ERA UMA VEZ UM MINISTRO HOLANDÊS...

Há exactamente 35 anos, o então ministro das finanças Hernâni Lopes, regressava de Bruxelas com um acordo, depois de 8 anos de negociação, para que Portugal entrasse na CEE. Acordo esse que viria a ser assinado nos claustros dos Jerónimos, (numa cerimónia solene) e que entraria em vigor no dia 1 de janeiro do ano seguinte (1986). 

Nesse Tratado de Adesão de Portugal à CEE, era traçada uma nova orientação para a economia portuguesa a médio e longo prazo, prevendo períodos de transição para a agricultura e indústria, meios financeiros de apoio (entre os quais 7 milhões de contos que a CEE atribuía a Portugal para um projecto de desenvolvimento regional) e, acesso da concorrência comunitária ao mercado interno português. 

Há exactamente 35 anos Portugal entrou na CEE e a CEE entrou em Portugal. O chamado mercado livre desta aldeia global em que a Europa e o mundo se transformaram. Lembro-me de ver os noticiários da época com imagens de tractores em terrenos agrícolas e com a legenda: Portugal entrou na CEE.

Aparentemente, tudo continuava na mesma. Excepto na economia e nas trocas comerciais. Passaríamos a cumprir as metas europeias em assuntos tão diferentes como a pesca ou agricultura. Sempre com uma tabela financeira associada, claro está. Porque CEE era só uma sigla para uma Comunidade Económica Europeia. 

É importante lembrar que a CEE foi criada em 1957 com a finalidade de estabelecer um mercado comum europeu. Ou seja, não importava onde era fabricado ou produzido determinado produto. Bastaria que fosse na CEE e os direitos e deveres eram iguais em qualquer um dos estados membros (não sei se lembram que começaram a aparecer etiquetas de produtos que, em vez de dizerem “made in Portugal” passaram a dizer “made in CEE”). 

Foram seis os países que criaram tão ambiciosa comunidade económica (França, Itália, Alemanha, Bélgica, Holanda e Luxemburgo), com a assinatura de um Tratado (Roma-1957) que estabeleceu um mercado comum com impostos externos comuns, politicas conjuntas para a agricultura, politicas comuns para o movimento de mão-de-obra e para os transportes e, um conjunto de instituições comuns tendo em vista o desenvolvimento económico do “grupo dos seis”. 

A Comunidade foi crescendo economicamente e, com o Tratado de Bruxelas (1967) as instituições comuns criadas pela CEE tendo em vista o desenvolvimento económico da própria CEE, fundiram-se com duas Comunidades: a Comunidade Europeia da Energia Atómica (conhecida como EURATOM) e, a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (CECA). E o “grupo dos seis” passou a ser constituída pela CEE, EURATOM e CECA. E foi crescendo. Economicamente. 

E foi quando em 1973, três países aderiram ao grupo: Reino Unido, Irlanda e Dinamarca. E em 1981, a Grécia. E em 1986, Portugal e Espanha. E a CEE foi crescendo. Enriquecendo. Uns mais do que outros. Com as políticas comuns e instituições comuns tendo em vista o desenvolvimento económico do “grupo dos seis” que agora passavam a ser 12.

Com o Tratado de Maastrich de 1992, a Comunidade perdeu um “E” e passou a ser apenas CE Comunidade Europeia. Veio o Acordo de Schengen (do qual a medida mais conhecida será a anulação das fronteiras entre países europeus da agora CE) e, um conjunto de tratados que estabeleceram acordos relativamente à Justiça e Assuntos Internos na CE e, relativamente à Politica Externa e de Segurança Comum à CE. E também medidas de cooperação entre Policia e Justiça em matérias criminais e também, a cooperação entre a Politica europeia. Sempre com o fim primordial que conduziu à criação da então CEE: o desenvolvimento económico do “grupo dos seis” que agora eram 12 e que hoje são 27.

E em 2009, deixámos de ser CE e passámos a ser UE. Deixámos de ser “Comunidade” e passámos a ser “União”. 

Diz o dicionário de língua portuguesa que “comunidade” é um grupo de indivíduos que vivem em comum. E que “união” é uma associação de diferentes coisas que formam um só todo.

E vem isto a propósito do quê? Da falta de resposta humanitária, unitária e igualitária por parte da UE, face à pandemia que atinge o mundo inteiro. 

Vamos por partes. O pilar base para a formação da velhinha CEE foi o de promover o desenvolvimento económico do “grupo dos seis”: França, Itália, Alemanha, Bélgica, Holanda e Luxemburgo. Foram depois, outros países que quiseram integrar o “grupo dos seis” tendo em vista a promoção do seu próprio desenvolvimento económico, enquanto país e usufruindo dos benefícios europeus mas, respeitando as obrigações.

E aquilo que seria uma comunidade, passou a ser uma união. Porque numa comunidade todos os países viveriam em comum, com as mesmas regras, os mesmos objectivos. Numa união, cada país tem as suas diferenças, as suas vontades, os seus problemas, as suas riquezas. E é esse conjunto de países diferentes que formam a Europa. Mas não a económica.  

E talvez assim se percebam as palavras do ministro holandês quando quer imputar responsabilidades a Itália e Espanha sobre a gestão financeira dos seus países, quando não conseguem combater um vírus invisível e universal. 

Este ministro holandês tem gravado na mente a ideia primordial da CEE: o desenvolvimento económico da própria CEE. E um vírus que destrói a economia, destruirá a CEE.

Porque é isso que a CEE foi e é: uma União Económica Europeia. ECONÓMICA. 

E até consigo imaginar a frase que o ministro holandês não chegou a dizer mas que pensou: “E se querem falar de humanidade, falem com a ONU. Essa é que é a Organização das Nações que trata da humanidade e dos direitos humanos”. 

Mas como a ONU não dá dinheiro, ninguém parece querer ouvir o que dizem, o que fazem, o que apelam, o que pedem. É só uma “organização” que, de acordo com o dicionário de língua portuguesa, é o acto ou efeito de organizar, de dar às partes dum todo a disposição necessária para as funções a que ele se destina

Serão necessárias mais palavras para descrever o que se está a passar?

Como disse António Costa, as declarações do ministro holandês são “repugnantes”. Porque lhes falta humanidade, digo eu. E acrescenta, dizendo que “sem uma mudança de postura a UE pode acabar”.

E a nós, que assistimos a tudo isto, resta-nos acreditar nas medidas definidas pelo governo e nas recomendações da OMS e da DGS. 

VAI FICAR TUDO BEM.

E vai. Porque continuaremos vivos. 

E porque é a vida que faz as comunidades, as uniões, as organizações e a economia. E a UE. E até ministros, como o holandês.

Esperemos que o futuro acabe com a UE e nos traga a UHEPE: União Humanitária e Económica dos Países Europeus. 

Fica a ideia.



FONTE DA IMAGEM: jornaleconomico.sapo.pt


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