SALVEM O PLANETA
Uma das notícias deste último dia de campanha eleitoral para o parlamento europeu é sobre o planeta. Sobre as alterações climáticas. Um protesto estudantil (de miúdos, jovens, adolescentes) invadiu Lisboa, Porto e cerca de cinco mil cidades do mundo espalhadas por mais de cem países. E tudo graças a uma única menina que, no norte da Europa, decidiu um dia, fazer greve em frente ao parlamento do seu país, exigindo políticas e decisões políticas que salvem o planeta Terra e garantam um futuro para a humanidade. Fantástico.
E o que fazem os adultos políticos dentro dos seus caros fatos, que chegam em carros de alta cilindrada a queimar gasolina ou gasóleo, com os seus portáteis e telemóveis de última geração? Olham para a menina. Sorriem. Alguns até leem as frases dos cartazes de cartão. E de repente a menina solitária transforma-se num ‘monstro climático’. E todos os meninos e meninas espalhados pelo mundo se manifestam. Seguindo as suas pisadas. E a menina anónima do norte da Europa, até já discursou no parlamento do seu país. E nas televisões de todo o mundo. E na ONU. E há até quem diga que irá receber o prémio Nobel da Paz.
E que fazem os adultos políticos dentro dos seus caros fatos, que chegam em carros de alta cilindrada a queimar gasolina ou gasóleo, com os seus portáteis e telemóveis de última geração? Sorriem orgulhosos com caras que transparecem um pensamento do tipo: «afinal estes miúdos até se interessam por alguma coisa». E voltam a sorrir. E ouvem os miúdos. E até lhes respondem, com as políticas ambientais que já aprovaram nas cimeiras. Com as medidas adoptadas pelos vários países. Com a redução de CO2. Com as energias renováveis. Com a eficiência energética. Com tudo e mais alguma coisa que já fizeram, que estão a fazer ou que irão fazer.
E depois? Que voltam a fazer os adultos políticos dentro dos seus caros fatos, que saem em carros de alta cilindrada a queimar gasolina ou gasóleo, com os seus portáteis e telemóveis de última geração? Voltam às suas vidas normais num planeta que se diz azul. E almoçam fartamente, consumindo produtos altamente poluentes. E no fim do dia, regressam aos seus países, em grandes aviões. Com a promessa de uma nova cimeira ambiental. E um acordo climático debaixo do braço que irão implementar… um dia… a longo prazo… talvez noutra geração… E desabafam: “é muito difícil chegar agora ao meu país e fazer com que os outros todos apliquem estas medidas… vamos ver… vamos ver…” depois, seguem-se os beijos, os abraços, os apertos de mão, as fotografias e um adeus, até à próxima cimeira.
Será que alguém leva realmente a sério, e seriamente, esta questão do planeta, do consumo desenfreado de produtos e bens, da emissão de gases com efeito estufa, do plástico, da poluição,… e que os jovens estudantes abraçam como bandeiras um pouco por todo o mundo?
E aqui é que mora o problema. Que medidas poderão os políticos implementar que sejam aceites e cumpridas por todos nós? Por exemplo, podem os políticos proibir veículos não eléctricos a circular nas suas cidades e vilas? Podem. Se a medida for global e obrigue a que toda a indústria automóvel produza unicamente veículos eléctricos.
Pode a indústria automóvel produzir unicamente veículos eléctricos? Pode. Se a medida for global e acabar com a extracção de combustíveis fósseis.
Pode acabar a extracção de combustíveis fósseis? Pode. Se a medida for global e acabar com os mercados grandiosos que floresceram com a revolução industrial.
Será tudo isto uma utopia? Sim, tão grande como o fim de muitas das profissões que conhecemos, mas também com o surgimento de outras que nem imaginamos. Tal como na revolução industrial. As carroças, coches e seges desapareceram e com elas, todo um conjunto de profissões e de trabalhos centenários. Por outro lado, com a indústria automóvel (por exemplo), surgiram um sem número de profissões inimagináveis para aquela época.
A verdade é que todos nós já fomos “ecologicamente sustentáveis”. Depois, tornámo-nos consumistas desenfreados. Temos tudo. O que nos faz falta mas também o que não nos faz falta nenhuma e que passa meses, anos, que não usamos, utilizamos, vestimos. Ditados populares como “guarda o que não presta, acharás o que é preciso”, foram substituídos por pensamentos do tipo: “isto vai para o lixo e compro novos”. E no meio desta realidade consumista, o que mais me impressiona, é o desperdício alimentar. Quando há tanta gente a passar fome no mundo. E nós, que vivemos na Europa, alimentamos esta pobreza. Porque temos o que não precisamos. Porque gastamos o que não consumimos. Porque já não sabemos o que é não ter. Porque a nossa realidade é outra. Porque cada um tem o que tem. Porque nos preocupamos connosco e não com os outros. Porque nós somos nós e os outros são os outros. Porque não temos culpa do que temos. Porque não temos culpa da pobreza. Porque não temos culpa da poluição. Porque não temos culpa de coisa nenhuma. Somos apenas nós, cidadãos perfeitos, num continente civilizado e exemplar.
Neste mesmo dia, MacNamara anda pelo rio Tejo numa acção de limpeza, com o objectivo de chamar a atenção do mundo para a quantidade de plástico que existe nos oceanos e nos estômagos dos peixes que consumimos. Diz ele: “o que mais me choca é o facto de comermos peixe que se alimentou de plástico. Estamos a comer plástico em vez de peixe.” MacNamara colocou a Nazaré no mundo. Pode ser que consiga colocar o mundo no plástico dos oceanos. Never know!
E o protesto climático de jovens estudantes continua. Imagens de Faro e Castelo Branco. Um dos miúdos, com 12/13 anos diz: “o planeta não precisa de nós para viver; nós é que precisamos dele para viver.”
E eu acrescento: respeitemos o planeta, começando por respeitar o nosso futuro. A mudança começa em cada um de nós. E não é apenas com palavras. É com atitudes. Mais preocupadas, mais partilhadas, mais conscientes. E se achamos todos que temos um estilo de vida exemplar, que não é o nosso estilo de vida que prejudica o planeta, fica aqui um desafio: escrevam no Google “pegada ecológica”. Cliquem num dos itens que calcula a nossa pegada ecológica. Respondam ao questionário. E vejam de quantos planetas precisariam para viver esse estilo de vida exemplar. E depois dos resultados, acredito que muitos irão pensar no que podem fazer para alterar alguma coisa no seu dia-a-dia.
E porque “o mundo sem nós” era outra coisa. E porque nós assumimos que somos, perante todas as outras formas de vida, a mais importante e imprescindível, notícias como as de ontem são resultado da nossa soberania enquanto espécie animal. Somos nós que poluímos e produzimos gases com efeito estufa. Somos nós que produzimos e deitamos fora toneladas de plásticos. Somos nós que esgotamos recursos naturais. Somos nós, seres humanos, os únicos animais com inteligência e pensamento (duvido cada vez mais disto) que não respeitamos a vida, a terra, o mar, o ar, a natureza, os recursos naturais, os animais e toda as outras formas de vida, por mais ínfimas que sejam.
E estas são apenas três das notícias de ontem:
- o verão vai ser quente, com dias consecutivos com temperaturas acima dos 43o.
- as girafas passaram a integrar a lista de animais em vias de extinção.
- o Botswana autorizou novamente a caça ao elefante, como fonte económico-turística (ao mesmo tempo que acabei de escrever esta última frase, vejo na televisão o primeiro-ministro do Botswana a revogar esta autorização, face à onda de protestos mundiais que ocorreram nas últimas 24 horas. Fantástico. Aguardemos pelas notícias de amanhã… nomeadamente sobre as reservas para as caçadas…).
O mundo está perdido. Ou talvez não. A acreditar nos miúdos que hoje andam pelo mundo a gritar a plenos pulmões que “não há planeta B”. Não percamos a esperança. E vamos acreditar que negócios milionários como o dos combustíveis fósseis, que geram milhões de milhares de euros distribuídos por milhares de milhares de negócios paralelos, tendencialmente irão reformular-se e adaptar-se a novas formas de viver. E a novas formas de consumo. Porque nós, todos nós, seremos mais conscientes, menos consumistas e mais preocupados com este pequeno ponto azul num universo escuro e infinito.
Entretanto, a primeira-ministra britânica, Theresa May, demite-se, emocionada. Macron pede esclarecimentos urgentes sobre esta demissão e o Brexit. Angela Merkel respeita a decisão de Theresa May. Espanha está preocupada. A União Europeia contínua disponível para falar com aquele que vier a ser o novo primeiro-ministro…
E porque se tratam de outros valores, parece que existem ‘dúvidas’ que podem pôr em causa o conjunto de provas reunidas na “Operação Marquês”… Enfim.
A verdade é que a Europa se prepara para substituir Mário Draghi, depois das eleições europeias… e estando na agenda política o inquérito à CGD e à supervisão que o BdP exerceu sobre os créditos bancários que nos trouxeram a crise e a Troika, nem quero pensar se o número dois do BCE substitui Draghi… espero que a Europa esteja a acompanhar este circo bancário e que tenha assistido à Comissão de Inquérito ao então governador do BdP, que “não sabe”, “não se recorda” e “não se lembra porque já passou tanto tempo…”
E o barulho climático foi completamente ofuscado. Afinal, é só uma coisa de miúdos! Ainda por cima no último dia de campanha eleitoral! Era só o que nos faltava! Para já não falar no final da Taça de Portugal!
Nota: então não é que a arruada do PS está a invadir as ruas do Chiado e os miúdos estão todos aos gritos à porta do parlamento? É pena. Lindo, lindo era terem-se encontrado e misturado todos aos gritos uns com os outros. Isso é que era lindo. Mas não. Acham que isto não foi tudo muito bem organizado? Nada de misturas. Miúdos para um lado. Políticos para o outro. Mais nada!
FONTE DA IMAGEM: dn.pt
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