PATRIMÓNIO CULTURAL - SESIMBRA
Diz a Lei de Bases de Protecção e Valorização do Património Cultural, no seu artigo 2º., número 1 que: “integram o património cultural todos os bens que, sendo testemunhos com valor de civilização ou de cultura, sejam portadores de interesse cultural relevante”. E esclarece no número 3 do mesmo artigo que: “o interesse cultural relevante (…) dos bens que integram o património cultural reflectirá valores de memória, antiguidade, autenticidade, originalidade, raridade, singularidade ou exemplaridade”.
Vem isto a propósito da iniciativa promovida pela CMSesimbra com o nome “Patrimónios à la Carte”, onde são propostas uma série de visitas pelo património sesimbrense. Uma dessas visitas pelo património, refere-se à Sesimbra quinhentista. Ou seja, um passeio pelas ruas do núcleo histórico nascente e poente, enfatizando os exemplares existentes, nomeadamente na arquitectura. E, aqui e ali, subsistem alguns exemplares de portas e janelas da Sesimbra medieval, com as suas cantarias de pedra. Talvez a mais emblemática (a poente) seja a porta de uma habitação na Rua da Caridade. E a nascente, os vários exemplares da Rua Jorge Nunes.
Porque apesar dos edifícios serem propriedade privada, o bem existente é património cultural. Património que permite perceber a orgânica da vila medieval. Pelas suas formas, pela sua arquitectura, pelos seus elementos construtivos. E é obrigação de todos (visitantes, estado, proprietários privados) proteger e preservar o património existente, no sentido de o transmitir e deixar às gerações futuras. E até, no caso de um proprietário privado, utilizar como uma mais-valia, o facto de determinado bem cultural ser sua propriedade.
São essas existências, essas particularidades, essas riquezas, que tornam as ruas apelativas e cheias de memórias de outros tempos. E sendo ruas públicas, enquadram as andanças de quem por lá se move, com mais ou menos atenção, com mais uma ou outra fotografia, transportando esta riqueza de uma forma apelativa e de divulgação de determinado destino, mais ou menos turístico.
Numa visita em que participei (dinamizada pela JFSantiago e CMSesimbra), o percurso definido deu a conhecer uma porta e janela na Rua Capitão Leitão (rua da Galé). Magníficos exemplares manuelinos aos quais, infelizmente, não tirei uma fotografia. E digo infelizmente porque hoje, já não é possível ver esses exemplares.
Está a decorrer uma obra que, para já, consta da demolição total do edifício existente (onde se incluíam os exemplares manuelinos). Tenho esperança que aquelas cantarias voltem a ser colocadas na nova edificação… ou que sejam guardadas e expostas no museu… E questiono-me sobre como seria o interior daquela casa… que valores poderiam existir… ou não.
Aos poucos, Sesimbra parece esquecer a sua memória, a sua identidade. Avançando para o progresso e introduzindo uma nova imagem, uma nova linguagem arquitectónica. Com vários pisos, terraços e varandas, janelas e portas em alumínio. E nos vãos, pequenas cantarias, iguais a tantas outras e sem qualquer registo de memória ou identidade.
Porque o que parece é que o casario branco tem os dias contados. E aquelas que seriam as casas mais abastadas de outros tempos, com mais pisos, revestidas a azulejos do final do século XIX, também começam a sofrer com o progresso.
Para a memória futura, ficará a Sesimbra do século XXI, com os prédios iguais uns aos outros, revestidos com aquele azulejo pequenino, liso e brilhante. Só mudam a cor de vez em quando. E é só vantagens, não mancha, não abre fissuras e não é preciso pintar.
Pergunto-me se esta nova construção será uma NZEB? (isto daria pano para mangas!) Com toda a certeza que não. Afinal estamos na presença de uma reabilitação! (estou a ironizar).
É pena. É pena esta falta de sensibilidade em preservar valor.
Termino com um pedido: se alguém tiver uma fotografia dos exemplares manuelinos que já não existem, peço que a possa partilhar.
Nota final: que fique claro que não tenho absolutamente nada contra as reabilitações urbanas no núcleo histórico de Sesimbra; nem tão pouco contra demolições de construções que se apresentem notoriamente débeis. Desde, é claro, que seja respeitada a envolvente, o conjunto, a rua e, obrigatoriamente, a preservação de elementos que por serem testemunhos com valor de civilização ou de cultura, têm interesse cultural, pelos valores de memória, antiguidade, autenticidade, raridade, e como tal, são PATRIMÓNIO CULTURAL.
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