TUDO É ECONOMIA
E esta é a verdadeira verdade absoluta. Tudo, absolutamente tudo, é economia. Tudo é pensado, programado, definido, estipulado, decidido em função da economia. Tudo o que se possa pensar, é economia. O próprio ser humano é pensado como um activo económico e não como um ser vivo. Porque tudo o que fazemos, ou não fazemos, é economia.
E o problema desta verdade é que começa a entrar pelos olhos dentro do povo. E o povo que já não é analfabeto e iletrado, começa a pensar. E o problema é quando se começa a pensar. E quando se começa a constactar que o que interessa verdadeiramente são as metas orçamentais e os índices económicos. Porque parece que os países têm uma única missão: competir entre eles para chegarem a um vencedor. Ao melhor e ao pior desempenho. Económico claro. E depois criam-se tabelas e rácios e índices médios e taxas e juros e dividas e défices e pibs com base nos valores económicos da maioria vencedora dessa competição. E depois aplicam-se esses valores aos outros, mais fracos, coitados, que não atingem os valores médios definidos. E por isso são classificados como A-, BB- BBB-,… e ficamos contentes quando o nosso país subiu um patamar nessa classificação e deixou de ser considerado “lixo”.
Desde quando é que Portugal é “lixo”? E para quem? Para os índices económicos porque tudo é economia. Mas quem são estas pessoas que nos classificam? O que sabem de nós, do que somos e do que temos enquanto nação?
E depois ficam aflitos com os movimentos populistas. E não é de ficar? Lá se vão os índices económicos e os lugares dourados na Europa, bem sentados, bem vestidos, bem tratados. Porque mesmo os que são contra a Europa, não abdicam de um lugar dourado na Europa. E o que é a Europa? Para além de um conjunto de países e pessoas com entidades e culturas diferentes, cada um com a sua riqueza e particularidade? A Europa é economia. Ou melhor, já não é o continente Europa como aprendemos na escola. Agora somos a Comunidade ECONÓMICA Europeia. Mas como esta sigla e definição era demasiadamente óbvia, até porque o povo começa a pensar cada vez mais, agora é só Comunidade Europeia. Como alguém dizia, “mudamos o nome mas fica tudo na mesma”.
E aquilo que era o “el-dourado” cada vez mais rico e poderoso, esmifrando os mais fracos, que são necessários para sustentar todo este castelo económico está a abanar. Porque nunca pensou que um país quisesse sair do “el-dourado”. Ou melhor, até podia sair, se estivéssemos a falar de um pais classificado como “lixo”. Mas nunca, nunca, um país como o britânico.
E agora? Que impacto vai ter esta saída na Europa? Ou melhor, na Comunidade ECONÓMICA Europeia? E que outros países poderão vir a ter esta triste ideia? Logo agora que os Estados Unidos se estão a posicionar para assegurar novos acordos com o mercado asiático e árabe. E nós? Que imagem é que passamos aos outros continentes? Estamos a cair? Quem é que vai acreditar nesta força económica europeia se um dos grandes países, vai sair? E a França? E a própria Alemanha? Está tudo perdido?
Não. Não está tudo perdido. Porque a estratégia definida é passar o oneroso para cima dos britânicos que já não querem cumprir metas orçamentais, nem quotas de pesca, nem regras agrícolas, nem critérios de migração, nem coisa nenhuma que interfira directamente com a vida do povo britânico. A maioria do povo britânico já não quer continuar a ser governado pelas metas económicas definidas pela Comunidade Europeia. Mas eles, os britânicos, é que estão a pensar mal. Porque o “el-dourado” económico foi a melhor invenção das últimas décadas. Quem é que eles pensam que são? Não podem sair assim, do pé para a mão. E como tal, vão ter de sair mas com um acordo. Favorável em primeiro lugar, como é óbvio, à Comunidade ECONÓMICA Europeia. Porque têm de ficar asseguradas as transacções económicas entre os países da Comunidade ECONÓMICA Europeia. O resto que se lixe. E se não chegarem a acordo, pagam uma multa, porque não se sai assim de repente de uma Comunidade. E a multa é de uns milhões de euros. Porque tudo é economia.
Diz-se que a história se repete. Que é cíclica. Lembrei-me de um documentário que passou já há algum tempo na RTP sobre as “Rotas da Escravatura”. Nesse documentário eram explanados os grandes impérios (egípcio, romano, árabe) que sempre tiveram escravos e trabalho escravo. Depois, com as colonizações portuguesas, britânicas, holandesas, espanholas, francesas,… o mercado de escravos tornou-se a maior fonte de riqueza da Europa. Era mão-de-obra gratuita que produzia riqueza aos seus patrões e donos. O dinheiro era tanto que foram os ingleses a criar o primeiro banco europeu. E a emprestar dinheiro. E a criar juros e prestações. E a enriquecer cada vez mais. E os outros países fizeram o mesmo. Mas de repente, e curiosamente, foram os britânicos os primeiros a acabar com a escravatura e o trabalho escravo. Porque estavam em causa seres humanos. E desde meados do século XIX que o povo britânico passou a ser considerado “civilizado” em comparação aos restantes países “selvagens” que continuaram durante décadas a enriquecer à custa de uns milhares de seres humanos sem qualquer tipo de humanidade.
E agora? O que é que isto tem a ver com a Comunidade ECONÓMICA Europeia? Tudo. Porque como tudo é economia, o povo europeu é escravo da economia. E ninguém se preocupa com a humanidade desse povo. Porque importante, são os resultados económicos. E o povo britânico mais uma vez, é o primeiro a bater com a porta a esta escravidão económica.
E eu que não percebo nada de economia, arrisco dizer que este Brexit é só o início de uma mudança europeia. Para uma Europa menos económica e mais humanizada. Mais preocupada com a igualdade, liberdade e fraternidade entre os povos que a compõem.
E nas relações com os outros povos no mundo. Que não podem nem devem ser apenas lembrados, com diferentes acções dinamizadas durante 15 dias, quando por exemplo uma catástrofe natural destrói um país. E todos nos mobilizamos e contribuímos. Mas ninguém se lembra que naquele país, aquele povo, não tem por exemplo, água potável. E que as mulheres têm a tarefa diária de percorrer dezenas de km todos os dias para trazerem na cabeça, uma bilha cheia de água, para poderem viver. Já imaginaram? Dezenas de km todos os dias? A pé? Descalças? Debaixo de um sol abrasador ou debaixo de chuvas torrenciais? Já imaginaram? E tudo o resto que não têm? E que nem sonham que existe? E as crianças? Morrem dezenas por dia, à fome. Morrem dezenas por dia, sem vacinas. Já imaginaram?
Mas nós, cidadãos privilegiados da Comunidade ECONÓMICA Europeia, estamos ansiosos é por saber quando é que chega à Europa o novo telemóvel coreano. Isso sim, é importante. Terá um custo bastante superior ao ordenado mínimo nacional mas, o que é que isso interessa? Uma coisa não tem nada a ver com outra. Cada um tem o que tem.
Termino com as três palavras que fazem este ano 230 anos. E que são conhecidas como estando associadas à revolução francesa: igualdade, liberdade e fraternidade.
E quando comprarem o novo grito da tecnologia telemóvel pensem, nem que por uma fracção de segundos, nos direitos humanos, no trabalho escravo infantil, na violação das leis laborais. E pensem também na fortuna dos que vivem à conta da desgraça alheia.
E isto não é um delírio nem uma utopia. Porque, e é verdade, a mudança começa em cada um de nós. E somos nós que alimentamos esta máquina poderosa económica.
Porque tudo é economia.
fonte da imagem: adorocinema.com
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