FESTAS DE SETEMBRO
Ouvi dizer na rádio que o início do ano escolar devia ser festejado. A grande maioria da população volta às rotinas diárias depois das férias de verão, regressando ao trabalho, aos horários, aos compromissos,… e como tal, é uma espécie de início de ano, como no dia 1 de Janeiro de cada novo ano.
No mesmo dia, na caixa de correio estava o programa da Festa da Luz. E lembrei-me que, quando éramos miúdos, a Festa da Luz marcava o fim das férias grandes e o regresso à escola. Quase sempre, o primeiro dia de aulas começava na segunda-feira seguinte. Para nós aqueles três dias de festa eram de facto, uma festa. Com fogo-de-artifício e tudo! E com a certeza de que para o ano, lá estaríamos todos outra vez.
E estávamos sempre todos. Durante anos, a comissão de festas foi constituída pelo meu avô, pelos meus tios e depois mais tarde pelos meus primos. Escusado será dizer que a azáfama era grande naqueles dias. Lembro-me da minha avó preparar o almoço onde nos reuníamos, numas mesas corridas no pequeno pátio. Houve anos de sardinha assada! E os bailaricos! E as farturas e churros! E as barraquinhas que vendiam de tudo e mais alguma coisa. Houve um ano que todos recebemos um pássaro de plástico que se enchia de água e se soprava, fazendo o canto perfeito de um pardal! E no Domingo, o fogo-de-artifício que acabava sempre com as terras agrícolas de Sampaio incendiadas e com os bombeiros a apagarem o fogo até às tantas da manhã. Lembro-me da missa na capela, da organização da procissão, que naquela altura passava mesmo à porta da minha avó. E naquele momento, ficávamos todos quietos e calados. A minha avó pendurava uma pequena colcha branca ao portão e assistíamos dali do pequeno pátio, à passagem da imagem da Nossa Senhora da Luz. Tinha uma tia, irmã do meu avô, que era a responsável pelos “anjinhos” e “nossas senhoras” que integravam a procissão. E nas manhãs de Domingo fazia a sua selecção de acordo com o tamanho dos vestidos. Confesso que consegui sempre escapar. Mas uma das minhas primas foi durante anos, “anjinho” na procissão. E mais tarde, porque já lhe servia o fato, foi algumas vezes de “nossa senhora”.
Fomos todos crescendo. Muitos já cá não estão… Muitos voltamos todos os anos para ver a festa… para nos vermos. E muita coisa mudou. Mudaram o percurso da procissão e, este ano, até mudaram o dia da sua celebração. Lá dizia o poeta, “mudam-se os tempos, mudam-se as vontades…” mas, será possível alterar a data de celebração de uma efeméride religiosa? De uma pequena, humilde, modesta Festa da Luz e que é milenar?
Não quero acreditar que seja pelos motivos que correm por aí. Eu sei que dizem que não há festa como essa, mas nada justifica, seja o argumento que for, a alteração da data.
Porque há datas que são inalteráveis e que pertencem ao conhecimento comum. Por exemplo, todos sabemos que a Festa do Cabo é no último fim-de-semana de Setembro. E que a Festa da Luz é no segundo Domingo de Setembro.
Este ano é no terceiro Domingo de Setembro, porque, dizem, é o “segundo fim-de-semana completo” de Setembro. Mas quem é que inventou esta nova doutrina?
A Festa da Luz é no segundo Domingo de Setembro (e ponto final). E porquê? Porque o que se celebra é o dia de nascimento de Nossa Senhora que dizem ter ocorrido num sábado, a 8 de Setembro do ano 20 a.C. Nada mais, nada menos do que nove meses depois do dia da Imaculada Conceição que se celebra a 8 de Dezembro (um dos feriados de Dezembro).
Como o dia 8 de Setembro não é feriado nacional nem local, a regra é que a festa ocorrerá no Domingo imediatamente seguinte e que é sempre, sempre, sempre, o segundo Domingo de Setembro.
E estas festividades existem porquê? Porque em 1646, depois da restauração da independência (outros dos feriados de Dezembro), D. João IV declarou Nossa Senhora, padroeira e rainha de Portugal, coroando-a. O privilégio de uso da coroa ficou exclusivamente a pertencer a Nossa Senhora. Nunca mais os reis portugueses usaram a coroa na cabeça. A coroa passou a surgir colocada em cima de uma almofada, ao lado do rei de Portugal. Este procedimento era único no mundo e causava algum espanto e perplexidade.
Curiosamente este ano, se a Festa tivesse ocorrido no segundo Domingo de Setembro, a procissão teria sido no dia 9. O que significa que no sábado, dia 8 de Setembro, a Festa da Luz teria celebrado no próprio dia, o nascimento de Nossa Senhora. Sim, de Nossa Senhora. Porque o nome hebraico de Maria é «Miriam» que significa «Senhora da Luz».
É verdade que dizem que não há festa como essa, e essa doutrina do “fim-de-semana completo” vem daí. Melhor dizendo, a festa realiza-se no «primeiro fim-de-semana completo de Setembro» e este ano, por coincidência, coincidia (desculpem a redundância) com a Festa da Luz… mas já aconteceu noutros anos esta coincidência. Em 2013, 2012, 2007, 2002, 2001, 1997,…
E para o ano, também coincide. O primeiro «fim-de-semana completo de Setembro» é nos dias 6, 7 e 8. E mesmo não havendo festa como essa, a Nossa Senhora da Luz, nasceu a 8 de Setembro que corresponde para o ano que vem, ao segundo Domingo de Setembro!
Não quero acreditar que seja esta a justificação. E se a justificação existe, era interessante sabê-la. Até porque altera por completo a razão de ser da própria Festa da Luz. Da Senhora da Luz, que já foi comemorada no resto do país, na data certa. Mesmo acontecendo em simultâneo, uma festa como essa.
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