Novo Banco, os 850 milhões de euros, a auditoria, o lugar de Governador no BdP, o orçamento rectificativo, o combate à pandemia e a crise expectável, não sejam mais do que manobras políticas com objectivos eleitorais que se concretizarão já no próximo ano.
Haverá que lembrar as palavras de ontem do nosso Presidente da República: deixar para trás os interesses pessoais em favor dos interesses colectivos.
Quero acreditar que sim. Porque, depois desta pandemia, seremos todos pessoas diferentes.
FONTE DA IMAGEM: freepik.com
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