VIVÓ SANTO ANTÓNIO!

E assim passou mais um dia 10 de Junho. E o nosso Presidente Marcelo lá foi, qual vedeta de Hollywood ou craque de futebol, desfilando pela avenida, acenando e sorrindo para o povo que lhe gritava, pedindo uma selfie. E ele lá foi furando o protocolo, sorrindo para os telemóveis do povo que ali foi ver o desfile militar em Portalegre. Um distrito sem indústria, sem postos de trabalho, sem turismo. E cada pessoa que era entrevistada dizia o mesmo: isto é muito bom para Portalegre, para se lembrarem de nós. Aqui não há empregos. Os jovens vão estudar para fora e já não voltam. Não há futuro aqui. 

E o nosso Presidente Marcelo lá foi distribuindo sorrisos e acenos, e lá deu a volta ao discurso do João Miguel Tavares dizendo que os portugueses quando são bons, são os melhores dos melhores. Confesso que esta coisa de sermos os melhores dos melhores já começa a cansar. Porque são só palavras ocas, desprovidas de qualquer tipo de iniciativa, caminho, objectivo, rumo. A verdade é que Portalegre hoje, está exactamente igual a ontem, a anteontem e a todos os outros dias antecessores deste famoso 10 de Junho. E medidas concretas de futuro? Indústria? Postos de trabalho? Qual é a estratégia nacional? Qual é a ideia de desenvolvimento? Como diria alguém, “isso agora não interessa nada!” porque a vida continua e amanhã é outro dia. E a comitiva política tem é de sair rapidamente de Portalegre para não perder o avião para Cabo Verde. E o nosso Primeiro-Ministro entrou rapidamente no carro. E o nosso Presidente Marcelo também, depois de mais uns sorrisos, cumprimentos, beijinhos, abraços e selfies. E ao sair, qual rainha Isabel II, acenou à multidão, com a mão fora da janela do seu carro de alta cilindrada. 

No resto do país não se viu ou sentiu qualquer tipo de celebração relativa ao dia de Portugal. O que é que isso interessa? Para comemorar já chega o 25 de Abril! Com concertos e fogo-de-artifício em todos os cantos do país! O 10 de Junho foi só um feriado nacional que este ano por sorte calhou numa segunda-feira! Três dias de papo-para-o-ar a aproveitar a praia! Foi pena o vento senão, tinham sido três dias perfeitos! 

Nesse mesmo dia à noite, na RTP 1, o programa de Fátima Campos Ferreira debateu Portugal e o 10 de Junho. E os oradores foram apenas e só, escritores. E eu pergunto: mas desde quando é que se faz um debate sobre o dia de Portugal só com escritores? Onde é que estão os políticos? Os advogados? Os economistas? Os ministros? Os representantes dos partidos? Não são estas cinco classes que preenchem os espaços de comentadores de tudo e de todos em todos os canais televisivos? Não são estes os formadores de opinião? Mais à esquerda ou mais à direita? Não são estes que comparam o passado com o presente, numa tentativa de antecipar o futuro? Não são estas opiniões que os meios de comunicação transmitem repetidamente e incessantemente para que nós, todos nós, saibamos dizer o que ouvimos como verdades absolutas? Enfim. Mas voltando aos escritores. Falaram do 10 de Junho. E desta coisa de ninguém saber, como dizia Pessoa, “que coisa quer; ninguém conhece que alma tem”. E porque a maioria lecciona, o tema resvalou para as escolas e para o sistema de ensino. Dizem os escritores que o que a escola ensina é a competir e não, a pensar. Obriga os alunos a decorar informação para se tornarem funcionários exemplares. Não há espaço para a descoberta, para a imaginação, para a criatividade, para o pensamento. Para o sonho! E eu lembrei-me novamente de Pessoa: “o sonho é ver as formas invisíveis da distância imprecisa, e, com sensíveis movimentos da esperança e da vontade, buscar na linha fria do horizonte a árvore, a praia, a flor, a ave, a fonte”. E Fátima Campos Ferreira citando Raúl Brandão, dizia: “é pelo sonho é que vamos”, perguntando: “faz-nos falta sonhar?” E eu cito (outra vez Pessoa): “Deus quer, o homem sonha, a obra nasce.”

E de repente, um discurso que nos puxa a todos para a realidade: o que nos move não é o sonho. É a economia. É a Europa que nos puxa. E nós vamos. Cumprindo metas económicas. Porque queremos ser, ter, chegar ao topo. Vendo os outros e seguindo os seus passos. Esta é a realidade. Porque tudo é economia. E é como se um balde de água fria tivesse sido despejado em cima de todos. “Tudo é incerto e derradeiro. Tudo é disperso, nada é inteiro. Ó Portugal, hoje és nevoeiro…”

E o debate regressou ao sistema de ensino, passando pela justiça e pela desacreditação da pátria enquanto nação. E o programa terminava. E eu relembro o cântico dos Comandos em Portalegre, quando desfilavam avenida abaixo: “ó pátria mãe, por ti dou a vida”. No dia seguinte, uma reportagem sobre o programa de Fátima Campos Ferreira terminava com a frase “Senhor, falta cumprir-se Portugal!” E eu acrescento: “o sonho comanda a vida” (António Gedeão).

E nesse sonho, o nosso Presidente Marcelo está em Cabo Verde, recebido como um ídolo por uma nação que já foi portuguesa. E outra vez o João Miguel Tavares faz um discurso que deixa o Presidente de Cabo Verde sem palavras. Mas o nosso Presidente, sorridente, dá a volta à situação, abrindo portas e quebrando barreiras. Pelo menos em palavras.

E por cá, levamos com a corrupção dos órgãos autárquicos. 18 Câmaras na mira das investigações. 5 arguidos. Parece que os ajustes directos são repetidamente efectuados às mesmas empresas de transporte. Aguardemos pelos próximos dias… 

Afinal hoje é feriado graças a um tal de Fernando de Bulhões, descendente de uma das famílias mais antigas de Sesimbra (podem ler melhor esta ideia no LIVRO PEDRA ALTA) e que ingressou no Convento da Arrábida, abraçando a ordem franciscana e adoptando o nome ‘Frei Manuel de Santo António’. 

Por isso desejo a todos um feliz dia de Santo António! E não se esqueçam que Portugal é o terceiro país mais pacífico do mundo! Com ou sem comemorações do dia 10 de Junho. Com ou sem sonho!

E a fechar, houve um ataque a petroleiros no médio oriente e o Concelho de Segurança da ONU convocou uma reunião de urgência ainda para hoje. Esperemos que não seja nada. É que entre o médio oriente e Portugal não existe todo um oceano a separar-nos…


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